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A Madeira que aí vem

As últimas semanas têm sido férteis em casos e declarações que, proferidas na sequência de uma investigação judicial sem precedentes, espelham a indignação justificada de uns, a hipocrisia de outros, a conivência de alguns, o oportunismo de uns tantos e uma generalizada falta de capacidade para oferecer aos madeirenses aquilo que eles mais precisam neste momento, isto é, esclarecimentos rigorosos, união e opções reais e exequíveis para um futuro que se quer claro, transparente e orientado – só e apenas – pela importante e nobre missão de servir a Causa Pública.

Mas, olhando além dos julgamentos públicos que passaram a dominar com toxicidade uma parte excessiva do quotidiano desta nossa boa terra, há um número de desafios que perduram e exigem a acção comprometida e séria de todos aqueles que, não podendo corrigir o passado, querem fazer melhor, diferente e segundo um novo formato, muito mais impermeável às proximidades, aos compadrios, às cunhas, às chantagens, aos amiguismos e às relações corruptivas e de subserviência entre o poder económico e o exercício da política. Para esses, há quatro grandes desafios, que passamos a referir sumariamente.

Primeiro, recuperar a política, que tem de ser feita com ética, deontologia, independência, tendo por único barómetro os interesses dos cidadãos e não se rendendo aos pequenos chefes de aparelho, que se julgam capazes de manietar a Causa pública em prol de interesses privados. Para isso, é preciso não ter medo de fazer a limpeza generalizada que tem de ser feita no regime instalado, julgando quem deve ser julgado, prendendo quem tiver de ser preso e construindo uma nova Madeira com aqueles que não se renderam, nem se rendem, à vergonhosa devassa que por aqui prolifera.

Segundo, robustecer a Autonomia, quer a dos partidos face às estruturas nacionais, quer a do governo regional face à República. Neste momento, a mesma mostra-se preocupantemente frágil e permeável a um colonialismo doentio que se estende a vários níveis, desde o âmbito político e judicial ao campo opinativo e mediático. Tudo isto tem de ser combatido e mudado rapidamente, pois o futuro não é compatível com tiques arcaicos de centralismo num país no qual os madeirenses não devem nada a ninguém.

Terceiro, romper de vez com os relacionamentos privilegiados e de grande proximidade entre certa classe política e determinados grupos económicos, os quais são prova inequívoca da corrupção que lesa o erário público e dos apetites indisfarçáveis de certos peões do xadrez político-partidário, que sobranceiramente ainda alimentam a desprezível ideia de que estão na política para enriquecer e resolver as suas vidas – e não para servir aqueles a quem devem os cargos que ocupam.

Quarto, entregar a política a gente séria. Gente de verdade. Gente que tenha dado provas do que vale. Gente de quem se possa dizer que trabalhou na vida. Gente que conhece esse mundo real que existe longe e fora dos tachos que são trocados e recebidos à pala de acordos palacianos. Gente que saiba explicar, em tons de verdade em autenticidade, o que teve e o que tem em termos de património e rendimentos. Gente que se dedique e não passe o dia a apanhar papéis, sem nada de útil fazer em nome do povo. Gente com palavra. Gente de honra. Acima de tudo, gente que perceba que a política não vale como posto, mas como oportunidade para servir os outros, especialmente os que mais precisam.

É isso que se espera da Madeira que aí vem. Que em nada pode ser igual à Madeira que até agora tivemos.