Esperar o 26 de Abril para se cumprirem promessas do 25?

Não estará esgotado o 25 de Abril? Trouxe experiências de entusiasmo, preocupação, promessas e esperanças. Mais intensas nos primeiros meses e mais preocupantes no chamado “Verão quente”, em que a horda primitiva dos irmãos do mito, retomado por Freud, “matou” o pai, para se apoderar da mãe e gozar sem limites todo o património, como narrei no meu livro (Revolução e Libertação, 1976). O bem da liberdade foi o mais disputado nas lutas entre a cultura judaico-cristã e helenista do Ocidente, e a do Oriente totalitário. A luta ainda continua; tornou-se mantra e calmante de promessas não cumpridas.

Ser português de coluna cultural identitária lusa, de 800 anos, ficou a decair para a esquerda totalitária ao jeito constitucionalista do século dezanove e do republicanismo posterior. O salazarismo de direita quase deu lugar ao Abril de esquerda do Oriente vermelho totalitário marxista. Foi onda que quase submergiu o país e as colónias afastando muitos proprietários, de cá, e colonos, de lá, do xadrez político por nacionalizações e ocupações totalitárias de propriedades, e empresas do tecido económico nacional. Houve muito sofrimento e guerras. Muitos foram reduzidos a pedintes, a subsídio-dependentes e a emigrados mais empobrecidos que no tempo do salazarismo. Nem faltaram os “saneados” de posições e cargos pelos novos donos do poder. A cultura cristã desta Europa do passado, feito futuro adiado, ou «Ocidente, futuro do passado» (Fernando Pessoa), continua varrida por mantras de orientalismo anquilosado e questões fraturantes.

As promessas de Abril por cumprir fazem aumentar os pobres e tornar alguns ricos sempre mais ricos. A cultura da esquerda dominante contrapõe-se a um cristianismo de muitos batizados não praticantes e alguns briosos de se declararem ateus, agnósticos ou indiferentes. Nem faltam os que rejeitam a pertença social cristã por vergonha. Será que censurar e apagar as raízes cristãs europeias saneando biografias de santos portugueses e livros que marcaram a identidade lusa de oito séculos, ainda é promessa de Abril? Ainda participei nalguns poucos encontros em que havia mistura de católicos e de políticos revolucionários, mas o “Verão quente” e as ações de controlo totalitário ligadas a certos grupos, à esquerda, arrefeceram o interesse. E pensar, hoje, que ideologias desta estirpe esquerdista ainda aprovam a invasão da Ucrânia!

Não será que se está a precisar doutro salto cultural, de mais valias, para suceder a 50 anos desta mesmice letárgica, e cumprir as promessas em falta? Será futuro para a Europa censurar e apagar a cultura cristã com iluminismos de chave francesa, pombalismos, republicanismos e abrilismos? Na sua recente visita à Hungria, o Papa louvou o Ocidente cristão, tão esquecido na Europa, e pediu que se abram as portas aos ucranianos e os ajudem a construir a paz com Cristo. “É belo que as fronteiras [entre o Oriente e o Ocidente cristãos] não representem confins que separam, mas áreas de contacto, e que os crentes em Cristo ponham em primeiro lugar a caridade que une e não as diferenças históricas, culturais e religiosas que dividem”. Afinal, donde se pode esperar mais a solidariedade humana senão daqueles que se identificam com as palavras e obras de Cristo que marcam o Ocidente em contraste com o Oriente sem Cristo?

Aires Gameiro