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Depois de um táxi pode não vir outro

Passados dois anos sobre a sua primeira grande manifestação, os profissionais de táxi voltaram à estrada em Lisboa, Porto e Faro, mas desta vez melhor apetrechados com t-shirts, cartazes, bandeiras e hashtags.

Protestam contra a entrada em vigor no próximo dia 1 de Novembro, da nova lei que estabelece o regime jurídico da atividade de transporte individual e remunerado de passageiros em veículos descaracterizados a partir de plataforma eletrónica, vulgarmente conhecida por Lei Uber. As maiores causas deste descontentamento prendem-se com as circunstâncias de não haver um número máximo destes carros por município e pela existência de preços variáveis e dinâmicos por parte destas plataformas eletrónicas, ao contrário do que sucede com os táxis, que têm um número limite e preços tabelados. Mas o problema é muito mais profundo do que aparenta.

Em Portugal operam quatro destas plataformas: a Uber, a Cabify, a Taxify e mais recentemente a Chauffer Privé que pela novidade, segurança, preço, comodidade e acessibilidade digital têm merecido a confiança dos portugueses. Embalados por este encantamento popular, aproximadamente 80% dos deputados da Assembleia da República aprovaram a Lei n.º 45/2018 que regula o seu regime jurídico. A ilação é clara. Estas plataformas gozam da simpatia dos decisores e consumidores e estão cá para ficar.

E o que dizer dos taxistas e da sua luta, terão sido deixados ao abandono ou autoexcluíram-se do mercado?

Um Relatório de 2016 do World Economic Forum, estimou que 65% das crianças que estão agora no 1º Ciclo terão profissões que ainda não existem. Por conseguinte, outras tantas desaparecerão porque em maior ou menor medida, deixarão de cumprir a sua função social.

Com as constantes transformações económicas, culturais e sobretudo digitais, é fundamental que os profissionais em qualquer setor de atividade se adaptem e se adequem às novas tendências, exigências e necessidades dos clientes e consumidores. Esta capacidade de adaptação determinará a relevância, destaque e evolução no mercado de trabalho. Os taxistas são, lamentavelmente, vítimas desta falta de consciencialização.

Se aquelas plataformas eletrónicas - nomeadamente a Uber - gozaram desta aceitação massiva e quase imediata, é porque em algum momento e de uma forma ou de outra os serviços de táxi deixaram, por falta de adaptação, de servir as necessidades dos utilizadores. Diria até que foram os seus próprios profissionais, que por ação ou omissão, criaram as condições ideais para que aquelas plataformas pudessem proliferar no mercado. Os relatos e as experiências de trajetos de táxi com percursos desnecessários, os altos preços, o tempo de espera e o atendimento nem sempre ideal, são lugares comuns na utilização daqueles serviços – sobretudo em Lisboa. Não se deve nem se pode generalizar e há obviamente exceções, mas o julgamento popular e a resposta do mercado têm de ter as suas leituras e conclusões.

Os profissionais do setor não atenderam às reclamações e exigências dos seus clientes, não se adaptaram ao novo paradigma imposto por estes modelos de transporte via plataforma eletrónica e simplesmente autoexcluíram-se do mercado. De forma paradoxal e curiosa – mas no fundo previsível - esta greve teve o efeito perverso de fazer perder ainda mais clientes que, ao precisarem dos seus serviços, só lhes restavam a Uber, a Cabify, a Taxify ou a Chauffer Privé, porque os taxistas estavam demasiado ocupados a lutar por uma causa, que por culpa própria, já não é deste tempo.