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Ryanair - o fascínio pelo abismo

Há um fascínio entre políticos regionais pela Ryanair, como se esta fosse a solução para nossos os problemas de mobilidade aérea, nota-se uma disputa entre PS, PSD e CDS para ver quem é o maior fã.

Algumas notas sobre o seu modo de operar: prefere aeroportos menos usados e cobra às autoridades locais ou regionais ajudas para dinamizar o tráfego e o turismo nas cidades ou regiões onde se situam. Depois de se instalar faz chantagem com a possibilidade de saída para manter ou reforçar os subsídios.

Impõe aos trabalhadores contratos de trabalho pela Lei irlandesa e não pela do país onde trabalham (ou nem têm contrato), recebem o ordenado por um banco irlandês, os descontos da segurança social e do IRS vão para a Irlanda, ficam sem proteção da Lei do trabalho, da Segurança Social, no desemprego e dos serviços de saúde do país onde vivem e exercem a atividade.

Em 2016 a Ryanair pediu ajudas de 6 a 10 milhões para entrar na Madeira, propunha-se duplicar o volume de passageiros em Santa Cruz num prazo de três anos. Com as suas práticas concorrenciais agressivas ganharia posição dominante e um poder negocial imenso para sacar ajudas públicas cada vez maiores, sob a ameaça de abandonar a Região. Iria usar tal poder para esmagar os preços e margens comerciais não só nas ligações aéreas mas também nos alojamentos, no aluguer de viaturas e nas atividades conexas – serviços que também vende pela internet.

Os desafios da duplicação do tráfego são muitos e preocupantes: iria testar os limites do aeroporto e teria impactos variados no turismo que ninguém avaliou: pressão sobre o imobiliário com subida do preço da habitações; ocupação crescente da orla costeira, pressão sobre os percursos na Natureza; pressão para baixar os custos – leia-se salários – na oferta turística; massificação e risco de descaraterização da marca centenária de qualidade que carateriza o destino Madeira; perda de reputação.

Um caminho arriscado e sem retorno de dependência face a uma companhia estrangeira que já deu provas que não olha a meios... Essa proposta foi recusada e muito bem pelo então secretário Eduardo Jesus.

Apoios públicos não são merecidos por quem não paga impostos na região, não contribui para o financiamento da segurança social e da saúde públicas, eleva a precariedade laboral a novos expoentes, nem cumpre a Lei do País. A Ryanair não pode ser tratada com privilégio face às demais companhias. O impacto económico, social e ambiental tem de ser rigorosa e publicamente avaliado antes de decisões potencialmente irreversíveis serem tomadas.