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Foto Miguel Espada/Aspress
Regionais 2025 Madeira

O defensor dos mais fracos

“Como cristãos, sentimos a necessidade de assumir um compromisso perante as injustiças e os mais desfavorecidos. Deste contexto nasce uma interpelação própria e fazemos uma opção, como diz a Bíblia. Parte-se do pressuposto que ser cristão é ser solidário”. Este excerto da primeira entrevista de Edgar Silva ao DIÁRIO, quando estava prestes a ser ordenado padre, em Abril de 1989, justifica o percurso de vida e político do cabeça-de-lista da CDU às eleições regionais de 23 de Março. Tem sido uma caminhada de luta pelos direitos dos mais fracos, sejam eles as crianças de Câmara de Lobos que pediam dinheiro na rua, sejam os trabalhadores mal pagos e os que ficam desempregados, sejam as populações dos sítios mais recônditos, sem habitações condignas, sem acessos rodoviários, sem transportes públicos, sem saneamento básico.

Mas a vida do candidato comunista não é feita só de política.

Edgar Freitas Gomes da Silva nasceu a 25 de Setembro de 1962 e é natural da freguesia de Santo António. Tem 62 anos, é casado e tem um filho.

Em jovem e quando frequentava o Seminário do Funchal, jogou futebol no Clube Desportivo Nacional, na posição de avançado. Mantém ainda hoje a paixão pelo emblema alvi-negro e é frequente vê-lo nas bancadas do Estádio da Choupana a puxar pelo seu clube.

Aos 18 anos, foi para Lisboa frequentar o Seminário de Almada e de Olivais. Licenciou-se em Teologia pela Universidade Católica. Mais tarde viria a fazer mestrado em Teologia Sistemática e doutoramento em História na mesma instituição de ensino superior.

Entre 1987 e 1992 leccionou Teologia na extensão da Universidade Católica na Madeira. Foi um dos coordenadores do Seminário do Funchal.

Viria a ser ordenado padre pelo bispo do Funchal Teodoro Faria, numa cerimónia realizada na Sé, a 1 de Abril de 1989. A sua missa nova teve lugar na Igreja de Santo António. Foi pároco dos Álamos. Em paralelo às funções atribuídas pela Diocese, esteve sempre ligado a movimentos de apoio aos pobres e às crianças. Activista da defesa dos direitos dos mais desfavorecidos, chegou a dormir à porta da Segurança Social com uma família que tinha sido despejada. Num outro episódio em defesa das crianças acabou por ser detido pela PSP.

Foi fundador do Movimento do Apostolado das Crianças (MAC), que procurou apoiar e enquadrar crianças abandonadas e vítimas de maus tratos, que pediam dinheiro nas ruas do Funchal, os chamados ‘meninos das caixinhas’. Antes disso, tinha já sido o dinamizador do projecto ‘Escola Aberta’ para crianças desfavorecidas nos Ilhéus, de onde foi despejado. Mais tarde transferiu esse projecto para a zona da Cabouqueira, também no Funchal. Esteve igualmente envolvido no Centro de Ref1exão Cristã (ARCO), que promoveu diversos debates.

Edgar Silva seria ainda um dos mentores do protesto dos moradores da Casa do Porrão, em Câmara de Lobos. O movimento despertou a atenção do então Presidente da República, Jorge Sampaio, durante uma visita à Madeira, no final dos anos 1990. O protesto acabou por merecer a simpatia e empenho pessoal de Sampaio, que anos depois veio à inauguração das habitações sociais construídas naquele local.

Em 1992 foi um dos sacerdotes que assinaram o manifesto ‘Mais democracia, Melhor democracia’. Tornado público dois meses antes das eleições regionais, o documento foi mal recebido pela Diocese do Funchal. Na sequência, Edgar Silva foi ‘convidado’ pela Conferência Episcopal Portuguesa para ocupar o cargo de assistente nacional do Movimento Católico de Estudantes em Lisboa, onde esteve entre 1992 e 1995. Nesse período chegou a viver num bairro de lata, em Lisboa. Convocado para cumprir serviço militar, o padre alegou objecção de consciência, para cumprir, em alternativa, serviço cívico. Regressou nessa altura ao Funchal, para retomar o trabalho no MAC.

Desde 1996 que é deputado na Assembleia Legislativa da Madeira, eleito como independente na lista da CDU (coligação que junta PCP e Partido Ecologista ‘Os Verdes’). No ano seguinte, comunicou ao bispo do Funchal a sua desvinculação do sacerdócio.

Foi o início de uma carreira de combate político aos governos regionais do PSD, liderados primeiro por Alberto João Jardim e depois por Miguel Albuquerque. Veio a filiar-se no PCP em 1998 e assumiu depois a coordenação regional do partido, que mantém até hoje. A partir de Dezembro de 2000 passou a integrar o Comité Central do PCP e já trabalhou com três secretários-gerais - Carlos Carvalhas, Jerónimo de Sousa e Paulo Raimundo.

Em 2015 abraçou o maior desafio político da sua vida, quando o PCP o escolheu para candidato a Presidente da República nas eleições que se realizariam em Janeiro de 2016. Projectado para o espaço nacional, Edgar Silva teve de se transfigurar para corresponder à imagem de um candidato presidencial. Mudou de penteado e de óculos e passou a usar fato e gravata, algo que não lhe era habitual. Percorreu o país de uma ponta à outra. Marcelo Rebelo de Sousa acabaria por vencer as eleições à primeira volta e o candidato madeirense obteve um resultado modesto - 183.051 votos ou 3,94 por cento do total.

Com Edgar Silva como cabeça-de-lista, a CDU/PCP elegeu sempre um ou dois deputados à Assembleia Legislativa da Madeira, tendo os mandatos parlamentares sido exercidos de forma rotativa ou em parceria por outros dirigentes comunistas (Mário Tavares, Leonel Nunes, Ricardo Lume). Mas nas eleições do ano passado, o partido falhou a eleição pela primeira vez em 28 anos.

A par da carreira política, Edgar Silva tem feito uma carreira académica de excelência. A 4 de Abril de 2023 concluiu o doutoramento em História com 19 valores na Universidade Católica Portuguesa. O título foi obtido com o tema ‘Vendaval de utopias. Do catolicismo social ao compromisso político em Portugal (1965-1976). Os católicos da Revolução e o PCP’.

Tem os seguintes livros publicados:

- ‘Os instrangeiros na Madeira’ (2005)

- ‘Madeira - Tempo Perdido’ (2007)

- ‘Os bichos da Corte do Ogre usam máscaras de riso’ (2010)

- ‘Pontes de Mudança, sociedade sustentáveis e solidárias’ (2011)

- ‘Vencer o Medo’ (2020)

- ‘Vendaval de Utopias – Os Católicos da Revolução e o PCP’ (2024)