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Se há matéria em que a justiça tem de ser célere é nos casos de violência e negligência contra crianças

1. Infelizmente, e mais uma vez, fica provado que as vítimas de violência doméstica continuam a ser perseguidas e reféns de um sistema de valores completamente desadequado e persecutório. As minhas primeiras palavras são de coragem para a vereadora do Porto Santo, mulher que assumiu a sua condição publicamente. Tarefa ainda difícil nos tempos que correm. Parabéns ao Presidente da Câmara que, ao abrigo da legislação em vigor e como devia ser, em conjunto com esta encontrou as condições para que continuasse a cumprir a sua missão de vereação mesmo em teletrabalho, pois a mesma encontra-se refém na sua própria casa. Vergonhosa foi a posição da oposição do partido socialista que, de forma oportunista e deplorável, tentou fazer politiquice barata pondo em causa o desempenho das suas funções. Senti vergonha alheia. Como é possível fazer política, perseguindo uma vítima, em vez de condenar um sistema que mantém reféns essas mesmas vítimas de violência doméstica. Ao invés de exigir medidas rápidas contra o agressor, que permitissem que a vereadora se mantenha segura no seu local de trabalho e se liberte do confinamento na sua própria casa, o partido socialista do Porto Santo optou por recriminar a vítima por desempenhar as suas funções numa prisão forçada, mas nesta fase necessária, na sua residência.

2. A Associação Portuguesa de Apoio à Vítima, em colaboração com a fundação Calouste Gulbenkian, elaborou um importante relatório que procurou identificar “lacunas das políticas públicas e da legislação em relação ao envelhecimento da população”. “Portugal mais velho”, nome deste documento, aponta importantes medidas que deveriam ser implementadas, nomeadamente a que preconiza a negação das heranças aos herdeiros que maltratem ou negligenciem os seus idosos, assim como adequação do código do trabalho permitindo assistência a familiares idosos como já acontece para crianças. Se muitas famílias têm parcos recursos para cuidar dos seus idosos, não é menos verdade que muitos deixam muitos ao abandono ou a viver em condições que deixam muito a desejar. Isto, apesar de todos os meses se dedicarem à romaria de colectar as reformas que, em muitos casos, não são assim tão baixas e que permitiriam a qualquer um viver em condições condignas. Infelizmente acho que todos conhecemos casos destes e que embora denunciados acabam por ter poucos efeitos práticos.

3. Se há matéria em que a justiça tem de ser célere é nos casos de violência e negligência contra crianças, pois o tempo das crianças não é igual ao nosso e os danos são quase sempre irreversíveis se não prevenimos atempadamente. Próximo de onde vivo, infelizmente, temos um caso de uma família onde as vivências são marcadas pela violência dos adultos contra crianças. Uma das crianças, de apenas 6 anos, já demonstra sinais claros de graves problemas a nível emocional, psicológico e social. A justiça segue os seus trâmites, mas a verdade é que o tempo urge para que ainda haja uma esperança para o desenvolvimento daquela criança. A sociedade local mostra-se apreensiva e indignada porque o tempo vai passando e os olhinhos sofridos daquele menino tocam no coração de todos nós. Que podemos fazer? Denúncias foram muitas… Mas o tempo vai passando…

P.S- Numa sociedade dita por civilizada, temos deixar de olhar para o lado perante os vários tipos de violência contra os mais vulneráveis e nada fazer porque são “problemas dos outros”. Todos temos a responsabilidade de fazer algo contra a violência doméstica e violência/negligência contra crianças e idosos. Não basta continuar a dizer que não está certo nas mesas de café. As instituições governamentais, até mesmo as mais locais, as de justiça e segurança têm de, em conjunto, ditar um plano concreto com ações eficazes para acabar com este flagelo.

P.S1. Ultimamente a cidade do Funchal tem registado um número anormal de situações de violência com pessoas sem-abrigo. As opiniões dividem-se entre os que defendem um apoio extra para estas pessoas, às que defendem que muitas delas não querem ser ajudadas e que ações mais enérgicas como o internamento compulsivo devia ocorrer. O conhecimento de causa que tenho é que ambas as situações de rua existem. Pessoas que por um infortuno da vida ficaram privadas da sua habitação e que se tiverem apoio poderão ter uma nova oportunidade e aquelas que mesmo perante todas as ajudas existentes, com doença mental e os vícios associados de álcool e drogas recusam cumprir regras e querem continuar numa vida de rua. Sem dúvida que temos duas realidades distintas de pessoas sem-abrigo e é totalmente incorrecto colocá-las todas em plano de igualdade. Por isso, medidas urgentes com planos diferenciados de ação são necessários. Mais uma vez, sem as sinergias conjugadas do poder local, do poder regional de saúde e social e forças judiciais e policiais, será impossível a resolução de um problema que cresce a olhos vistos.

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