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Crónicas

O bom, o mau e o emprestado

A 10 de Março, para além de saber quem serão os seus eleitos à Assembleia da República, o PS Madeira saberá quem será o seu candidato ao Governo Regional

No campeonato do número de vezes que um líder partidário visita a Madeira – métrica inaugurada esta semana pelo Partido Socialista – Pedro Nuno Santos sagrou-se campeão das visitas às ilhas. Mas nem sempre foi assim. Quando foi chamado pela Assembleia Legislativa da Madeira, enquanto Ministro, para explicar o papel do Estado na TAP e as ligações aéreas com a Região, Pedro Nuno escondeu-se atrás de um parecer e fez de conta que não era nada com ele. Está visto que para o secretário-geral do PS, a Madeira só vale para fazer turismo.

O bom: Luís Montenegro

O destino escolheu Luís Montenegro. Antes tinha escolhido Duarte Cordeiro, ministro do Ambiente, e, também, Fernando Medina, ministro das Finanças. Os três pintados com tinta verde em nome do ativismo climático. A tinta lançada aos políticos é uma variante da sopa lançada a obras de arte e da pintura da fachada de vários edifícios públicos. Embora não seja novidade, a paixão pelo arremesso de fluídos coloridos tem um significado diferente quando é feita em plena campanha eleitoral. Continua a ser profundamente imbecil e inconsequente, mas passa também a ser um ataque velado à democracia. Não é a tinta que impressiona, mas a facilidade com que alguém se acerca - e atinge - um candidato à Assembleia da República. No caso de Montenegro, candidato a primeiro-ministro. Não há maior ataque à democracia liberal do que a ameaça exercida sobre qualquer candidato. Não há causa que o justifique, nem emergência climática que o permita. Numa democracia liberal, como a nossa, em que todos podem expressar a sua opinião livremente e em que a larga maioria dos agentes políticos partilha das preocupações dos ativistas climáticos, não pode haver espaço para a violência. Por isso, a atitude de Luís Montenegro (e, antes dele, dos dois ministros) perante a infâmia ativista merece reconhecimento. Calmo, firme e impassível. Sem recuar um passo que fosse. A tinta verde não terá sido para Montenegro, o que a Marinha Grande foi para Mário Soares. Mas se alguém duvidava do seu estofo como líder, a tinta tirou todas as dúvidas.

O mau: CTT e o subsídio de mobilidade

Não há expressão maior de que somos um país inteiro, do que a obrigação de continuidade territorial entre o continente e as ilhas. Simultaneamente, não haverá maior prova de que nem sempre o Estado cumpre com essa obrigação, do que o subsídio de mobilidade. A começar pela incapacidade, que se arrasta desde 2019, de colocar em prática a lei que permite aos passageiros pagar apenas o valor da passagem, sem necessidade de reembolsos. Até à mirabolante impossibilidade, aparentemente ainda não totalmente resolvida, de receber o reembolso das viagens aéreas feitas na companhia aérea Ryanair. Mas no rosário de aflições em que se transformou o subsídio de mobilidade, há um calvário final a percorrer: o pedido do subsídio nos CTT. Se não bastasse o complexo, e sempre variável, conjunto de cópias, e-mails, bilhetes, passagens, recibos, documentos de identificação e afins para obter tão desejado reembolso, esta semana ficámos a saber que, em qualquer altura, os critérios de atribuição do subsídio podem ser alterados. Sem alteração à lei, sem publicação de portaria, apenas por obra e graça da Inspeção Geral de Finanças e dos CTT. Foi assim que, de um dia para o outro, centenas de passageiros viram-se impedidos de receber o subsídio a que legalmente tinham direito. É certo que tudo terá ficado resolvido e, à partida, ninguém prejudicado. No entanto fica bem expressa a forma como Estado encara a continuidade entre o continente e as ilhas. Um labirinto burocrático, recheado de rasteiras administrativas e desenhado para dificultar a vida às pessoas.

O emprestado: Carlos Pereira

O epíteto é da autoria do próprio. Carlos Pereira encontrou, no círculo de Lisboa, o espaço que lhe negaram na Madeira. Não se trata de defender a honra do deputado madeirense, mas a sua inclusão numa lista pelo PS nacional revela não só o seu valor político, como também deixa nas entrelinhas uma afronta à decisão da liderança regional. Para além de soar a ajuste de contas, o empréstimo do madeirense ganhou – com a possibilidade de eleições regionais antecipadas – a dimensão de um erro monumental da liderança de Paulo Cafôfo. Ao chamar a si a liderança da lista à Assembleia da República, Cafôfo assume, pessoalmente, o resultado dessas eleições. Essa condição, acompanhada do anúncio de que também será candidato a presidente do Governo Regional, coloca-o perante dois enormes desafios. O primeiro será explicar aos eleitores porque devem votar num candidato que, como já admitiu, não vai assumir as funções para as quais se candidata. O segundo é a obrigação de ganhar as eleições ao PSD, nem que seja por um voto. Não será por acaso que Carlos Pereira colocou a fasquia eleitoral nesse patamar. Ou Paulo Cafôfo ganha ao PSD, pelo menos em número de votos, ou ficarão claras duas conclusões. Não cria ímpeto vitorioso, essencial para as eleições regionais que se seguem. Permite a Carlos Pereira o papel de vítima de um saneamento político, cujo único resultado foi uma derrota eleitoral para o PS regional. A 10 de Março, para além de saber quem serão os seus eleitos à Assembleia da República, o PS Madeira saberá quem será o seu candidato ao Governo Regional.