Sãozinha, a heroína mártir da Ponta do Sol

Estamos em vésperas do 60.º aniversário da morte trágica da jovem Belmira da Conceição Gonçalves, carinhosamente recordada por Sãozinha, assassinada pelas balas da ditadura salazarista na sua fiel luta, ao lado do povo da Lombada da Ponta do Sol, pelo direito às águas de rega.

«Em 21 de agosto de 1962, depois de 3 meses de resistência e de luta pelo direito à água de rega, os populares que guardavam a circulação de água na Levada do Moinho foram atacados por forte carga policial, no Cabo da Levada. Resultado: a morte a tiro de uma jovem estudante de 17 anos – a Sãozinha – vários feridos e dezenas de homens e mulheres levados para as cadeias da PIDE, a polícia política salazarista.

Os camponeses apenas pretendiam garantir o direito às águas de rega, direito esse inscrito nos títulos de propriedade dos terrenos que cultivavam, adquiridos ao Estado Português e pagos com sacrifícios extremos ao longo de mais de duas décadas. O mesmo Estado quis negar um direito que havia reconhecido e o povo revoltou-se.

A 6 de maio de 1962, perante a insistência das autoridades em interromper o fluxo de água na sua Levada do Moinho, a população, reunida neste Largo, decidiu manter guarda no Cabo da Levada. Aí se manteve até 21 de agosto, data que ficou conhecida como Revolta das Águas da Lombada, uma das revoltas populares contra a ditadura salazarista.

O povo continuou a usar a sua água na sua levada. Pouco depois da Revolução do 25 de Abril de 1974 a água foi formalmente entregue ao povo.»

Este é o texto gravado na placa junto à escultura alegórica existente no largo junto ao solar dos Esmeraldos e inaugurada por ocasião dos 50 anos da Revolta das Águas. As comemorações foram organizadas pela Comissão de Regantes da Levada do Moinho juntamente com a autarquia que atribuiu ao referido largo a designação toponímica de “Largo da Luta das Águas da Lombada – 21 de Agosto de 1962”, inscrita na referida placa encimando o brasão da Ponta do Sol. Contudo, esta inscrição foi removida e, no presente, apenas consta “PATRIMÓNIO – Câmara Municipal da Ponta do Sol”.

Do contacto com pessoas da Lombada, sei quanto significou e significa esta luta e a eterna memória da Sãozinha cuja coragem e força feminina assumem a dignidade de uma Catarina Eufémia.

A vitória alcançada nesta luta deve também ser presente perante os novos desafios dos bananicultores pontassolenses com os seus legítimos direitos cerceados pelo monopólio da Gesba. Seja, por exemplo, a apropriação de 3,5 milhões de euros da venda da banana para um Centro de Banana da Madeira inaugurado pelo PGR como se a obra fosse do Governo, o que aliás deveria ter sido.

Óscar Teixeira