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Regionais 2025 Madeira

Concordar não é deixar de ter opinião

Carlos Diogo Pereira, professor, escritor, membro do grupo FATUm e elemento da Associação Académica da Madeira, mede a temperatura política ao décimo primeiro dia de campanha, optando por falar do que não tem visto nem ouvido

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"Os jovens querem estabilidade económica. Isso implica o reconhecimento da sua formação com salários adequados ao custo de vida e ao investimento que fizeram na sua educação"

Ao trabalhar diariamente em projectos que envolvem jovens entre os 18 e os 25 anos de várias nacionalidades apercebo-me de que, ao contrário do que se possa pensar, estes sabem bem que problemas as suas comunidades têm que enfrentar e que linhas gostariam que norteasse as políticas da juventude.

Os jovens podem não saber exactamente o que se encontra no programa dos partidos políticos que concorrem a estas eleições Regionais de 23 de Março. Eles podem não saber muito bem que significa ser de esquerda ou ser de direita, mas sabem que gostam tanto das sessões parlamentares como dos abraços dos políticos durante a campanha.

Não têm interesse na política tradicional. Se isso não é grave por não irem ao jantar-comício ou ao arraial do partido, é perigoso quando deixam de votar. O meu voto passa a valer mais, pois vale pelo meu e pelo deles.

Os jovens estão envolvidos em causas sociais. Gritam contra a guerra, a favor sexualidade diversa, da protecção do ambiente. Sabem que os salários são baixos, que as casas são caras, que não há alojamento estudantil, que a universidade cobra taxas que as outras não cobram. Mas dos políticos, nem soluções para as grandes causas, nem os seus problemas quotidianos. Vêem-nos ocupados com outras questões - de que me escuso a abordar pois também não lhes interessa.

Vale a pena votar! Vale, vale sim! Antigamente, quando apenas um decidia, não era melhor. Nunca foi, nem nunca poderia ter sido! Nos tempos da Velha Senhora nem todos iam à escola. Nem todos iam ao médico. Nem todos tinham água, esgotos ou luz em casa. Não havia televisão para todos. Não havia telemóveis, mas já havia telefones - para alguns. Havia máquina de lavar roupa, mas a maior parte das famílias lavava a roupa à mão! É isto que querem? Claro que não! Informem-se e votem. Não deixem os outros votarem por vocês!

SALÁRIOS BAIXOS

Os jovens deste país, incluindo a Madeira, buscam estabilidade económica, mas enfrentam uma realidade desanimadora: salários baixos, contratos precários e dificuldades para alcançar autonomia financeira. Após anos de estudo e investimento na sua formação, esperam reconhecimento através de remunerações justas, compatíveis com o custo de vida. No entanto, muitos vêem-se forçados a emigrar em busca de melhores condições, o que leva à fuga de talentos e enfraquece o desenvolvimento nacional. Sem uma valorização adequada, o país arrisca perder profissionais qualificados e comprometer o seu próprio progresso. Isto interessa principalmente aos jovens, mas apesar de ser uma tema escaldante, não tem sido muito falado pelas diferentes candidaturas às ‘Regionais’.

A DIFICULDADE NA PROCURA DO PRIMEIRO EMPREGO

“Procuramos funcionário. (5 anos de experiência)” - O paradoxo da experiência exigida para o primeiro emprego reflecte um dos grandes entraves à inserção dos jovens no mercado de trabalho. Anúncios que pedem anos de experiência para funções iniciais expõem a incoerência de um sistema que forma profissionais, mas não lhes dá oportunidade de começar. Afinal, quantos jovens podem ter essa experiência sem nunca terem trabalhado? Será que empregos temporários, como virar hambúrgueres, contam? E o voluntariado ainda tão mal valorizado em Portugal? A falta de oportunidades reais limita o crescimento profissional e perpetua a frustração de uma geração qualificada, mas impedida de dar o primeiro passo rumo à estabilidade. Nesta campanha, este tema deveria ser quente, mas tem estado ausente.

A OFERTA DE CASA PARA ARRENDAR

A dificuldade dos jovens em arrendar uma casa compromete a sua autonomia e adia planos de formar família, tornando-se um problema social e económico a longo prazo. Com salários desajustados ao custo de vida e rendas elevadas, muitos permanecem na casa dos pais até tarde, incapazes de construir um futuro independente. Dentro de uns anos teremos uma entrevista com o João, um jovem de 50 anos, que só recentemente saiu de casa e planeia ter filhos. Será essa a realidade no nosso país. Sem soluções eficazes para habitação e salários dignos, o envelhecimento da população e a fuga de talentos agravam-se, afectando o desenvolvimento do país. Nesta campanha fala-se de habitação, mas sem o envolvimento dos jovens.

APOIO À SAÚDE MENTAL

Esta saúde mental é dos mais conhecidos parentes pobres (mísero até) da grande e feliz família dos cuidados de saúde. A avó não fala dessa parte da família. A saúde mental dos jovens, em particular, tem sido cada vez mais afectada pela pressão académica, instabilidade laboral e dificuldades financeiras. Ansiedade e depressão tornam-se problemas comuns numa geração que lida com a incerteza do futuro e a exigência constante de produtividade. O acesso a apoio psicológico é limitado e os cheques-psicólogo foram uma ideia interessante, mas não chegaram a todos e só davam dez consultas (talvez uma espécie de tratamento rápido ou apenas um test drive na ida ao psicólogo). Certo é que ficou aquém do que pediam os estudantes e aconselhavam os profissionais. Nesta campanha pouco ou nada se fala deste tema.