A rosa de Hiroshima e os girassóis da Ucrânia

”Pensem nas crianças mudas telepáticas. Pensem nas meninas cegas inexatas. Pensem nas mulheres rotas alteradas. Pensem nas feridas como rosas cálidas. Mas oh não se esqueçam da rosa da rosa. Da rosa de Hiroshima. A rosa hereditária. A rosa radioativa estúpida e inválida. A rosa com cirrose. A antirosa atómica. Sem cor sem perfume. Sem rosa sem nada.”

A rosa de Hiroshima é um poema, de 1946, eternizado pelo cantor e compositor Vinicius de Moraes desvelando substancial denúncia contra os horrores da Segunda Guerra Mundial. Em seus versos, lembrara as milhares e milhares de pessoas mortas ou mutiladas com as bombas de urânio e de plutónio, criadas por Robert Oppenheimer, lançadas, pelos Estados Unidos, sobre Hiroshima e Nagasaki, no Japão. Esse poema traduz o quanto é possível tornar a vida impossível de ser vivida, com a radioatividade a impedir mesmo o germinar da terra.

Não seria estranho o fato de que o pai das bombas passara o resto de seus dias a se remoer nas palavras de Bhagavad Gita, contidas em um sagrado texto hindú: “Agora me tornei a morte, a destruidora dos mundos”.

Hoje, o prenúncio de outra rosa de Hiroshima, soprada pelos ventos de ira e de cobiça, trepida sobre os girassóis da Ucrânia. Porventura, nunca chegue o tempo em que os ritmos circadianos desses girassóis se estacionem no oriente, interminavelmente, no acorcovar às miríades de rokets e mísseis de cruzeiros nos céus a bramar na calada da noite. Putin nas asas da águia dourada de duas cabeças na ânsia de exterminar.

O girassol, a flor nacional da Ucrânia, clama por seu solo para a vida enflorar. Onde plantar-se-ão as mil milhões de sementes do povo de Zelensky? Algumas das datas comemorativas do mês de novembro, 9,10, 11, respetivamente, nos convidam a uma reflexão: o Dia Internacional contra o fascismo e anti-semitismo, o Dia Mundial da Ciência pela Paz e pelo Desenvolvimento e o Dia do Armistício. Quais as lições apreendidas?

Impeçam a nova rosa de Hiroshima para que os girassóis da Ucrânia não restem tão somente lembrados num quadro de natureza morta, de Van Gogh.

Cristiane Lisita