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A formiga no carreiro de Outubro

Este Outubro outonal quente, mostra a realidade das alterações que se fazem sentir um pouco por todo o mundo

Em tempo de Outono, com as condições climáticas a forçarem mudanças de hábitos e comportamentos, lembrei-me de José Afonso.

Estou distante ideologicamente deste grande português, mas estou muito perto da sua musicalidade e mais perto ainda da forma como sabia dizer o que, em tempo de censura, todos (bem, muitos!) gostávamos de ouvir.

E José Afonso, cantando disse:

A formiga no carreiro

vinha em sentido diferente

caiu à rua, caiu à rua,

no meio de toda a gente

buliu abriu as gâmbeas

para trepar às varandas

e do cimo de uma delas

virou se pró formigueiro

mudem de rumo mudem de rumo.

Já lá vem outro carreiro”.

É urgente que cantando, escrevendo, falando, olhando, vendo, ouvindo e escutando, avisemos toda a gente que é preciso fazer o que a formiga no carreiro disse para o formigueiro:

é preciso mudar de rumo!

Este Outubro outonal quente, mostra a realidade das alterações que se fazem sentir um pouco por todo o mundo, mesmo que, tal como num destes dias, pela fresquinha da manhã, ao abrir a janela do meu quarto vi o dia raiar por entre o escuro de um dia que se adivinhava cinzento, com um colorido emprestado por uns tímidos raios de Sol que teimavam em brincar por entre as nuvens que o encobriam, ora carregadas e escuras, ora lembrando flocos de algodão espalhados pelos céus da nossa cidade, que iam passando ao sabor do vento que as trazia e consigo as levava.

Entrava um calor saboroso janela adentro e ventava um pouco, fazendo com que os ramos das árvores acompanhassem o brincar dos raios com que o Sol teimava em querer pintar o céu por entre as nuvens.

Não era muito forte o vento, então.

Não sendo muito forte, convidava, prazenteiro, as nuvens passantes para uma dança de meio de Outono, a antever o Inverno com os seus bailes bem orquestrados das chuvas que se avizinham, assim o esperamos.

Tive assim a sorte e a ventura de poder apreciar uma dança, ora para cá, ora para lá, a acompanhar o vento regente que, sem direcção definida, comandava com um sincronismo absoluto e uma leveza indescritível, por entre os galhos e as folhas das árvores, colorindo em arco-íris uma miríade de pequenas gotas de água que teimavam em brincar e dançar, em vez de pesadamente cair, a dizer que a chuva também pode dançar quando tem o vento por companhia, fazendo que o frio aqueça, colorindo o cinzento em desejos de um bom e feliz dia.

A formiga no carreiro virou-se pró formigueiro e disse:

mudem de rumo mudem de rumo já lá vem outro carreiro.

Independentemente das ideologias(se é que ainda as há neste mundo conturbado e em mudança constante, não só no clima, mas também nas orgânicas do pensamento ideológico), temos o dever de ser como a formiga de José Afonso, mudar de rumo e experimentar ir por caminhos diferentes, se quisermos continuar a olhar e ver a beleza com que somos brindados diariamente pela nossa natureza circundante.