País

Falta de magistrados no Ministério Público poderá afectar combate ao crime

Declarações do Sindicato dos Magistrados após reunião de dois dias, em Viseu, com cerca de 70 delegados sindicais de todo o país, inclusive das ilhas

Foto Manuel de Almeida/Lusa
Foto Manuel de Almeida/Lusa

O presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público queixou-se ontem da falta de magistrados especializados, considerando que poderá afetar o combate ao crime económico-financeiro e de violência doméstica e provocar um “maior insucesso nas investigações”.

“Se nós espalharmos essas investigações [violência doméstica e económico-financeira] por uma generalidade de pessoas que não estão especializadas, não conseguiremos obter resultados tão bons em áreas tão específicas e tão complexas como essas, ou seja, o que iremos ter é, provavelmente, maior insucesso nas investigações, quer na fase de julgamento, quer também na fase de investigação inicial”, alertou António Ventinhas.

Em declarações aos jornalistas no final de uma reunião de dois dias, em Viseu, com cerca de 70 delegados sindicais de todo o país, inclusive das ilhas, o presidente disse que “foram detetados mais de 200 lugares em falta para exercer funções de magistrados” no Ministério Público (MP) e, por isso, “em muitos sítios, está equacionado acabarem-se áreas de especialização na investigação criminal”.

“Não existe o risco imediato de paralisação, o primeiro risco que existe é de acabarem estruturas, muitas estruturas especializadas, e isso irá traduzir-se num pior funcionamento de áreas chave como a violência doméstica e a criminalidade económico-financeira”, especificou.

O magistrado não conseguiu especificar quais as regiões do país onde mais faltam magistrados, alertando que “é uma realidade que se espalha por todo o país” e, também por isso, “o combate a esses crimes poderá revestir-se de uma menor competência por parte dos magistrados do MP que tratarão este tipo de investigações”.

“Sítios onde a criminalidade económico-financeira já está especializada existe o risco, devido à falta de magistrados, de continuar a verificar-se essa especialização, ou seja, crimes de elevada relevância, em que magistrados ganharam determinado conhecimento nessas áreas, existe o risco de começarem a despachar indiscriminadamente os processos perdendo todas as vantagens da especialização”, alertou.

António Ventinhas esclareceu que “os grandes resultados que se obtiveram” no combate à criminalidade económico-financeira “resultaram precisamente dessa especialização” que os magistrados do MP fizeram nesta área e, agora, na investigação dos crimes mais complexos haverá “um retrocesso no combate à criminalidade económico-financeira, resultante da perda dessa especialização”.

Outro assunto em cima da mesa de trabalho é o estatuto dos magistrados do MP que, segundo o presidente sindical, “já deveria estar resolvido no tempo do Governo do PSD”, sob a tutela da ministra Paula Teixeira da Cruz, e agora “corre o risco de acabar esta legislatura” e de não acontecer esta discussão que “têm vários pontos cruciais”.

“A questão da mobilidade dos magistrados, a própria definição de como é que irá ser a estrutura do MP, irá sofrer grandes alterações, a própria estrutura hierárquica da organização do MP, a estruturação das carreiras, que irá sofrer grandes alterações e paradigmas diferentes e há uma série de referendos que serão alvo de discussão na AR”, enumerou.

Neste sentido, António Ventinhas disse que “urge resolver” a questão do estatuto, “sob pena de todo o trabalho desenvolvido no último ano e meio a dois anos se perder”, que foi o tempo que “demorou a preparar a proposta de lei que chegou agora à AR”.

O presidente sindical que entende que “é absolutamente prioritário iniciar-se o debate urgente do estatuto do MP na AR” e vai marcar uma audiência com a nova Procuradora Geral da República, assim que Lucília Gago tomar posse.