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Amanhã há eleições

A maior parte das vezes vejo, ouço e leio as cabeças pensantes da nossa praça discutirem o estado da Nação e a crise em que vivemos mais ou menos atolados, evocando e invocando razões e utilizando argumentos que nada mais são do que conjunturais.

Tratar o assunto pela espuma dos dias não leva a uma reflexão séria sobre as causas profundas das nossas desditas e, por tal, não permite encontrar soluções cabais e eficazes para alterar a situação de um modo sustentado.

Fundamentalmente, o que distingue os países bem-sucedidos dos países como o nosso, no meu entender, é o facto de, algures na sua história, ter havido uma situação fracturante que levou a que, daí em diante, a organização social, política e, consequentemente, a situação económica adquirissem uma dinâmica que determinou o seu sucesso futuro.

Lembremos um desses acontecimentos, para exemplificar: Inglaterra 1688, “Revolução Gloriosa”. Perante o descalabro em que se tinha transformado o reinado de James II (dinastia Stuart) que, além do mais, privilegiava a questão religiosa (luta entre católicos e protestantes) em detrimento da governação, os líderes do partido Tory (até então leais ao rei) uniram-se com membros da oposição Whig e resolveram atacar a crise.

Deposto James II, após algumas peripécias mais ou menos caricatas, o Parlamento do Reino Unido fez aprovar a Bill of Rights (Declaração de Direitos), que acabou com as tentativas de instauração do absolutismo monárquico (sem acabar com a monarquia) e circunscreveu os poderes do rei.

Embora tenha criado, na época, algum efeito negativo na população, acabou com o regime absolutista, submetendo o poder real ao Parlamento, e abriu caminho à evolução social e económica que culminaria na Revolução Industrial do século XVIII.

Podia citar mais exemplos de outros acontecimentos históricos fracturantes em outros países desenvolvidos (a Revolução Francesa, a Independência dos EUA, etc.) mas, por uma questão de economia de espaço e de tempo, julgo que o exemplo dado é suficiente para ilustrar o que afirmo.

Em Portugal, no entanto, nenhuma das crises político-sociais que existiram ao longo da sua história, desde o início da portugalidade até à Revolução dos Cravos em 1974, produziu alguma situação fracturante que alterasse, profunda e definitivamente, o paradigma governativo, no que às relações entre o poder e a economia dizem respeito.

Apesar de algumas tentativas avulsas de provocar o desenvolvimento (incentivos industriais nos anos 50 do século XX, fomento de obras públicas, abertura ao investimento do exterior – EFTA, 1959 – criação de Planos de Fomento, etc., etc.), o país continuou a afastar-se do grupo de nações mais avançadas da Europa.

Após a chamada “Revolução dos Cravos” (25 de Abril de 1974), com um período inicial de libertação e de uma grande participação popular, mais ou menos anárquica, que parecia anunciar uma profunda mudança de paradigma, muito rapidamente a situação reverteu.

Voltaram ao poder político e social as elites restritas, cujo poder se tornou ainda maior com a associação aos grandes grupos económicos mundiais, como consequência da globalização da economia.

Após o aparente progresso e bem-estar provocados, artificialmente, pela injecção massiva de capitais, consequência da adesão à Comunidade Europeia, o país foi obrigado a encarar, do modo mais doloroso, a realidade: Portugal, devido a razões históricas, culturais e estruturais, continuava a não saber governar-se.

À classe política actual faltam, na generalidade, conhecimentos, saber, sentido de missão, sentido de Estado, estratégia e vontade para poder cumprir a sua função: zelar pela governação provendo as populações de cuidados básicos – saúde, educação, ordem pública, sistema jurídico e tribunais que funcionem.

A população cada vez mais acha que o governo não a representa nem defende.

Os Parlamentos estão desclassificados e controlados pelos interesses partidários e de grupos.

As famílias lutam para enfrentar o presente e não têm esperança num futuro melhor a curto/médio prazo.

Os cidadãos sentem-se cada dia mais afastados do poder e têm consciência de não serem representados condignamente pelos políticos e de não terem qualquer capacidade de fiscalização e responsabilização dos governantes.

O sistema democrático, que se julgava poder garantir a eleição dos melhores e substituí-los sempre que demonstrassem não estar à altura, foi colonizado e instrumentalizado por uma minoria que se reveza no poder.

Como consequência de tudo isto, a Nação esmorece, o povo, desanimado, abdica do seu poder soberano. O ciclo vicioso mantém-se.

Amanhã, não fiquem na cama (ou no café), vão votar. Não votem branco nem nulo que de nada serve. Votem no partido que acharem que pode ajudar a impedir que a situação se mantenha sempre na mesma. Porque é a única ferramenta que temos num regime democrático.