Abril, Resiliência, Resipiscência

No mês de Julho de 2023, vai fazer 50 anos um grupo de jovens madeirenses foi chamado a cumprir o S.M.O. Apresentámo-nos no Destacamento, da E.P. de Cavalaria no 2.º turno de 1973. Alguns desses jovens, infelizmente, já, partiram, inclusive o nosso conterrâneo que partilhou a recruta no meu Pelotão.

Curiosamente, depois dos três meses de instrução, foram transferidos para outros aquartelamentos, exceto eu, que tive de fazer a especialidade de A.C., que nada tinha a ver com o meu C. Técnico. da E.I.C. Funchal (será que a polícia política PIDE/DGS do regime de Salazar, tirou-me a “foto” quando assisti à campanha eleitoral dinamizada pelo Vicente Jorge da Silva a favor do G. H. Delgado, que mais tarde foi assassinado.

Falar de Santarém é falar de Abril. É a partir desta unidade de Cavalaria que o mais emblemático e com ação direta no sucesso da Revolução, Salgueiro Maia, que com apenas 27 anos, comandou a coluna militar de 250 homens, com vários blindados ligeiros. Com a vitória do Movimento das Forças Armadas, M.F.A. o programa tinha por tema os três D: Descolonização, Democratização e Desenvolvimento.

Com a Descolonização os acordos de Alvor e Lusaka assinados pelo Governo e pelos movimentos de libertação fracassaram. O resultado foram centenas de milhares de mortos e feridos.

Com a Democratização, Portugal empobreceu muito mais, após a intervenção da Troika, a dívida soberana quadriplicou.

Com o Desenvolvimento prometido, Portugal deveria estar na linha da frente a nível da Europa se apostasse na energia a sério.

Gabriel G. Márquez, tinha razão quando ao visitar, no verão de 1975, a cidade de Lisboa para ver de perto a rev. profetizou: “Se alguma coisa vai dar cabo da Revolução é a conta da Luz”.

Aos 17 anos ingressei na Cent. Hidro. da Serra D'Água como estagiário. Assumi o cargo de Op. de Quadro. Era da sala de comando desta central, que dava as ordens para a central termoelétrica do Funchal potenciar os seus grupos eletroprodutores. Obviamente, o sistema elétrico passou para o comando da Central. de C. C. dos Socorridos. Na C. da S. D’água, refiro situações. Como Op. tinha de comunicar ao Op. da térmica do Funchal de desligar de 2 em 2 h, faseadamente as 13 saídas de A.T. que alimentavam as 10 freguesias do Funchal. Foram tempos muito difíceis, marcados pela crise petrolífera de 1973. (continua...)

Hoje, a C. H. da Serra D’Água está fechada… Será que valeu a pena a sua remodelação? Como é possível esta Central, que ao fim de 70 anos, produziu 1000Gwh, o que dá a módica quantia de energia produzida de 1,6Mwh, quando a potência instalada é de 5,2Mwh? Se o objetivo é atingir os 10,8Mwh, onde vão captar essa massa-energia? Não seria muito melhor preservar esta icónica Central na sua Arqueologia Industrial?

Sugeri na revista Mais (DN de 16 a 22 de Agosto de 2009) que o P. Santo tivesse 8 aerogeradores de 3Mwh cada, resolveria o problema energético daquela ilha. Tendo em conta que a escala dos ventos (Beaufort) é predominante de Norte e Nordeste, é caso para dizer que a terra dos “profetas” transformar-se-ia numa verdadeira Free Fossil Island.

O problema deste país de Abril, ao fim de quase 900 anos de História, é, sem dúvida, a pobreza energética – A fome da energia é a raiz de todas as fomes.

Como é que uma Nação que deu “Novos Mundos ao Mundo” chegou a esta pobreza energética?

Na sequência do programa “Átomos para a Paz”, sob o impulso do presidente dos EUA Eisenhower, houve entre nós em finais dos anos 50 e início dos 60, uma grande aposta na Ciência Nuclear. Portugal com a aquisição do 1.º reator de Investigação Científica da Península Ibérica, deu-se em Sacavém a sua inauguração no dia 25/04/1961, originado a numerosas publicações científicas e técnicas, e à formação de recursos humanos. Este reator foi adquirido na sequência do DL N.º 39.580 de 29 de Março de 1954, que criou a Junta de Energia Nuclear, e reformulada a estrutura da Admi Púb. no setor energético pelo DL N.º 548/77 de 31 de Dezembro.

Ao ignorar, os nossos recursos endógenos dos minerais U235, e com reservas estimadas 10.500 TU (dados da A.I.E.A. de 2009), deviam ter garantido as nossas necessidades energéticas durante várias décadas.

Sublinho as Instituições Nacionais e Estrangeiras que utilizaram o Reator (R.P.I.):

- Univ. de Coimbra. Univ. de Lisboa, I.S.T., Inst. de Invest. Agrária e Inst. de Invest. Tropical.
- Univ. de Gent .
- Univ. de Dalhouse.
- Univ. Complutense de Madrid, Univ. de Valência.
- Inst. Nacional de Padrões e Tecnologia (EUA).
- Univ. de Paris VII.
- Univ. Téc. de Delft.
- Univ. de Manchester.
- I.A.E.A, CERN.

Precisamos de um Samuelson!

E não houve quem pegasse no Leme da Proa Verdadeira, rumo às jangadas de pedra e da Luz.

O futuro deste País jamais passará com a palavra Resiliência, mas pela Resipiscência.

Ricardo Jorge Franco de Sousa