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AL (Alojamento Local)

Desde que um recente acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) veio decidir que não deve existir alojamento local (AL) em edifícios coletivos destinados à habitação, assistiu-se de imediato a reações vindas de vários quadrantes, nomeadamente associações representativas do setor, advogados, etc, e ao “debate” sobre o tema em programas de televisão, onde a narrativa utilizada, entre imprecisões nalguns casos, pode incentivar a prática da ilegalidade. Comecemos pelo acórdão do STJ de 22.03., p.p. que uniformiza jurisprudência ao estabelecer que não é permitida a exploração de uma fração autónoma na modalidade de alojamento local, se a mesma, no título constitutivo de propriedade horizontal, for destinada a habitação. No sumário do referido acórdão, está expressamente exposto que: "No regime da propriedade horizontal, a indicação no título constitutivo, de que certa fração se destina a habitação, deve ser interpretada no sentido de nela não ser permitida a realização de alojamento local.” É assim inferido que o fim para “habitação”, quando identificado no título constitutivo de propriedade horizontal e correspondente registo predial, refere-se ao “centro da vida doméstica”, ainda que a licença de utilização emitida pela câmara, se reporte a uma menção genérica de “habitação”. É já no Código Civil, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 1422 que está vertido esse conceito, onde pode ler-se, “É especialmente vedado os condóminos: c) Dar-lhe uso diverso do fim a que é destinada”, sendo considerado que o “fim” aqui previsto corresponde ao constante do título constitutivo que, sendo “habitação”, deverá ser interpretado como “centro da vida doméstica”, não sendo assim admissível a permissão do alojamento local. Refira-se ainda, que sendo a fração autónoma destinada à habitação no respetivo título constitutivo de propriedade horizontal, mesmo em face do cumprimento por parte do proprietário da obrigação de registo do estabelecimento de alojamento local, através de comunicação prévia dirigida à autarquia territorialmente competente, e tenha por essa via obtido o título de abertura ao público, essa atividade de exploração como alojamento local é ilícita à luz do recente acórdão do STJ, por violação, como atrás referido, do destino estabelecido no título constitutivo da propriedade horizontal. Curiosamente o que temos assistido nas opiniões e conselhos expressos em programas televisivos dedicados ao assunto é, nomeadamente, que os proprietários que detenham a atividade de AL em edifícios de habitação coletiva, podem continuar a exercer a atividade até algum condómino arguir a sua ilicitude, exigindo a cessação da atividade. Confesso que fico completamente pasmado com estas opiniões e conselhos, desde logo porque na prática é estar a dizer a estes proprietários que a ilegalidade compensa. Pelo menos até que alguém se queixe judicialmente. Inacreditável. Depois, colocar o ónus no condómino, de ter de encetar ação judicial para que a atividade de AL seja cessada no edifício onde habita, também é curioso. É óbvio que qualquer condómino pode, se quiser, encetar ação judicial. Mas vai fazê-lo porquê? É que antes do condómino, quem tem essa obrigação é a administração do condomínio, pois em face de qualquer ilegalidade no edifício que administra, tem o dever de agir para repor a legalidade. E é evidente que um AL numa fração de um edifício de habitação coletiva tem implicações diretas tanto nos consumos como no uso das áreas comuns, sendo essas, da exclusiva responsabilidade da administração de condomínio. Só no limite, o condómino, e por inação da administração de condomínio, deverá agir por conta própria, mas aí já corresponsabilizará a administração do condomínio pelo não cumprimento das suas obrigações legais. Depois há a outra face da moeda, isto é, a de muitos proprietários contribuintes singulares que vendo a possibilidade de rentabilizarem as suas economias que estavam moribundas numa instituição bancária, investiram num apartamento em edifício de habitação coletiva, com vista a obterem um rendimento através da atividade de AL. Ora esses proprietários, em face da trapalhada criada pelo legislador que criou condições para que este assunto fosse longe de mais, e só agora, por via do acórdão do STJ, se coloca um ponto de ordem no assunto, deverão ter algum tipo de compensação, que poderá passar por uma atenção especial a parte ou ao total do IMI anual da fração que foi afeta ao AL num período de tempo a estabelecer, ou qualquer outra que possa amenizar o fato de terem sido “incentivados” a optar por uma via “empresarial” que não era de todo sustentável no âmbito da vivência comunitária.