DNOTICIAS.PT
Foto Shutterstock
Explicador Madeira

Dez perguntas e respostas sobre o recurso a imagens de videovigilância

O caso do homem que agrediu a mulher em Machico abriu um debate sobre o problema da violência doméstica mas também sobre outras questões paralelas. Por exemplo, a secretária regional de Inclusão, Paula Margarido, alertou na RTP-Madeira que as imagens de videovigilância que chocaram o país não poderão ser utilizadas como prova em tribunal, por supostamente terem sido captadas sem consentimento.

De facto, em Portugal a utilização de imagens de videovigilância como prova em processo criminal tem regras próprias, com limites definidos na Constituição, no Código de Processo Penal e em legislação especial. Que regras são essas?

Desde logo, a Constituição da República Portuguesa estipula que “são nulas todas as provas obtidas mediante (…) abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações” (art. 32.º). Por sua vez, o Código de Processo Penal (CPP) reforça que, “ressalvados os casos previstos na lei, são igualmente nulas, não podendo ser utilizadas, as provas obtidas mediante intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações sem o consentimento do respectivo titular” (art. 126.º).

Com base na informação que consta do site da Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD), apresentamos a resposta a dez dúvidas sobre este tema.

Se quisermos instalar um sistema de videovigilância para protecção de pessoas, como devemos proceder?

Para poder instalar um sistema de videovigilância há que atender a vários requisitos legais, que podem incluir, além do Regulamento Geral sobre a Protecção de Dados (RGPD), a legislação portuguesa que o executa (Lei n.º 58/2019), a que regula a actividade de segurança privada (Lei n.º 34/2013) ou o Código do Trabalho, consoante o que for aplicável à situação concreta. Com o novo regulamento europeu de protecção de dados, já não é necessário pedir autorização ou fazer alguma notificação à CNPD para ter um sistema de videovigilância.

É obrigatório afixar um aviso informativo?

Sim. Nos locais objecto de vigilância com recurso a câmaras de vídeo é obrigatória a afixação, em local bem visível de um aviso informativo com simbologia com características previstas na lei.

Durante quanto tempo temos de conservar as imagens de videovigilância?

A menos que se trate de uma organização que esteja abrangida por legislação específica de videovigilância que imponha prazos determinados, as imagens devem ser conservadas pelo período de 30 dias, sendo obrigatório eliminar as imagens até 48 horas após os 30 dias. Isto sem prejuízo de ser necessário manter as imagens por mais tempo, no âmbito de processo criminal em curso.

Quais são os locais onde não podemos pôr câmaras?

A instalação de videovigilância tem por objectivo a protecção de pessoas e bens, seja pelo seu potencial efeito dissuasor, seja para permitir a identificação do perpetrador em processo criminal. Por isso, a colocação das câmaras deve ter em conta a estrita necessidade de manter um perímetro de segurança e de controlar os acessos a partir do exterior, de modo adequado às circunstâncias do local e de modo proporcionado para não restringir excessivamente os direitos dos cidadãos. Assim, as câmaras não podem incidir sobre as vias públicas, propriedades limítrofes ou outros locais que não sejam do domínio exclusivo do responsável. Também não podem incidir sobre o interior de áreas reservadas a clientes ou utentes, tais como instalações sanitárias, zonas de espera, áreas técnicas de cabeleireiros, zonas de descanso ou lazer, o interior dos elevadores, salas de refeições, esplanadas, vestiários, interior de piscina ou ginásio. Na colocação das câmaras, deve ser tido especial cuidado para que estas não permitam captar imagens da digitação de códigos de segurança em terminais de pagamento ou caixa multibanco. Nos estabelecimentos de ensino, as câmaras só podem incidir sobre os perímetros externos e locais de acesso e ainda sobre espaços cujos bens e equipamentos requeiram especial protecção, como laboratórios ou salas de informática.

Quando a lei obriga a ter sistemas de videovigilância, como proceder?

Nalguns sectores específicos de actividade, há legislação especial que obriga à instalação de sistemas de CCTV, como por exemplo em estabelecimentos financeiros, em gasolineiras, ourivesarias, armeiros ou empresas sucateiras. Nestes casos, o fundamento de legitimidade da videovigilância assenta no cumprimento de obrigação legal, mas em termos de procedimento não altera em nada o que foi acima explicado. Todas as restantes obrigações legais têm de ser observadas.

Além da imagem, é possível proceder à captação de som?

É proibida a captação de som, excepto no período em que as instalações estejam encerradas, isto é, sem pessoas a trabalhar nas zonas vigiadas, ou mediante autorização prévia da CNPD.

Quais são as condições para ter videovigilância no local de trabalho (armazém, oficina, escritório, fábrica, etc.)?

No contexto laboral, mantêm-se vigentes as condições impostas pelo Código do Trabalho para a vigilância à distância, à excepção da necessidade de solicitar autorização da CNPD, que é incompatível com o RGPD. Assim, a videovigilância não pode ser usada para controlo do desempenho dos trabalhadores, não devendo, por isso, incidir regularmente sobre estes, o que exclui a abrangência das áreas de laboração, seja em linha de produção, armazém ou trabalho administrativo em escritório. As câmaras também não podem incidir sobre o interior de áreas reservadas aos trabalhadores, designadamente áreas de refeição, vestiários, ginásios, instalações sanitárias e zonas exclusivamente afectas ao seu descanso. Os trabalhadores têm de ser informados sobre a existência da videovigilância. As imagens só podem ser utilizadas no âmbito de processo penal e, apenas posteriormente, ser utilizadas para efeitos de apuramento de responsabilidade disciplinar.

Pretendendo pôr um sistema de videovigilância na sua moradia/propriedade, o que tem de fazer para estar dentro da lei?

Não é necessário fazer qualquer notificação à CNPD. Mas as câmaras só podem abranger imagens dentro da sua propriedade. Não podem ser captadas quaisquer imagens da via pública, de propriedades de terceiros ou caminhos de uso comum (servidões de passagem). As câmaras não podem ser colocadas em suporte fora da sua propriedade. Se tiver trabalhadores dentro da sua propriedade, a localização das câmaras não pode implicar a monitorização constante dos seus movimentos, devendo estes ser informados sobre a existência do sistema de videovigilância. Se o sistema de videovigilância se destinar à protecção de pessoas e bens, as imagens só podem ser usadas para fins de participação criminal.

As autorizações de videovigilância emitidas antes da entrada em vigor do RGPD continuam válidas?

Sim, em tudo o que não contrarie o disposto no RGPD ou na Lei n.º 58/2019. Os responsáveis pelo tratamento devem cumprir as condições estabelecidas nas autorizações para o tratamento de dados pessoais através de videovigilância.

Como devemos fazer para acrescentar mais câmaras às que estão referidas na autorização da CNPD?

Já não é necessário realizar nenhuma notificação ou comunicação à CNPD. Se colocarmos câmaras em locais não abrangidos pela autorização, esta caduca automáticamente. De qualquer forma, devemos ter atenção para não captar imagens em zonas não permitidas. De acordo com o RGPD, é o responsável pelo tratamento que deve analisar previamente se o tratamento de dados pessoais, decorrente da utilização de um sistema de videovigilância, cumpre os requisitos legais.