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Agosto

Agosto tem a bondade de nos oferecer tempo (peço desculpa a quem está a trabalhar para nos garantir férias de qualidade). Tempo que nos permite refletir e fazer o balanço das promessas e dos objetivos que traçamos no período de esperança do Ano Novo. Do que ganhamos e perdemos, do que desejamos e do que, realmente, nos espera.

Este Agosto tem a particularidade de anteceder as eleições legislativas da Madeira e isso leva-me a perceber que, hoje, não deverei escrever sobre política. Se o fizer corro o risco de ser mal interpretada. Se bem que isso não me angustia. Quem lida mal com a crítica não pode estar na política.

A crítica é um problema do nosso tempo. É um problema no sentido em que ela, crítica, nasce por força de uma análise que desconstrói o senso comum. Ela faz-se por herança deixada pela educação, que se assume como voz e consciência. É a voz com quem conversamos, que nos orienta na vida e nos julga no silêncio da noite. Só assim não nos perdemos e garantimos que há dignidade na lealdade à nossa própria voz. Mas também ela tem um tempo. O seu limite é a deceção.

Vivemos em função de um tempo que não temos, precisamente porque já nos foi subtraído. Continuamente ligados e freneticamente concentrados no que é colateral, percebemos agora que uma distribuição mais justa e igualitária do principal bem produzido na luta com o exterior é o tempo livre. O tempo livre é aquela parcela da existência não consagrada ao trabalho necessário para a sobrevivência. O que parece e permanece estranho é o facto de a estrutura do trabalho social ainda não ter se transformado pela necessidade do tempo livre. E o que é que fazemos quando temos tempo livre? Matamos o tempo. “Então, o que estás a fazer?”. “Estou a matar o tempo”. O mesmo tempo que exigimos e desejamos para, depois, poder matá-lo.

Agosto é o mês do tempo. Serve para tentarmos compreender melhor o mundo em que vivemos. Somos, à partida, mulheres e homens civilizados. Dos caminhos que percorremos, desde o nascimento, cometemos erros, ingratidões e maldades. Mas há males maiores do que outros. No fim, acabamos no mesmo espaço.

Mais ou menos felizes, com ou sem ganância, mesquinhos, cobardes e/ou servis há, em quase todos nós, um sintoma digno de admiração: um profundo desejo de liberdade. Poucos, muito poucos, optaram por carregar o diabo às costas. Mas até esses acabam por ser consumidos pelo tempo.

Que Agosto nos dê lucidez para compreendermos que quando não se pode admirar, podemos pelo menos aspirar a compreender mais do que a condenar. O mundo está cheio de podadores e propagandistas aptos a destruir qualquer bondade. São movidos pela destruição e inveja. Sobre ela falarei em Setembro.

“Para muitos, a felicidade não é um fim, nem para si nem para os outros. Mas é lícito suspeitar que tais pessoas são meros frutos amargos (Russel, B.)”.

Bom descanso.