Verão de São Martinho

É verão!

O verão de São Martinho.

Embora se diga, que a tradição já não é o que era, parece que o santo faz questão de manter a tradição, quanto ao tempo.

É verdade que, a tradição já não é bem o que era.

Mas também, não é menos verdade, que o São Martinho ainda não caiu no esquecimento.

Festejado de uma maneira diferente do antigamente, ainda se procura dar sabor ao paladar, com as iguarias próprias daquele dia e, de uma maneira mais abundante e mais rica, o que noutras épocas de vacas magras, era impensável.

Parece que voltei aos meus tempos de menino, quando na véspera do último dia de São Martinho, ao cair da noite, numa das ruas de Santana, pude apreciar um grupo bem animado que tocava matraca, festejando aquele dia, como outrora se fazia.

Lembrei-me dos meus tempos de criança, quando eu ia a casa da minha tia Maria, tocando matraca, na companhia de outros miúdos, na mira daquele copinho de vinho, que ela sempre nos brindava, com um sorriso nos lábios, ainda mais saboroso do que o próprio vinho.

É de louvar todas estas iniciativas, que procuram manter viva a tradição.

Embora Santana, não fosse uma terra de grande produção de vinho, naquela época, havia muita gente, que tinha a sua pipa, ou o seu barril, num cantinho da casa e até muitas vezes, num cantinho do palheiro e, que neste dia chamavam os amigos, para meterem a torneira à pipa e provarem o vinho. O vinho era proveniente da parte baixa da freguesia, como a Rocha do Navio e outros locais. Também a Fajã do Mar no Faial, dava um grande contributo nesta produção, uma vez que, a maior parte daqueles terrenos eram propriedades de Santanenses.

Recordo-me, quando eu ia às vindimas do meu avô na Fajã do Mar, o que para nós crianças, era dia de festa, desde o saborear dos bagos amadurecidos das uvas e, depois o sabor do mosto no lagar.Depois era o acompanhar dos borracheiros, que subiam a rocha de pés descalços e calças arregaçadas, com o borracho às costas, ao mesmo tempo que cantavam. Recorda-me de ver o suor, cair-lhes corpo abaixo, até ao chão. Chegavam a Santana, despejavam o borracho na pipa, tiravam a camisa ensopada em suor, torciam-na, voltavam a vestir e regressavam ao ponto de partida, para mais um transporte.

O São Martinho era bem-vindo, não só pela sua tradição, mas muito especial pelo seu verão.

Naquela época em Santana, as chuvas eram abundantes. Se por um lado regavam as terras, fertilizando-as com as suas propriedades químicas, por outro lado dificultavam os trabalhos agrícolas. Então, esperava-se o verão de São Martinho, para a execução de muitas tarefas. Era ao sol de São Martinho, que se acabava de secar o milho, antes de guardá-lo na caixa, nos anos mais chuvosos em que a escassez de sol, não permitia fazê-lo mais cedo.

Não sei, se este santo, fora ou não, meteorologista, o certo é que, a fé das pessoas confiava nele à espera do bom sol e, por coincidência ou não, lá aparecia o astro rei a dar um ar da sua graça, antes ou depois, do dia do santo.O povo dizia:O Verão de São Martinho, não falha; se não vem antes, vem depois.

Miguel Alves