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Quem cala, consente!

“O Mundo não será destruído pelo mal, mas por aqueles que os olham e não fazem nada”. Pensem nisto!

Por vezes, dou por mim a pensar o quanto podre a nossa sociedade está. Mas, logo de seguida, lembro-me dos relatos da história das civilizações e dos acontecimentos narrados na bíblia e logo reconheço que a podridão não é recente. Tem-se arrastado no tempo.

Esta semana foi dado a conhecer os dados do relatório da Comissão Independente sobre os abusos sexuais da igreja católica. Escandaloso o relato das idades das vítimas. A vítima mais jovem nasceu em 2016, tem 6 anos, e a mais velha faz este ano 90 anos, o que significa que o problema vem de longe. Soluções exigem-se e o silêncio faz cúmplices.

O problema do abuso sexual de crianças e jovens não se restringe à igreja católica. Este problema é bem mais vasto. Por vezes, alguém muito próximo a nós - um colega de trabalho, um conhecido, um familiar - pode ser predador e nem fazemos ideia. Pior são aquelas situações de homens casados, ditos “honrados”, pais de filhos e/ou filhas e predadores sexuais dos filhos e/ou filhas dos outros. Não se importam com a idade que têm.

Se se envolvem com menores, o dicionário designa-os de pedófilos. E estes predadores não devem ser denunciados e julgados? Porquê calar-se ou recuar na denúncia? O dinheiro encobre tudo? E com o pagamento de uma indemnização tudo fica resolvido?

Segundo os dados do Relatório Anual de Segurança Interna, em 2020, em Portugal, foram detidas 119 pessoas pelo crime de abuso sexual de crianças e outras 33 por pornografia de menores. Em 2021, estes valores alteraram ligeiramente com agravamento das detenções por crime de pornografia de menores - 97 pessoas pelo crime de abuso sexual de crianças e 70 por pornografia de menores. Se existe pornografia de menores é porque alguém está interessado na visualização deste tipo de vídeos. O problema é sério.

Sempre que existem relatos de abusos sexuais em crianças, os especialistas na matéria alertam para o facto da maioria destes abusos acontecerem dentro de casa e o agressor ser, na maior parte das vezes, alguém do seio familiar, ou da confiança da criança. Só em 12,2% dos casos o agressor é desconhecido da vítima. E os resultados dos Relatórios de Segurança Interna apontam que as vítimas são maioritariamente raparigas.

Os pais têm de estar atentos aos sinais que a criança ou jovem apresenta. A Presidente da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens, Rosário Farmhouse, numa entrevista que deu à CNN Portugal, em novembro de 2021, exemplificou dizendo: “Às vezes os sinais podem ser a criança não querer ir visitar aquela pessoa sem motivo aparente, não querer estar perto daquela pessoa, ou andar mais triste, ou, por exemplo, crianças muito pequenas mostrarem comportamentos demasiado sexualizados para a sua idade”.

Este problema por si só já é grave. Mas, com pessoas ligadas à igreja, o choque é ainda maior pela ética exigida aos homens que escolhem um caminho de vida que deveria ser baseado no amor e na ajuda ao próximo e nunca no aproveitamento da inocência e pureza de um outro ser humano.

Depois, espantam-se com o afastamento das pessoas da igreja e do radicalismo crescente na sociedade. A igreja tem um desafio grande pela frente e terá de saber lidar com ele. Não pode fugir. Um predador será sempre um predador e deve ser afastado das “possíveis presas”.

O conhecimento da existência destes horrores sem a devida condenação conduz à revolta popular. Há quem defenda a castração química, ou até mesmo, o retorno à pena de morte, inexistente no nosso sistema penal. Cuidado com a revolta popular. Poderemos ter de lidar com uma alteração de comportamentos na nossa sociedade. Depois não se espantem com a ascensão de certos grupos políticos radicais no nosso sistema político. Porque, na verdade, isto não devia de estar a acontecer.

A verdade também é que tomamos por garantidos os valores, a liberdade, a democracia, a vivência em tempo de paz, a justiça, a existência de uma sociedade saudável, respeitadora de homens e mulheres, sem xenofobismo nem racismo, pacífica e sem elevadas taxas de criminalidade e esquecemo-nos que nada é garantido na vida. A luta tem de ser constante.

Calar-se não é solução. Pelo contrário, cria cúmplices. Os tabus existentes na nossa sociedade precisam de ser desmistificados e todas as injustiças devem ser denunciadas e não aceites.

Termino com uma frase de Albert Einstein - “O Mundo não será destruído pelo mal, mas por aqueles que os olham e não fazem nada”. Pensem nisto!