A Guerra Mundo

Bruxelas não terá sido suficientemente dura com Moscovo no passado

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A ex-chefe da diplomacia europeia Catherine Ashton admitiu hoje que, durante o seu mandato (2009-14), talvez a Comissão Europeia (CE) não tenha sido suficientemente dura com o regime do Presidente russo, Vladimir Putin.

"As sanções que eu na altura propus (contra o Governo russo) foram bem mais do que aquelas que levámos a cabo", reconheceu Ashton, durante um debate por vídeo sobre a invasão russa da Ucrânia, organizado pela Fundação Calouste Gulbenkian.

Numa conversa com Durão Barroso, que foi presidente da Comissão Europeia na altura em que a política britânica era Alta Representante da União Europeia (UE) para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, Ashton lamentou que tenha havido alguma complacência de Bruxelas em relação às posições de Moscovo, sobretudo depois da anexação da Crimeia, em 2014.

"Na altura, o argumento invocado para moderar as sanções era que se adotássemos medidas mais extremas, poderíamos conduzir a situação a uma escalada", explicou Catherine Ashton, dizendo que a CE liderada por Durão Barroso preferiu uma posição mais equilibrada.

Na conversa, Durão Barroso alegou que havia vários países - incluindo a Hungria do primeiro-ministro Viktor Órban -- que se tinham oposto a uma posição mais dura do Ocidente perante Moscovo.

"Viktor Órban alegava que, se aumentássemos as sanções, haveria contra-sanções que afetariam os interesses da UE", lembrou o ex-presidente da Comissão Europeia, referindo que a comunidade é um organismo complexo, que tem de responder a várias sensibilidades nacionais.

Ainda assim, Ashton considerou que talvez Bruxelas tenha insistido em demasia em não cortar relações com Moscovo, por razões de política pragmática, advogando um equilíbrio entre os incentivos ("a cenoura") e as sanções ("o pau").

"Refleti muito sobre o assunto, nos últimos anos, e concluí que houve muita cenoura e pouco pau", concluiu a ex-chefe da diplomacia europeia.

Ashton mostrou-se ainda "um pouco surpreendida" com a posição dura do ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Serguei Lavrov, recordando que, no tempo em que discutiam a anexação da Crimeia, o chefe da diplomacia da Rússia mostrava um lado mais dialogante do que aquele que agora mostra, perante a invasão da Ucrânia.

A política elogiou a forma como os 27 países da UE se têm mostrado unidos e solidários na resposta a Moscovo, mostrando-se convencida de que essa unidade terá surpreendido Vladimir Putin, que terá apostado na existência de dissensões dentro do bloco, especialmente no que diz respeito às sanções a aplicar a Moscovo.

A ex-chefe da diplomacia europeia também sublinhou o espírito de concertação que existe atualmente entre a UE, o Reino Unido e os Estados Unidos, vincando que este tripé diplomático tem agido de forma assertiva perante as dificuldades colocadas pela invasão russa da Ucrânia.

A Rússia lançou em 24 de fevereiro uma ofensiva militar na Ucrânia que matou pelo menos 925 civis e feriu 1.496, incluindo mais de 174 crianças, tendo provocado a fuga de mais de 10 milhões de pessoas, entre as quais mais de 3,48 milhões para os países vizinhos, indicam os mais recentes dados da ONU.

Segundo as Nações Unidas, cerca de 13 milhões de pessoas necessitam de assistência humanitária na Ucrânia.

A invasão russa foi condenada pela generalidade da comunidade internacional, que respondeu com o envio de armamento para a Ucrânia e o reforço de sanções económicas e políticas a Moscovo.