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Neozelandeses organizam-se para demonstrar apoio a comunidades muçulmanas

FOTO Reuters
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Habitantes da Nova Zelândia estão hoje a demonstrar apoio às comunidades muçulmanas, em choque depois do ataque de um supremacista branco, acusado de disparar em duas mesquitas, matando 49 pessoas, e que ficou em silêncio perante o juíz.

Brenton Harrison Tarrant, de 28 anos, compareceu perante um tribunal, no centro de rígidas medidas de segurança, algemado e vestido com o uniforme prisional, sem demonstrar qualquer emoção quando o juiz leu a primeira acusação de homicídio.

O juiz disse que “era razoável presumir” que mais acusações se seguiriam.

Tarrant colocou ‘online’ um manifesto anti-imigrantes e, aparentemente, usou uma câmara montada num capacete para transmitir em direto o vídeo do massacre durante as orações de sexta-feira na cidade de Christchurch.

A primeira-ministra, Jacinda Ardern, declarou ser “um dos dias mais sombrios da Nova Zelândia” e disse que o atirador, um australiano, optou por atacar na Nova Zelândia porque “representa diversidade, gentileza e compaixão”.

Os neozelandeses parecem querer provar que Ardern tem razão e estão a voluntariar-se para praticar actos de bondade: alguns ofereciam boleias até aos supermercados ou acompanhavam os seus vizinhos muçulmanos para que estes não se sentissem inseguros.

Nos fóruns ‘online’, as pessoas discutiam as restrições alimentares muçulmanas, enquanto se preparavam para levar refeições até aos afectados.

“O amor sempre vence o ódio. Muito amor para nossos irmãos muçulmanos”, dizia um cartão escrito à mão numa parede de flores, que se estendia por um quarteirão inteiro, numa parte histórica da cidade.

Ainda assim, os muçulmanos foram aconselhados a ficar longe das mesquitas, enquanto o alerta de segurança do país permanecia no segundo nível mais alto, um dia após o tiroteio mais letal da história moderna da Nova Zelândia.

Ardern disse que 39 sobreviventes permaneciam hoje hospitalizados, 11 dos quais gravemente feridos, mas as actualizações demoravam a chegar e muitas famílias ainda aguardavam notícias dos desaparecidos.

Do lado de fora de uma das duas mesquitas, Ash Mohammed, de 32 anos, empurrou barricadas policiais na esperança de descobrir o que aconteceu com seu pai e dois irmãos, cujos telemóveis ficaram sem resposta. Um agente da polícia impediu-o de passar.

“Nós apenas queremos saber se eles estão mortos ou vivos”, disse Mohammed ao agente.

À procura de notícias, familiares e amigos das vítimas reuniram-se no Hagley College, perto do hospital.

Entre eles, Asif Shaikh, de 44 anos, disse estar entre as 100 pessoas que se encontravam na mesquita Al Noor quando o agressor chegou e que sobreviveu fingindo estar morto. Agora estava ali, desesperado para saber o que aconteceu com os companheiros que estavam lá com ele.

Perto dali, Akhtar Khokhur apoiou-se nos ombros da sua amiga e chorou ao segurar um telemóvel com uma imagem do seu marido.

“Eu ainda não sei onde ele está”, disse ela.

Khokhur, de 58 anos, e o marido, Mehaboobbhai Khokhur, de 65, viajaram da Índia para passar algum tempo com o filho Imran, a primeira visita do casal desde que este se mudou para a Nova Zelândia, há oito anos. O casal deveria regressar à Índia no domingo.

Imran tinha deixado o pai, engenheiro electrónico, na mesquita de Al Noor, na sexta-feira, e foi estacionar o carro quando o tiroteio começou. Os pais não conseguiram falar com ele desde então.

O atirador colocou um manifesto de 74 páginas nas redes sociais, no qual ele se identificou como um australiano e supremacista branco que queria vingar os ataques perpetrados por muçulmanos na Europa, tendo transmitido 17 minutos do tumulto na mesquita de Al Noor, onde, armado com pelo menos duas espingardas de assalto e uma ‘shotgun’, disparou contra os fiéis, matando pelo menos 41 pessoas.

Mais pessoas foram mortas pouco tempo depois, num ataque a uma segunda mesquita, em Linwood, a cerca de cinco quilómetros de distância.

O Facebook, o Twitter e a Google esforçaram-se para retirar o vídeo do atirador, mas este ainda estava amplamente disponível nas redes sociais horas após o ataque.

O comissário de polícia Mike Bush confirmou que Tarrant estava envolvido em ambos os tiroteios, mas não chegou a dizer que ele era o único atirador.

Dois outros suspeitos armados foram detidos na sexta-feira, enquanto a polícia tentava determinar se desempenharam algum papel no ataque a sangue-frio que surpreendeu a Nova Zelândia, um país pacífico em que os polícias raramente andam armados.

A Nova Zelândia, com uma população de cinco milhões, tem leis de armas relativamente liberais e estima-se que tenha 1,5 milhões de armas de fogo, ou aproximadamente uma para cada três pessoas.

No entanto, tem uma das taxas mais baixas de homicídio por armas do mundo. Em 2015, registou oito casos.