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Catálogo sobre Coleção Berardo vai assinalar 15 anos do museu em Lisboa

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Um catálogo que reúne uma seleção de 523 obras de arte e os princípios que orientaram a construção da Coleção Berardo vai ser lançado na terça-feira, dia 20 de dezembro, para assinalar os 15 anos do Museu Berardo, em Lisboa.

Com 864 páginas, a obra intitulada "Coleção Berardo 1909--2019" suge no 15.º aniversário da abertura ao público do Museu Coleção Berardo, cumprido em 25 de junho, e contará com a presença dos três diretores que acompanharam o percurso da instituição, e que também contribuíram com textos para o catálogo.

Na obra, a que a Lusa teve acesso, há ainda um texto onde o colecionador, José Berardo, evoca a sua paixão de colecionista iniciada "nos bancos da escola", com postais, caixas de fósforos e selos.

Mais tarde, veio a interessar-se por arte moderna e contemporânea, "por influência de amigos" que lhe fizeram "compreender que, através das obras de arte, da sua linguagem estética, podemos redescobrir o mundo e as suas mudanças".

Por essa razão -- diz ainda o empresário madeirense --, decidiu constituir uma coleção de arte que abriu ao público num museu com o seu nome, em 2007, no Centro Cultural de Belém, e que até junho deste ano ultrapassou 10 milhões de visitantes, de 123 exposições temporárias, e superou várias polémicas, logo na sua génese, quando assinou um acordo com o Estado.

Numa conversa com a atual diretora, Rita Lougares, publicada no catálogo, Berardo recorda: "A coleção foi constituída num período de crise económica; por isso, conseguimos adquirir algumas obras a que hoje dificilmente teríamos acesso. Nomeadamente, conseguimos adquirir coleções particulares de galeristas que estavam em dificuldades económicas. Noutros casos, e através da intervenção dos galeristas, conseguimos ter acesso a obras das coleções privadas dos próprios artistas".

Também sublinha o "caráter didático" da coleção instalada no museu há 15 anos, considerando-a "uma enorme mais-valia para as escolas e universidades que o visitam".

Agradecendo aos diretores do museu, equipa, artistas e apoio da família, José Berardo, que é presidente honorário da Fundação de Arte Moderna e Contemporânea --- Coleção Berardo, termina o seu próprio texto com esta frase: "Anima-me e conforta-me pensar que nada foi em vão, e que o encontro com a arte do nosso tempo é algo inalienável, algo que nos marca e nos faz pensar e emocionar de forma mais complexa e completa".

Em maio deste ano, o ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, anunciou que a Fundação de Arte Moderna e Contemporânea -- Coleção Berardo, constituída para a criação do museu, será extinta, e aberto um processo para a criação de um museu de arte contemporânea para reunir várias coleções, nomeadamente a Coleção Berardo e a Coleção Ellipse, arrestada após a falência do Banco Privado Português (BPP).

A tutela anunciou a junção das duas coleções, ao mesmo tempo que revelou a denúncia do contrato entre o Ministério da Cultura e José Berardo, em vigor até ao final de dezembro, optando pela não renovação, prevista nesse acordo, num contexto de arresto das obras de arte em 2019, devido ao processo de três bancos a correr em tribunal contra o colecionador, por dívidas que ascendem a quase mil milhões de euros.

Inaugurado em 25 de junho de 2007, o Museu Coleção Berardo foi criado na sequência de um acordo assinado em 2006 para cedência gratuita, ao Estado, por dez anos, de uma coleção com 862 obras de arte de José Berardo, avaliadas, na altura, em 316 milhões de euros pela leiloeira internacional Christie's.

Em 2016, concluídos os 10 anos do acordo com o Estado para criar o Museu Coleção Berardo, foi assinada uma adenda para o seu prolongamento por mais seis anos, com a possibilidade de ser renovado automaticamente a partir de 2022, se não fosse denunciado por qualquer das partes nos seis meses antes do fim do prazo.

Num texto também inserido no catálogo, o historiador de arte e curador Pedro Lapa, que foi o segundo diretor do museu, escreve que "a Coleção Berardo é a mais importante coleção de arte moderna que existe em Portugal", e que a sua constituição e apresentação pública "alteraram de forma profunda o panorama histórico do colecionismo no país, e proporcionaram um posicionamento deste no quadro internacional com acesso às redes de circulação de exposições internacionais".

Pedro Lapa faz um percurso pelo colecionismo nacional realizado até finais do século XX, e conclui que se revela "um panorama extremamente limitado, característico dos países mais pobres da Europa", que a Coleção Berardo "vem alterar de forma significativa" a partir de 1992, e "proporcionar outras perspetivas", menos conservadoras, na sua opinião.

A coleção reúne desenvolvimentos artísticos no mundo ocidental, no decurso do século XX, e inclui, entre outras obras, de artistas estrangeiros de renome como Jean Dubuffet, Joan Miró, Yves Klein, Piet Mondrian, Duchamp, Chagall, Picasso e Andy Warhol, e de portugueses como Rui Chafes, Fernanda Fragateiro e Julião Sarmento.

Por seu turno, Jean-François Chougnet, considera, no texto que assina, que "nos últimos vinte anos o papel desempenhado pela Coleção Berardo de arte moderna e contemporânea tem vindo a ser analisado, raramente sob um ângulo artístico, mas principalmente mediático, anedótico, institucional e mesmo político".

"Com efeito, desde meados de 1990, verificou-se alguma dificuldade em separar a coleção da figura pública do colecionador, dono de uma forte personalidade e omnipresente na comunicação social. As questões financeiras e jurídicas acrescentaram, desde 2019, um filtro adicional que parece tornar impossível uma análise desapaixonada da dimensão artística da coleção", aponta o curador.

No catálogo, as 523 imagens de obras de arte são acompanhadas por uma contextualização histórica, estabelecendo uma relação com os movimentos artísticos correspondentes, através de textos de Margarida de Lopes Grilo, Teresa Neto, Daniel Peres e João Tomé.

Além de assinalar os 15 anos de vida do museu, o objetivo do catálogo, segundo a direção, é também "realçar o forte cariz museológico e didático desta coleção de arte" moderna e contemporânea, que deverá partilhar aquele espaço com a Coleção Ellipse a partir de janeiro de 2023.

Jean-François Chougnet, Pedro Lapa, e Rita Lougares, atual diretora artística, estarão presentes no lançamento do catálogo, previsto para as 18:30 de dia 20 de dezembro, segundo o museu.