Mundo

Resolver a crise venezuelana pela força seria uma “catástrofe”

None

O ex-primeiro-ministro espanhol José Luis Rodríguez Zapatero, que no passado mediou negociações entre o governo e a oposição venezuelanos, alertou hoje que uma resolução pela força da atual crise política na Venezuela seria “uma catástrofe enorme e dramática”.

Em declarações aos jornalistas, após ter participado num congresso, Zapatero insistiu que o diálogo é a única via para alcançar uma “saída razoável” da crise venezuelana, apelando à União Europeia (UE) para que lidere “um processo de diálogo e um acordo” em que participem “todos os líderes políticos” venezuelanos.

O político espanhol manifestou-se confiante de que o caminho do diálogo “irá prevalecer” em algum momento.

Zapatero também aproveitou a ocasião para denunciar aqueles que procuram promover uma “implosão” ou uma “situação extrema” na Venezuela, onde, assegurou, “uma grande maioria quer encurralar o ódio”.

Na segunda-feira, a chefe da diplomacia europeia, a italiana Federica Mogherini, voltou a salientar a vontade da UE de ajudar a criar condições para umas eleições presidenciais democráticas e para um desfecho pacífico da crise venezuelana.

“Excluímos categoricamente qualquer apoio europeu a uma escalada militar em redor ou dentro do país. E também sublinhámos a necessidade de trabalhar com os nossos parceiros na região para evitar que a ajuda humanitária seja usada para fins que não estão de acordo com a lei internacional”, vincou na mesma ocasião.

Já na intervenção no congresso World Law Congress, José Luis Rodríguez Zapatero lembrou que, nos últimos três anos, viajou 37 vezes para a Venezuela e que passou mais de 100 dias naquele país, no âmbito da mediação de conversações entre o governo liderado por Nicolás Maduro e a oposição venezuelana.

O político admitiu mesmo que foi a tarefa de “maior interesse” a que se dedicou desde que deixou a liderança do governo de Espanha (2004/2011).

“Quando se parte de uma análise errada (...) pode-se chegar a conclusões erradas”, referiu Zapatero, afirmando que, na sua opinião, o conflito “sociopolítico” venezuelano tem como derradeira razão “a imensa riqueza que abarca” esta nação.

O ex-primeiro-ministro espanhol socialista disse estar convencido de que “podem existir acordos” entre “a maioria dos venezuelanos”, apesar de existirem duas “visões irreconciliáveis” sobre a realidade do país, personificadas por Nicolás Maduro e por Juan Guaidó (presidente do parlamento e autoproclamado Presidente interino), visões essas que têm “apoio social”.

Ainda sobre a Venezuela, mas falando de outros atores internacionais, Zapatero lamentou “profundamente” o facto de não terem sido verificados progressos na mediação internacional durante a administração norte-americana de Barack Obama.

E considerou que a chegada do Presidente Donald Trump à Casa Branca foi determinante para colocar a Venezuela “no precipício”, denunciando que alguns dos altos responsáveis norte-americanos que estão a liderar a “operação Venezuela” são os mesmo que projetaram a “operação Iraque”.

O político salientou que o que está a acontecer no território venezuelano é uma manifestação da “batalha geopolítica” que disputam os Estados Unidos e a China “centímetro por centímetro” em toda a América Latina.

A crise política na Venezuela agravou-se em 23 de janeiro, quando o líder da Assembleia Nacional (parlamento), Juan Guaidó, se autoproclamou Presidente da República interino e declarou que assumia os poderes executivos de Nicolás Maduro.

Guaidó, 35 anos, contou de imediato com o apoio dos Estados Unidos e prometeu formar um governo de transição e organizar eleições livres.

Nicolás Maduro, 56 anos, no poder desde 2013, recusou o desafio de Guaidó e denunciou a iniciativa do presidente do parlamento como uma tentativa de golpe de Estado liderada pelos Estados Unidos.

A maioria dos países da União Europeia, entre os quais Portugal, reconheceram Guaidó como Presidente interino encarregado de organizar eleições livres e transparentes.

A repressão dos protestos antigovernamentais desde 23 de janeiro provocou mais de 40 mortos e cerca de mil detenções, incluindo menores, de acordo com várias organizações não-governamentais e o parlamento venezuelano.

Esta crise política soma-se a uma grave crise económica e social que levou mais de 2,3 milhões de pessoas a fugirem do país desde 2015, segundo dados das Nações Unidas.