Um calhau no meio do Atlântico

Continua a ser notícia a suposta falta de mão de obra qualificada. Continua a ser notícia a “falta de jovens”, o “desemprego”, a dita miséria e vergonha “desta geração em que vivemos”. Continuam os mesmos a vangloriar a ilha que corroeram no mesmo fôlego a praguejar quando tudo bate errado e são criticados. Exigem a qualificação, mas não a fornecem. Exigem trabalho, mas não abrem o bolso arrebatado de dinheiro - muito menos condições de vida. Exigem respeito, mas esquecem-se que é mútuo e merecido, não oferecido.

Onde é que estão os jovens? Os que estão procuram “curso X” “ofertas de emprego X na Madeira” no Gúgál, mas se não desejam seguir a vida que a sociedade da região atual exige e oferece - uma carreira instável a recibos verdes de hotelaria, cuidados de terceira-idade, comércio, turismo, restauração, e mais uns diversos do setor teciário - são declarados NEETs preguiçosos. “Nem sempre podemos ter tudo o que queremos”. “O que importa é ter saúde, filhe”. “A vida é assim, queride”. “Faz alguma coisa por enquanto e talvez um dia vai aparecer o que queres!”. Os que estão, juntam tostões para o voo caríssimo para ir embora, certamente apoiados pelos patriotas que cospem com orgulho “se odeias tanto, vai-te embora, sai daqui”. Os que não estão, deixaram a sua casa para sequer ter uma chance de um futuro aceitável. Uma casa que tanto poderia ser desde há 48 anos atrás e pouco ou nada tem sido senão o resort de férias do senhor lorde governado por muita democracia monopartidária. Um porto são que poderia ser a nossa casa de vinho, amor, riqueza, e prosperidade; mas se alguma coisa, o vinho é mais comercializado para turistas do que para locais, o amor é uma fraude, a riqueza está nos bolsos da máfia cheirando já a mofo, e a prosperidade é ficção. Triste de quem é feliz na sua cegueira ignorante, triste de quem é triste na sua sabedoria dolorosa.

Ninguém ganha neste jogo, senão os abençoados que aproveitam-se de outros com muita riqueza na carteira mas pouca na alma, ou os que vão beber uma ponchinha à esquina e saboreiam o momento um dia de cada vez, agarrando-se à sanidade por um fio. Valete, fratres.

M. Canha