Era dia de tosquias na Achada do Teixeira

Saindo do povoado na freguesia de Santana e, subindo encosta acima em direção ao Pico Ruivo, encontramos a Achada do Teixeira, um mini planalto, envolto num verde urzal, onde a Mãe Natureza é Rainha.

Um sanatório sagrado, onde a pureza da brisa fresca que por nós passa, nos purifica os pulmões, ao mesmo tempo que, um silencio divino, nos enche a alma, refrescando a nossa mente e deixando-nos alienados ao resto do mundo, embriagados numa soberba paisagem, sem que, os nossos olhos tenham tempo para pestanejarem.

Moledo da Natureza, em forma de homem em pé, esculturado por mãos divinas, sobressai naquela serra entre outras belezas divinais.

Na minha memória, já cansada pelo tempo, há recordações que permanecem intactas, que sem grande esforço, às vou puxando do fundo do meu baú.

Era dia de tosquias, na Achada do Teixeira.

O meu amigo João, estava lá e, eu soube disso.Ele teria que lá estar, ou não fosse ele “caganiteiro” (alcunha graciosa, dada aos pastores naquela época, em Santana).

Fiz-me ao caminho e fui até lá.

Apesar do tempo chuvoso que se fazia sentir, na parte baixa de Santana, naquela achada, o sol brilhava e aquecia um ambiente, por si só, já aquecido com o calor humano, que se sentia ali, onde não faltavam iguarias para petiscar e o garrafão para refrescar os mais sedentos, num espírito de verdadeira confraternização. O jogo do lenço, de mãos dadas, coloria aquela roda-viva, sadia, que ali se vivia.

A intenção da minha visita, era apenas cumprimentar o meu amigo,” cheirar” o ambiente e, sem mais delongas, um adeus até à próxima.

Entre o jogar ao lenço e a conversa a puxar conversa, começavam os pastores com a ajuda do cão, a tarefa de apanhar as ovelhas e fazê-las chegar ao redil, para serem tosquiadas.

O som dos chocalhos e do balir das ovelhas, juntando-se ao som do latir do cão e às vozes dos pastores, nas ordens emanadas às ovelhas, que nem sempre lhes obedeciam, davam um ambiente sonoro, aquela festa, como se de música de fundo se tratasse.

E naquele tom festivo, começava a tosquia.

Entusiasmado naquilo que ia acontecendo, o meu até à próxima, se ia adiando.

A tarde caía e, o sol a esconder-se por detrás dos montes, entre um cenário de multicores, deixava-nos boquiabertos com aquela maravilha, que a natureza nos doava. Foi o mais lindo arrebol, que até hoje vi.

As cores que a partir do horizonte, refletiam entre a verdura dos montes e o basalto dos moledos, eram de uma beleza rara, um cenário indescritível. Sem vontade de arredar pé, lá encetei o regresso, com a adrenalina renovada e um filme que gravei na película da minha mente, de tamanha qualidade que jamais se apagou.

José Miguel Alves