DNOTICIAS.PT
Artigos

É hora de darmos as mãos pela Madeira

A Madeira encontra-se num momento de inflexão histórica. A crise política permanente que hoje vivemos não é um acaso fortuito, nem um evento isolado no tempo. É, antes, o reflexo de um longo processo de erosão da confiança dos cidadãos e do esgotamento de um modelo de governação que já não responde às exigências do presente, muito menos aos desafios do futuro. Miguel Albuquerque personifica este declínio. O projeto que outrora se apresentava com a visão de renovação e, mais tarde, de estabilidade, revelou-se, afinal, um ciclo vicioso de dependências, manobras e alianças forçadas, que desviam a política regional da sua verdadeira missão: servir o interesse público.

A política, tal como a vida, reflete as escolhas coletivas que fazemos e as omissões que permitimos. O Partido Socialista da Madeira enfrenta um desafio que transcende o mero ato eleitoral. Perdeu, ao longo dos anos, o seu papel central no debate político e encontra-se agora numa encruzilhada que exige clareza e coragem. Não se pode construir uma alternativa de governação sem antes assumir, com humildade e sentido de responsabilidade, os erros cometidos. Se os resultados se repetem, não é suficiente culpar terceiros – há que encarar as falhas, aprender com elas e reorganizar-se.

A Madeira necessita de um PS forte, coeso e profundamente enraizado na sociedade civil. Precisa de novos protagonistas, mas, acima de tudo, de uma nova abordagem política, capaz de inspirar e mobilizar os madeirenses e portossantenses. Um partido preparado para governar deve ser um partido que escuta, que compreende e que representa. Em 2019, Paulo Cafôfo conseguiu devolver ao PS a credibilidade enquanto alternativa viável. Esse espírito deve ser resgatado, sob pena de o partido se tornar irrelevante e perder definitivamente a sua posição enquanto força determinante no equilíbrio político da Região.

Desde logo, o PS Madeira deve apresentar-se a estas eleições com os seus melhores quadros. Nomes como Bernardo Trindade, Célia Pessegueiro, Ricardo Franco, Emanuel Câmara, Sara Cerdas, Miguel Silva Gouveia, Liliana Rodrigues, João Pedro Vieira, entre outros, devem integrar os lugares cimeiros. De uma vez por todas, para ficar bem claro, há mais o que nos une do que o que nos divide. Não é momento para desavenças nem desentendimentos pessoais. Mesmo que existam divergências mútuas entre algumas figuras, tais atitudes não podem sobrepor-se ao interesse coletivo da Madeira. A responsabilidade coletiva que o PS Madeira detém neste momento da nossa história, deve prevalecer sobre tudo. Só assim, será possível construir um projeto sólido, credível e mobilizador para a maioria social que aspira uma Mudança para a Madeira.

Além disso, o PS Madeira deve adotar uma campanha descentralizada, com equipas presentes nas 54 freguesias da Madeira, promovendo um trabalho meticuloso de proximidade, num contacto direto com os cidadãos. A política não se faz apenas em conferências de imprensa ou debates televisivos — faz-se no terreno, na escuta atenta das preocupações e anseios da população. Contudo, tal só será exequível com um partido verdadeiramente unido e mobilizado. A nossa Comunicação Digital e os nossos Estados Gerais assumirão um papel central na amplificação da mensagem que se pretende transmitir. Esta, porém, deve ser clara, objetiva e bem refinada, de modo a atingir eficazmente todos os segmentos da nossa sociedade.

As eleições que se aproximam não são apenas uma disputa partidária — representam um momento decisivo para o futuro da Autonomia, que se encontra em risco de degradação acelerada. A Madeira transmite hoje ao país a imagem de uma Região incapaz de se reorganizar, de se reinventar e de se libertar dos vícios do passado. Quem não tem idoneidade para liderar um governo deve afastar-se. Quem não possui condições para apresentar uma alternativa viável deve criá-las. Quem não tem capacidade para dialogar e construir consensos deve retirar-se da vida política.

Independentemente do resultado eleitoral de março, é evidente que a Madeira continuará a enfrentar desafios estruturais profundos. O atual sistema político-institucional foi moldado para perpetuar um poder que já não representa fielmente a vontade da população. O Representante da República, o Presidente da República e o Primeiro-Ministro pertencem a uma matriz política que procurará, a todo o custo, manter o PSD na liderança do Governo Regional. Mesmo perante uma eventual maioria alternativa, será difícil viabilizar uma mudança genuína, pois as forças do status quo tenderão sempre a proteger os seus próprios interesses. Paradoxalmente, aqueles que mais proclamam a defesa da Autonomia são, muitas vezes, os primeiros a hipotecá-la, recorrendo à tutela de Lisboa quando lhes é conveniente.

O descontentamento dos madeirenses e portossantenses é legítimo. Assistimos a uma classe política que se fecha sobre si mesma, alheia à realidade que a rodeia. Miguel Albuquerque garantiu a manutenção do seu poder através de uma coligação frágil com o CDS, assegurando, por um lado, a sua própria sobrevivência política e, por outro, a continuidade de um partido que há muito perdeu relevância. O JPP, sem uma base ideológica consistente e com um discurso populista, capta o descontentamento popular sem apresentar uma solução moderada, estruturada e credível. O mesmo se pode dizer do CHEGA na Madeira, que, apesar de ser quarta força política, não passa de um satélite das ambições de André Ventura.

O cenário que vivemos na Madeira resulta de uma classe política que, na sua generalidade, se perpetuou no poder sem olhar para além da sua própria esfera de influência. Governar não é um exercício de autoafirmação, mas um ato de serviço público. O político que se desconecta da realidade e que se refugia numa bolha de privilégios transforma-se num obstáculo ao progresso e contribui para cenários de instabilidade como aquele que hoje vivenciamos.

O tempo da reflexão chegou ao fim. O futuro da Madeira e da nossa Autonomia exige ação, renovação e, acima de tudo, coragem para mudar.