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Covid-19. Luz ao fundo do túnel?

A imunidade de grupo, o Eldorado de há um ano, pode até nem acontecer no futuro imediato

Quantos dos leitores não têm uma espécie de sensação “agridoce” sobre o estado atual do combate à pandemia? Certamente muitos!

Há pouco mais de um ano iniciámos o confinamento, o uso da máscara, enquanto esperávamos por uma vacina, eficaz claro, que nos proporcionasse a imunidade de grupo, possibilitando a retoma completa das atividades laborais e do lazer.

Estas vacinas foram concebidas no Verão passado, para as estirpes que existiam então. Foram testadas no Outono e aplicadas a partir do Inverno. Para espanto de uma minoria cética, são seguras, bastante aliás. Não previnem totalmente a doença, mas diminuem de forma substancial os casos graves da doença. A sua eficácia é menor com as variantes atuais do vírus. Uma terceira dose (da mesma vacina) terá alguma utilidade, na essência, para aqueles em que a vacina foi menos eficaz, como os imunodeprimidos e alguns idosos. O que verdadeiramente necessitamos, é uma “nova” vacina, que permita ultrapassar as dificuldades criadas pela variante Delta, e outras. Ela aparecerá, mais cedo que tarde, e reaparecerá cada ano, até se tornar rotina como acontece com a gripe.

A pandemia e a vacinação foram acontecimentos únicos nas nossas vidas. Ficarão na memória desta geração. Apesar de ainda antevermos “cenas dos próximos capítulos”, já tivemos de tudo…

A primazia ao Primeiro Mundo foi evidente, pese embora as ofertas das vacinas sobrantes aos países pobres. Entre os trágicos disparates de Bolsonaro, à “ditadura da informação” na China, à enxurrada de contrainformação sobre o Covid-19 e as vacinas, a vida prosseguiu...

Os Estados Unidos, que partiram com avanço, atrasaram-se... à boleia da politização da vacina e do uso da máscara, ao contraditório da desinformação e ao descrédito que uma certa Igreja, sobretudo evangélica, tem sobre a Ciência, muito evidente nos estados do Sul e zonas rurais do país.

Na Europa o processo foi mais pacífico. E pertencer à EU foi decisivo para nós. O orgulho de Portugal estar no Top 10 mundial pode admirar alguns, mas o SNS provou que ainda tem créditos. Certamente que a memória dos idosos a morrer à porta dos hospitais fez muitos portugueses refletirem e vacinarem-se. A organização deste processo foi, diria, militar! Os 73% no Continente e os 71% na Madeira são notáveis e as entidades de saúde nacionais e regionais estão de parabéns. A decisão de vacinar os jovens mostrou-se correta. A administração de uma terceira dose também.

A imunidade de grupo, o Eldorado de há um ano, pode até nem acontecer no futuro imediato. Isto muito por culpa de haver quem ainda não quer ser vacinado e pela nova variante Delta, pois elevou a fasquia necessária de 65% da população, para perto de 90%, algo difícil de atingir.

Corretas são também as restrições à circulação, tão úteis como, ao mesmo tempo, difíceis de lidar durante meses a fio, e o uso da máscara é uma espécie de guarda-chuva sempre à mão. A não haver a tal imunidade, ela vai continuar útil para todos aqueles que não queiram contrair a doença.

Os testes e os certificados, com as inerentes limitações que acarretam, aplicam pressão a quem não se vacina ou não se protege. Apesar de alguns os equipararem à sonegação da liberdade individual, eles vieram para ficar.

Como reflete um amigo meu, “se a nossa sociedade não permite que um alcoolizado, ou alguém sob a influencia de outras substâncias, possa conduzir, poderá permitir a um potencial infetado que possa interagir com outros, sem máscara ou vacina, em especial em locais fechados? Aposto que muitas lutas jurídicas ainda estão para acontecer.

Neste ano olímpico, permitam-me a ousadia de fazer as minhas nomeações:

O Bronze, àquela comunicação social que sacudiu o sensacionalismo, reconfirmou as fontes e a veracidade da informação, ressalvou o sentido cívico e a determinação do cidadão, mantendo sempre um debate vivo, despolitizado e transparente.

A Prata, ao Povo português que, apesar de todos os defeitos e desleixos conhecidos, apesar de ser um povo do Sul da Europa, apesar de nem sempre saber lidar com a corrupção, deu uma lição de união, civismo e organização que nos devemos orgulhar.

O Ouro, para a Ciência, em especial da saúde. Provou que, quando bem orientada por políticos, financiada, e em sociedades democráticas e transparentes, focadas no interesse das populações, é importantíssima à sociedade, contribuindo para encontrar a luz de um futuro sustentável.