Orçamento do Estado País

Deixar a pandemia para trás e atenuar o "choque geopolítico"

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Seis meses, um novo Governo e uma guerra separam as duas propostas do Orçamento do Estado para 2022: da primeira sobrou a recuperação pós-pandemia, enquanto o destaque da versão apresentada hoje foi o mitigar do "choque geopolítico".

A estreia do ministro das Finanças Fernando Medina na entrega e apresentação do Orçamento do Estado (OE2022) aconteceu ao início da tarde, ao invés de praticamente no final da noite, como já vinha sendo habitual nos tempos dos antecessores João Leão e Mário Centeno.

Se o 'chumbo' parlamentar da versão apresentada por Leão em outubro e a subsequente vitória dos socialistas nas legislativas de janeiro facilitaram a tarefa da equipa de Medina ao fornecer uma proposta que não tinha de ser desenhada de origem, a invasão da Ucrânia pela Rússia em fevereiro obrigou a alertas sobre - e medidas para atenuar - as pressões inflacionistas.

O primeiro 'slide' da apresentação de Medina no Salão Nobre do Ministério das Finanças alertava para a "elevada incerteza e riscos", salientando as subidas dos preços, enquanto o décimo-sexto sumarizava as medidas, no valor de 1.800 milhões de euros, para mitigar o choque: conter os preços da energia, apoiar as empresas, apoiar os mais vulneráveis e acelerar a transição energética.

Pelo meio, o ministro das Finanças salientou que o País "pode enfrentar os atuais desafios futuros com um sentido de confiança reforçado, devido à resiliência conquistada ao longo dos últimos anos", apontando para a elevada taxa de vacinação completa contra a covid-19 e para avanços no mercado de trabalho, com 2021 a representar a menor taxa de desemprego em 18 anos.

Ainda assim, o Governo de António Costa teve de ajustar o cenário macroeconómico, projetando agora uma expansão de 4,9% do Produto Interno Bruto (PIB) este ano, face aos 5% apresentados no Programa de Estabilidade (PE) para o período 2022-2026, divulgado em 28 de março e aos 5,5% da proposta orçamental rejeitada na Assembleia da República em outubro.

Apesar da ligeira revisão em baixa, Fernando Medina sublinhou que "o valor de 4,9% [de crescimento económico] é um valor historicamente muito elevado".

"Este crescimento, em conjunto com a redução da despesa associada a medidas de emergência adotadas durante a pandemia, deverá permitir reduzir a dívida pública para 120,7% [do PIB] e o défice orçamental para 1,9% [do PIB]", explicou o Governo no relatório do OE2022.

Para Fernando Medina, o rácio de endividamento soberano, de 127% do PIB em 2021, é elevado, está ainda acima do nível pré-pandemia e impõe particulares cautelas a Portugal, enquanto a consolidação orçamental continua a ser uma das principais prioridades do Governo.

Questionado sobre um regresso à austeridade com as medidas previstas no orçamento, apontado por algumas forças políticas, o novo titular da pasta das Finanças respondeu que "em nenhum dicionário de política económica do mundo, esta é uma política de austeridade".

A grande maioria das medidas apresentadas pelo anterior Governo socialista em outubro ficaram inalteradas, com destaque para a criação dois novos escalões de IRS, desdobrando os 3.º e 6.º escalões, com este imposto a passar a ter nove escalões.

Os pensionistas que recebem até 1.108 euros por mês vão ter este ano um aumento extraordinário de até 10 euros com retroativos a janeiro, confirmou o Governo. O aumento extraordinário já tinha sido anunciado pelo Governo e vai abranger cerca de 1,9 milhões de pensionistas e terá um custo de 197 milhões de euros.

O primeiro parecer sobre o OE2022, do Conselho de Finanças Públicas (CFP), foi positivo: "O cenário macroeconómico subjacente à NPOE/2022 é globalmente coerente com as projeções mais recentes para a economia portuguesa, que incorporam uma avaliação dos efeitos do conflito na Ucrânia na economia nacional".

A proposta de Orçamento do Estado vai ser debatida na generalidade na Assembleia da República nos próximos dias 28 e 29 de abril, estando a votação final global marcada para 27 de maio.