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A discussão da escolha

O Livre-arbítrio é algo abstrato para grande parte da sociedade. Muitos sentem que o têm, outros tantos nem acreditam que exista realmente. Falo por mim, acredito tê-lo até um certo nível com maior ou menor grau de ilusão. Mas até que ponto é que não estamos mesmo todos iludidos no meio disto?

Quando escolhemos um caminho em detrimento de outro, sabemos o que nos influenciou verdadeiramente a fazê-lo?

Esta não é uma questão nova, a discussão da “escolha” é já tema desde a Grécia Antiga. Mesmo que não nos ocorra na rotina, é uma discussão de longos séculos. Desde filósofos a pensadores, foram vários aqueles que exprimiram as suas convicções em relação às decisões que todos nos habituámos a tomar nas nossas vidas e, em quê que estas mesmas sempre se basearam ou fundamentaram.

O conceito mais fixo e banal de Livre-arbítrio - pelo menos no lado ocidental do mundo – nasce no seio do costume cristão. Aquilo a que a igreja sempre chamou de “liberdade moral”, a ideia de podermos escolher “livremente” entre o Bem e o Mal. Uma espécie de coação, no sentido de escolher a opção bondosa na ameaça da outra nos ser danosa. Porém, apesar de compreender e existirem pontos

comuns, a minha conceção aproxima-se sim, mais de uma escolha que, em vez de simpaticamente impingida, é feita em liberdade e que se apoia muito mais no interesse e na vontade do que na necessidade.

É claro que em cada decisão que temos pela frente, os lados têm pesos diferentes, têm consequências e/ou gratificações que condicionam a tomada em si. A escolha está muito para além do ser bom ou mau a maioria do tempo, daí a ilusão…

A ilusão que, depois de ponderarmos trinta mil fatores na nossa cabeça, a decisão é feita sem condições.

Não é em tudo como é óbvio, mas imaginem que as nossas decisões são na realidade, tal e qual como o Pac-man, o célebre jogo arcade dos anos 80. Como um pequeno boneco amarelo preso numa espécie labirinto infinito e que tem como única hipótese comer o máximo de bolas, ao mesmo tempo que tenta fugir de pequenos fantasmas que o perseguem. A este pequeno boneco - o Pac-man - não lhe resta mais do que consumir e fugir, como opção. Ele tem a sensação que é livre e que decide vaguear a seu belo prazer, mas na realidade, o máximo que decide é se escolhe ir em frente ou para os lados.

E se tentar “escapar” desta novela? Nem isso ele percebe que não consegue. Ele tenta atravessar de um lado e, volta a aparecer do lado contrário, a fuga é infinita.

As suas decisões parecem soberanas e ponderadas: entre comer os pequenos pontos, escolher para que lado virar e esquivar-se com sucesso dos pequenos fantasmas, ele presume-se livre.

Aliás, cada vez que errar ou for apanhado num virar de esquina mal calculado, o Pac-man ressuscita e volta a tentar as vezes que forem precisas. Portanto, aparentemente solto e imortal.

É uma analogia que podemos fazer com o nosso mundo e medirmos o quão livres são realmente as

nossas tomadas de decisão. Medirmos até que ponto é que estas se baseiam na moralidade do bom ou do mau. Até que ponto é que todas elas não passam de decisões de impulso, de disposição, de interesse ou ego. Até que ponto não estamos todos vendados e iludidos todos os dias. Até que ponto não somos todos encaminhados e ensinados pelo sistema social a ter a escolha “certa”. Como que andássemos a

“vaguear” num labirinto sem escapatória onde as decisões têm peso, onde nem sempre as decidimos livremente e não há volta a dar a muitas delas.

Não temos botão restart, não ressuscitamos e não atravessamos lados de parede infinitamente. Temos chances, atalhos, muitos becos sem saída e se calhar no limite, o poder de decidir.

Temos a balança que pesa a vontade e o concretizar da decisão, o livre-arbítrio.

Será ilusão?