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2020-2030: Década do Desenvolvimento Sustentável dos Oceanos da ONU

O ‘princípio de Peter’ é o de que ‘os únicos investimentos viáveis para os oceanos são os sustentáveis’

Durante a ‘Ocean Week’ que teve lugar em Mindelo, Cabo Verde foram várias as intervenções dignas de registo. No entanto, destaco a intervenção do Embaixador das Nações Unidas para o Oceano, Peter Thompson. Natural das Ilhas Fiji, com formação superior na Universidade de Cambridge (Reino Unido), Peter tem uma visão do mundo, mas um coração de ilhéu. Para o desenvolvimento da Economia Azul, o Embaixador defende uma abordagem sequencial, que passa pelo desenvolvimento da ciência, um bom planeamento, como pré-condição para viabilizar o financiamento: Ciência-Planeamento-Financiamento. Neste particular, o ‘princípio de Peter’ é o de que ‘os únicos investimentos viáveis para os oceanos são os sustentáveis’.

Este racional está igualmente patente no programa de financiamento do Banco Mundial para a Economia Azul: PROBLUE. O PROBLUE conta um orçamento de $150 milhões comprometidos pelos doadores na “Blue Economy Conference”, que decorreu em Nairobi em Novembro de 2018. Os principais temas prioritários para o PROBLUE são as pescas e a aquacultura, as ameaças à saúde dos oceanos, nomeadamente a poluição, o desenvolvimento sustentável dos sectores com mais impacto, nomeadamente o turismo, os transportes marítimos e as energias renováveis offshore, bem como os projetos que aumentam a capacidade dos governos para gerir os seus recursos costeiros de forma integrada, com benefícios para a mitigação dos impactos das alterações climáticas. Para as Nações Unidas, bem como para o Banco Mundial, é simples, ou os governos começam a estudar os oceanos de forma a viabilizar um planeamento integrado possibilitando uma exploração sustentável ou não existirá financiamento internacional! Segundo o Embaixador o risco em investir em regiões onde não existe informação e conhecimento adequado é demasiado elevado, hipotecando a sua viabilidade. Por outro lado, considerando os custos elevados dos empreendimentos no mar, o investimento só poderá ser efetuado a longo prazo, logo terá de ser sustentável.

Com estes pressupostos na agenda, as Organização das Nações Unidas (ONU), proclamaram 2020-2030 como a ‘Década do Desenvolvimento Sustentável dos Oceanos’, e a conferência que irá inaugurar este compromisso terá lugar em Lisboa, entre 2 a 6 de Junho de 2020. Empenhada na urgência de agir de forma a deixar um oceano vivo para as futuras gerações, a ONU tomou esta decisão em 2018, após um grupo de especialistas e decisores políticos terem produzido um relatório onde identificam o oceano como solução para as alterações climáticas e onde estão propostas cinco soluções concretas:

1 – Apostar nas energias renováveis oceânicas, tais como (novas) turbinas para viabilizar o aproveitamento do vento offshore; painéis fotovoltaicos flutuantes; sistemas de aproveitamento da energia das ondas e/ou das marés;

2 – Aumentar a eficiência energética dos transportes marítimos nomeadamente através da implementação de combustíveis alternativos com uma baixa pegada de carbono (ex. hidrogénio), bem como através do aumento da eficiência do design e construção dos navios;

3 - Conservar os ecossistemas costeiros incluindo através da restauração de habitats perdidos e/ou expandir a cultura de algas como uma fonte alternativa de combustível e de alimento para consumo humano;

4 – Reduzir as emissões de carbono nas pescas e na produção aquícola; optar por alimentos marinhos com baixa pegada de carbono tais como as algas, de forma a substituir a alimentação intensiva efetuada com rações produzidas em terra provenientes de regiões longínquas;

5 – Investir na investigação necessária para minimizar o impacto ambiental e aumentar o sequestro de carbono no leito marinho, podendo assim contribuir para remover as barreiras legais e económicas necessárias;

Segundo o relatório a implementação destas medidas deverão reduzir a 1/5 (-21%), a emissão dos gases responsáveis pelo efeito-de-estufa, mantendo um aumento de temperatura global abaixo dos 1.5ºC na próxima década, o que seria equivalente a retirar 2.5 biliões de carros das estradas do Planeta.

Foram igualmente identificados uma série de outros efeitos colaterais destas cinco ações propostas pela ONU, nomeadamente com a criação de novas oportunidades de emprego, aumento da resiliência dos habitats costeiros, bem como o crescimento de novos sectores da economia. Os principais benefícios socias incluem a redução da mortalidade considerando uma melhoria da qualidade do ar e das dietas que devem convergir para fontes de proteína com baixa pegada de carbono, um aumento da segurança alimentar, assim como o aumento de oportunidades e da qualidade de vida nas zonas costeiras. Enquanto que os principais benefícios ambientais incluem proteção da biodiversidade e a redução da acidificação dos oceanos.

É evidente que para viabilizar estas cinco ações é necessária vontade política, incluindo sinais claros para manter os investidores privados no caminho proposto, bem como novas linhas de financiamento público para viabilizar a criação de mais conhecimento e de novas tecnologias. Será que a Madeira está preparada para enfrentar / aproveitar estes novos desafios / oportunidades?