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Fact Check Madeira

Investigação científica sobre as tartarugas na Madeira não se limita à ‘Búzio’?

Tartaruga 'Búzio' foi libertada na semana passada nos mares da Madeira após cerca de um ano de tratamentos na Estação de Biologia Marinha do Funchal. Foi colocado um localizador na sua carapaça. 
Tartaruga 'Búzio' foi libertada na semana passada nos mares da Madeira após cerca de um ano de tratamentos na Estação de Biologia Marinha do Funchal. Foi colocado um localizador na sua carapaça. , Foto DR

No dia 20 de Setembro, foi libertada nos mares da Madeira uma tartaruga-comum, a ‘Búzio’, após um longo processo de recuperação na Estação de Biologia Marinha do Funchal, depois de ter sido capturada por anzóis, junto à costa.

Na carapaça do animal foi colocado um transmissor de satélite, cuja informação reportada dois dias depois dava conta de que a tartaruga ou o seu localizador estaria na zona dos Barreiros, no Funchal.

Levantou-se, entretanto, a questão sobre que desfecho teria conhecido este animal da classe dos répteis e se o projecto em que a mesma estava envolvida era posto em causa com o seu anunciado desaparecimento, ou se, como notou um leitor do DIÁRIO, a investigação neste âmbito não se limitava a esta tartaruga. São essas dúvidas que vamos procurar esclarecer nesta rubrica.

A ‘Búzio’ é uma tartaruga-comum (‘Caretta caretta’) que foi capturada por um anzol de pesca no ano passado, nos mares da Madeira, junto à costa. Depois de cerca de um ano de tratamento na Estação de Biologia Marinha do Funchal, no passado dia 20 de Setembro o animal foi devolvido ao seu habitat natural, tendo-lhe sido colocado, na carapaça, um equipamento que permite, além da sua localização e trajectória após a libertação, recolher informações sobre comportamento nos mergulhos realizados, contribuindo para estudos de investigação em curso sobre esta espécie na Região.

O financiamento do dispositivo colocado nesta tartaruga foi assegurado pelo projecto ‘Education & Citizen Science to Help Endangered Sea Turtles around Madeira Island’ (‘Educação & ciência cidadã para ajudar as tartarugas marinhas ameaçadas de extinção na ilha da Madeira’, na tradução em português), que tem a Universidade da Madeira (UMa) como promotor, sendo custeado em 100 mil euros pela Fundação Belmiro de Azevedo.

O projecto teve início em 2023 e termina este mês, conforme revelou Thomas Dellinger ao DIÁRIO. O docente da UMa, que tem dedicado muita da sua investigação ao estudo das tartarugas que passam pelo Arquipélago da Madeira, refere que, além das acções levadas a cabo nos últimos dois anos, em breve serão publicados alguns artigos científicos com os resultados alcançados.

O investigador realça que o mesmo permitiu abordar os principais problemas relacionados com a conservação das tartarugas através de uma abordagem integrada centrada na educação. O projecto visou minimizar os riscos e perigos a que as populações de tartarugas marinhas ameaçadas estão expostas nas águas madeirenses, contribuindo para a literacia local do oceano.

Quanto à ‘Búzio’, que inicialmente foi dada como desaparecida, Thomas Dellinger esclarece que o animal já foi localizado, estando no mar e, ao que tudo indica, bem. Além disso, nota que a informação de desaparecimento resultou de um erro de processamento dos dados de localização transmitidos, pelo que adianta que os dados recolhidos indicam que este exemplar tem ‘andado’, nos últimos dias, na baía do Funchal, junto à costa.

O que acontece é que o sistema colocado na tartaruga tem duas vertentes, uma de GPS e outra de satélite. O transmissor recebe dois tipos de localização, as localizações frequentes ARGOS, que podem ter uma margem de erro, por vezes grande, associado; e as localizações GPS (fastloc), que são mais raras, mas mais precisas. Estas últimas só são enviadas quando a antena do dispositivo está fora de água, pelo que pode demorar vários dias até que uma destas localizações seja calculada. Thomas Dellinger, docente da UMa e investigador

Para evitar estas interpretações erróneas dos dados, Thomas Dellinger esclarece que, agora, só estão refelctidas na página dedica ao acompanhamento desta tartaruga, as posições exactas. O animal pode ser 'seguido' na página oficial do projecto: https://tartaruga.web.uma.pt/

Sobre o trajecto do animal após ter sido libertado, o investigador diz ser curioso que a ‘Búzio’ tenha regressado praticamente ao Cais do Carvão, onde foi mantida no último ano em tratamentos. Depois disso, foi nadando ao longo da costa, facto que condiciona a precisão de algumas dessas posições, nomeadamente devido ao reflexo do sinal.

Dada a idade desta tartaruga, Thomas Dellinger diz-se expectante por saber se a mesma vai encetar um regresso ao seu local de origem, nas costas dos Estados Unidos, atravessando o Atlântico. “À semelhança dos dados que registámos anteriormente, penso que esta tartaruga ainda pode fazer isso, pois está no tamanho máximo dos exemplares que costumamos ter aqui, na ilha da Madeira. Portanto, a minha expectativa é que, mais dia menos dia, ela empreenda o regresso às suas praias natais”, aponta, notando que, ao se concretizar, essa será a primeira vez em que esse registo de regresso irá ser feito.

Por enquanto, o seu comportamento tem sido muito semelhante aos dos outros espécimes que existem nas águas regionais, que surgem, “cada vez mais”, junto à costa, a julgar pelas obersações realizadas, mas também pela maior frequência com que estes animais são ‘pescados’ nos anzóis de pescadores de terra. Em média são capturadas três a quatros tartarugas, na Região, nestas condições.

Nesse sentido, aquele investigador pede a colaboração de todas as pessoas para que, em situações destas, alertem as autoridades, nomeadamente a Polícia Marítima, ou a Guarda Nacional Republicana; ou o Instituto das Florestas e Conservação da Natureza; ou até mesmo a Universidade da Madeira e a Estação de Biologia Marinha do Funchal. Essa sensibilização foi um dos objectivos do projecto financiado pela Fundação Belmiro de Azevedo.

Aquele responsável nota que o estudo das tartarugas não depende apenas da ‘Búzio’, salientando que a recolha de informação em curso será fundamental para um melhor conhecimento destes animais que passam pelas águas da Madeira. Particularmente sobre o projecto em causa, embora o mesmo esteja a terminar, Thomas Dellinger aponta que o mesmo deu “uma nova energia à investigação das tartarugas e possibilitou-nos melhorar muitas coisas”. E concretiza: “Temos, neste momento, publicações a sair sobre os plásticos que elas engolem e sobre vários outros aspectos do seu comportamento em águas madeirenses. Os trabalhos vão continuar, embora com outras fontes de financiamento”, enfatiza o biólogo.

Perante o exposto, podemos confirmar que a tartaruga ‘Búzio’ já foi localizada e que a investigação em curso na Madeira não se limita a este espécime, com Thomas Dellinger a apontar anos dedicação ao estudo das espécies que passam pela Madeira. No futuro, espera poder ampliar o conhecimento existente com os dados que conta recolher no decorrer do próximo ano, através do localizador colocado nesta tartaruga.

"A tartaruga 'Búzio', que chegou a ser dada como desaparecida pelos investigadores, foi localizada nos mares da Madeira, junto à costa e, ao que tudo indica, está bem. Ainda assim, a investigação em curso sobre estes animais não se limita a este espécime", refere um leitor do DIÁRIO.