E o que importa para 2025?
Este é um texto a quatro mãos, interpretado por nós, dois amigos de longa data. Nesta quadra, com a pressão das resoluções para 2025, quisemos discorrer sobre aquilo que, a nós, nos importa
(Selma) “Dizem que os amigos podem ser a família que escolhemos. Em parte, até acho que é verdade. Mas, por outro lado, não concordo com a frase. Para mim, os amigos são livres das amarras e tensões familiares. É ao lado deles que somos autênticos, que descobrimos talentos e que cometemos aquelas loucuras infindáveis. Nos amigos (os verdadeiros) não há crítica e, se a há, ela é positiva e vem acompanhada de soluções e conforto. Desta premissa, nasce este texto, uma espécie de partitura, que abraça a minha voz e a tua, Zé. São mais de vinte anos de amizade: inquietos, preocupados e com um sentido de propósito que eu acho que nos define.
(JPC) “Sr. Pereira só se tiver, se não tiver dá-me amanhã.” Foi assim que uma funcionária do mini mercado na esquina de minha casa descansou um jovem que aparentava não ter menos de 80 anos e que procurava de forma nervosa o dinheiro na sua bolsinha. Provavelmente havia-se esquecido de o lá pôr e agora não tinha como pagar a conta da mercearia. Mesmo percebendo que se deviam conhecer ali do bairro, tal era o trato pessoalizado, não deixei de esboçar um sorriso e de achar que seria um bom mote para esta conversa. O que queremos nós para 2025 e o que queremos nós para as nossas vidas? Que relações estabelecemos, que estímulos pretendemos provocar nos outros e o que procuramos nós de volta que nos preencha? Os anos, a partir de uma certa idade, passam mais rápido, fazemos planos e projetos no princípio de cada um e tudo passa a correr. Acabamos por estar tão assoberbados com o trabalho, os afazeres e os problemas que nos consomem que sobra muito pouco espaço emocional para nos entregarmos aos outros e ao que verdadeiramente importa.
Num ano inteiro, que nos parece à partida muito tempo, devíamos conseguir distribuir a nossa atenção de forma equilibrada. As concretizações profissionais e o nosso crescimento cultural e intelectual, as relações que interessam e os que significam tanto para nós, os que mais gostamos de ter por perto. O que tem de ser e o que fazemos por acontecer. As obrigações e as aventuras, os momentos para rir e os que precisam de nós de forma mais responsável e atenta. O que é facto é que muitas vezes não gerimos bem o tempo e muito menos as emoções. Paramos no que achamos ser prioritário e na tristeza dos falhanços ou das desilusões. Sobra pouco para o que nos faz feliz.
É por isso que agarrando no título que escolheste Selma e nas palavras que ouvi no mini mercado há uns dias, desejo-vos a todos um ano em que não falte conexão, não faltem abraços e palavras bonitas, que não se esqueçam da magia que carregamos e que nos pode transportar para momentos simples mas perfeitos, só precisamos de ser consistentes, coerentes e ter disponibilidade mental para isso. Não há nada que importe mais do que a nossa relação com os outros, o amor e a cumplicidade, a forma como vivemos situações especiais e nos mostramos atentos aos que são tudo para nós mas também aos que estão ali a precisar de carinho e de apoio. Aos que passam dias difíceis e merecem o nosso olhar, a nossa força. Não desistam disso porque isso é viver.
(Selma) “E viver é agarrar aquilo que, para nós, é importante. Como disseste, deve sobrar tempo para sermos felizes ou, pelo menos, para procurarmos o que nos pode fazer sentir bem, o que para nós pode ser mágico. Para mim, o caminho é a busca deste espaço, de tolerância e respeito. E nisto, dei por mim a lembrar-me das minhas resoluções dos anos anteriores, rabiscadas num caderno purpurina, verde-água que me foi oferecido por uma amiga. Eram mais de uma dezena de resoluções, o que eu queria alcançar nos anos seguintes. Pontos concretos, que se repetem todos os anos como ter tempo para ler, fazer desporto ou estar com os nossos e, por fim, aqueles tópicos mais sérios, se assim lhes quisermos chamar: o espaço emocional para nós e para os nossos, a qualidade do tempo, a busca da inspiração incessante e o último, estar com os que importam. Na verdade, as nossas resoluções são compromissos que alinhamos connosco e que se encaixam num espaço, lugar ou contexto. Acredito e sempre acreditei neste olhar atento, que não é indiferente e que resiste à urgência dos dias.
Zé, falas na disponibilidade mental para esta magia da vida e eu concordo contigo. Ela urge e precisamos dela para tentarmos ser felizes. Siddhartha, no romance de Herman Hesse, citou para Kamala: “Já começo a aprender contigo. Ontem já aprendi.” E, é exatamente isto, uma dança, nossa com os outros. Queremos continuar a ser aqueles que, na floresta, ouvem os sons, inaudíveis a muitos mas perceptíveis aos nossos ouvidos. Queremos continuar a descobrir trilhos na floresta onde nos perdemos diariamente. E, isto é viver, é procurar o propósito, é escutar o outro na sua perfeição, não perdendo os nossos trilhos.
Para rematar, talvez concordemos, que não devemos deixar escapar os que queremos ter por perto e que trilham a floresta connosco. A estes devemos ouvi-los, dedicar o nosso tempo, cuidar e ajudar. Que esta entrada no novo ano possa servir para refletir, não só no brinde ou nas passas da meia noite, mas na lufa-lufa dos dias. É nesta cumplicidade e cuidado que nos tornamos pessoas, é nesta força que a vida acontece, todos os dias, sem exceção. Que a nossa atenção se espalhe pelos 365 dias, de forma equilibrada e justa. Que 2025 seja dedicado ao que importa: pouco fugaz e, se der, que nos deixe um novo trilho, de preferência longo.
*com Selma Pereira Rocha