Portinho rima com privataria
Tomei a iniciativa de escrever sobre a “privataria” quando li o livro A Privataria Tucana, em 2011. “Privataria” é um conceito que significa um processo em que foi dizimado o património público, deixando o povo mais pobre e os ricos mais ricos.
O termo “privataria” foi cunhado pelo jornalista, Elio Gaspari, e popularizado pelo jornalista Amaury Ribeiro Jr., através do livro deste último: A Privataria Tucana, São Paulo, Geração Editorial 2011.
Tudo isto vem a propósito do facto de no Portinho, no Caniço, na dependência da Câmara Municipal de Santa Cruz, nos últimos dias, ter começado a destruição da orla costeira naquela área territorial.
Lá, como em tantos outros lugares da Madeira e do Porto Santo, o litoral está a ser entregue de mão beijada para o negócio de alguns, retirando a orla costeira aos cidadãos, apesar de aqueles territórios terem conexão com o domínio público.
Lá, como noutros lugares da Madeira e do Porto Santo, a orla costeira está dependente de interesses privados demonstrando, desavergonhadamente, o resultado de acumulados processos de subjugação do território a determinados negócios em detrimento do interesse coletivo.
Quer seja no Portinho ou no Porto Santo, seja em São Vicente ou na Praia Formosa, nesta Região insular verifica-se uma ocupação desastrada e ilegítima do litoral, e uma atuação negligente por parte da governação. O resultado é a destruição da frente-mar e a “venda” da orla costeira a pataco a interesses privados. Para além da destruição e da descaracterização da orla costeira, alguns (poucos) têm acesso pleno ao mar e outros (a grande maioria da população) ficam impedidos de usufruir do domínio público marítimo.
São muitos os exemplos de praias roubadas ao povo, são tantos os casos concretos de assalto e apropriação do domínio público marítimo com a anuência dos governantes, fazendo com que sejam usurpadas e mesmo destruídas importantes áreas do litoral.
A “privataria” tem aqui uma das suas expressões mais boçais: o uso privatístico do domínio público marítimo, os bloqueios no acesso ao mar e os constrangimentos à livre fruição do oceano, em particular, por via do uso privativo de praias e de terrenos limítrofes, bem como por construções implantadas ou a instalar nos troços costeiros submetidos a forte pressão turística e urbanística.
Já é tempo de acabar com a “privataria” no litoral destas ilhas. Está na hora de reverter os impactos negativos da turistificação e dos seus danos ecológicos. É preciso definir uma Estratégia de Gestão Integrada da Zona Costeira com medidas de salvaguarda ambiental da frente-mar e da orla costeira.