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Estará o trabalho em transformação?

As mudanças em curso vão alterar a forma como trabalhamos e como se estabelecem as relações laborais

A alteração da legislação laboral aprovada recentemente na assembleia da república está longe de equilibrar a disputada equação nas relações laborais, de responder aos problemas atualmente identificados e enquadrar os desafios decorrentes das transformações no mundo do trabalho.

As mudanças realizadas incidiram principalmente nas temáticas relacionadas com o alargamento do período experimental passando de 90 para 180 dias para os contratos sem termo dos jovens à procura do primeiro emprego, a eliminação dos contestados bancos de horas individuais, embora de forma indireta continue a ser possível a sua implementação.

A presente alteração deixou de fora temáticas tão importante para os trabalhadores como as mudanças aos critérios sobre o tratamento mais favorável, o reforço dos mecanismos da negociação e contratação coletiva, a caducidade dos contratos coletivos de trabalho, entre outras.

A justificação utilizada pelos sucessivos governos para alterar a legislação laboral assentou fundamentalmente na necessidade de tornar o mercado do trabalho mais concorrencial em comparação com outras realidades, aumentar a competitividade das empresas e melhorar o ainda débil crescimento económico. Ao longo das duas últimas décadas a alteração da legislação laboral processou-se sempre em desfavor do trabalhador, como se fosse esse efetivamente o maior problema ao desenvolvimento do País.

Até a segunda metade da década de noventa assistimos a um período de crescimento económico, com emprego estável e com direitos, proteção social com garantias a par de um progressivo aumento das remunerações o que permitiu diminuir as desigualdades e muitas situações de pobreza nos diferentes estratos sociais.

Entidades como a Organização Internacional do Trabalho e especialistas na área laboral têm afirmado sistematicamente o que a experiência empírica tem demonstrado, ou seja, não é com a desregulamentação laboral, baixos salários, precariedade e desagregação na conciliação da atividade profissional com a vida familiar e individual que se aumenta a motivação dos trabalhadores, a produtividade e se promove a competitividade e o crescimento económico.

Ao longo da história o trabalho adotou múltiplas formas, mas é sempre o resultado do esforço individual e coletivo, tendo por base a capacidade de reflexão, a criação e a coordenação da relação entre os homens e destes com a natureza.

As atuais transformações no mundo do trabalho não se limitam ao que produzimos e à forma como produzimos. As mudanças em curso vão alterar a forma como trabalhamos, e como se estabelecem as relações laborais, surgirão diversas configurações na organização do tempo de trabalho, novas profissões assim como alterações nas circunstâncias de acesso ao mercado de trabalho, interferindo com a retribuição, as condições da prestação e a segurança no local de trabalho.

A centralidade do trabalho continuará a ser uma realidade concretizada pela intervenção humana com impactos a vários níveis difíceis de prognosticar particularmente no modelo de trabalho e nos mecanismos de proteção social que sustentam o atual modelo social.