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O Natal da diáspora

Nesta quadra natalícia, é inevitável voltar o olhar para a diáspora madeirense, espalhada pelos quatro cantos do mundo, fruto de sucessivas vagas migratórias que levaram milhares de madeirenses para destinos tão longínquos como a Austrália, a Venezuela, o Brasil, a África do Sul, o Reino Unido ou as Caraíbas.

Em cada um desses lugares, o Natal assume contornos próprios, resultado do encontro entre as tradições que viajaram na bagagem dos emigrantes e os costumes locais que, com o tempo, foram sendo incorporados. As tradições madeirenses não se perdem: transformam-se, adaptam-se e ganham novas expressões, transmitidas de geração em geração.

À mesa, os rituais repetem-se. O cheiro intenso da carne de vinha-d’alhos continua a ser um sinal inequívoco de Natal, seja no Funchal, em Caracas ou em São Paulo. Em países como Trinidad e Tobago, este prato foi plenamente integrado na cultura local, dando origem ao conhecido garlic pork, hoje presença habitual nas celebrações natalícias daquele país. A par da carne de vinha-d’alhos, não faltam o bolo de mel, as broas e, em muitos lares, a poncha partilhada em clima de confraternização.

Independentemente do ponto do globo onde se encontre um madeirense, há quase sempre uma mesa onde se joga à bisca ou ao dominó, prolongando noites de conversa e reencontros. É essa a essência do Natal: a partilha, a mistura de tradições, a criação de novos hábitos que se somam aos de origem e que fazem desta época um tempo vivido intensamente.

Também as tradições religiosas encontram paralelos além-fronteiras. As Missas do Parto, tão enraizadas na vivência natalícia madeirense, encontram eco, por exemplo, na Venezuela, através das Missas de Aguinaldo, permitindo aos emigrantes matar saudades e reviver, ainda que de forma diferente, o espírito do Natal da terra natal.

A diáspora madeirense é, sem dúvida, a melhor embaixadora das tradições natalícias da Região. Mesmo longe de casa, mantém vivas as memórias, os sabores e os gestos que definem esta época. E é reconfortante saber que, onde quer que exista um madeirense, haverá sempre um cheiro familiar, um prato partilhado e um Natal com sabor a Madeira.

Mais do que uma celebração religiosa ou familiar, o Natal da diáspora madeirense é também um exercício de memória coletiva e de identidade. É neste período do ano que muitos emigrantes sentem com maior intensidade a distância da ilha, mas é também quando essa distância se encurta através dos gestos simples: uma receita repetida tal como a avó ensinou, uma expressão em sotaque madeirense que resiste ao tempo, uma música tradicional que ecoa numa sala a milhares de quilómetros do Atlântico.