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Habitação a custos descontrolados

O desequilíbrio do mercado de habitação é demasiado amplo e estrutural na Madeira e as consequências estão à vista. O modelo de desenvolvimento imposto pelos governos do PSD está a empurrar milhares de madeirenses para fora do arquipélago e outros para longe dos centros urbanos, atirando-os para a emigração e para as periferias da Ilha.

Uma habitação não é apenas um local para dormir, é o abrigo da vida, é o espaço onde podemos sorrir, chorar e reerguer a nossa esperança, são as raízes que vão sustentando o chão da casa, é a memória que passa, é o berço da aprendizagem, é a estabilidade emocional da família, é um direito, é uma condição da dignidade humana.

Apesar da estabilidade política, dos apoios da UE e das potencialidades da nossa Autonomia, os governos da Madeira não foram capazes de implementar uma política de habitação que viesse ao encontro dos interesses dos madeirenses, protegendo, por um lado, a sustentabilidade do território, e por outro, criando os contextos para a habitação a custos acessíveis, eliminando as situações precárias, que são tantas e a diversos graus de complexidade, mitigando a sobrelotação de residências, com famílias a se arrumarem em partes da casa ou anexos sem condições mínimas.

É verdade que chegou o PRR, todavia, não é suficiente. Para dar resposta às carências habitacionais que se foram acumulando, as verbas disponibilizadas garantem 128 milhões de euros para habitação, tendo sido anunciado, inicialmente, que, através da IHM, iriam ser construídos e/ou adquiridos até 2026, cerca de 1.121 fogos, embora, já tenham recuado nas intenções, indicando que afinal só irão construir e/ou adquirir 800 fogos, devido ao aumento dos custos de construção. E se não houvesse um PRR?

A Região atingiu um nível de bolha especulativa imobiliária demasiado segregador. Em que cantinho do nosso desenvolvimento ficam os 83 mil madeirenses em situação de risco de pobreza e exclusão social, os casais jovens que ambicionam constituir família e toda a classe média que, apesar de receber um ordenado acima do salário mínimo, não têm poder de compra suficiente? Onde vão morar os madeirenses que não são ricos nem milionários, que não possuem vistos “gold” nem meios para adquirir ou arrendar uma habitação?

Segundo o presidente da IHM, 5 mil famílias estão inscritas para terem acesso a um programa de habitação. Destas, 4 200 candidatam-se a uma habitação social e, tendo em conta o aumento dos juros dos empréstimos bancários, os pedidos de ajuda irão aumentar.

Com os 128 milhões de euros do PRR, se houver capacidade de execução, estão previstos construir 800 fogos, até 2026 – dando resposta apenas a 16% dos inscritos na IHM - todos para o regime de arrendamento e dirigidos a agregados de rendimentos intermédios. As restantes 4200 famílias, inscritas na rubrica da habitação social, algumas com uma espera superior a 20 anos, ficarão mais uma vez para trás, juntamente com tantas outras famílias da classe média que não estão inscritas, mas que precisam de uma habitação com rendas acessíveis ou com um preço de aquisição ao alcance dos seus rendimentos.

Em relação aos custos controlados, para evitar os erros do passado, exige-se qualidade na construção ao nível dos materiais, dos espaços, do conforto e do bem-estar, da mesma forma que os critérios de atribuição destas habitações deveriam ser públicos, claros, coerentes e justos.

A propaganda do regime anda a alimentar a ideia de que as verbas do PRR vão acabar com os problemas de habitação na Região que, sublinhe-se, só chegarão a 16% dos 5000 inscritos na IHM. Para além dos discursos reduzidos a “verbo de encher”, precisamos de saber se existe vontade política para resolver as restantes carências de habitação. Que outras políticas públicas de habitação estão previstas? Que fontes de financiamento alternativas e metas estão definidas para além do PRR? Que estratégia está delineada para a habitação social e para todos aqueles que, apesar de pertencerem a uma classe média, não têm capacidade financeira para aceder a uma habitação a custos descontrolados?