Análise

A redescoberta da ilha esconderijo

A Madeira sempre escondeu encantos mas também colecciona irrelevâncias

O paraíso regional é também uma espécie de esconderijo. Sempre foi assim desde a descoberta. Um misto de escola de virtudes com potencial vistoso e lucrativo em diversas áreas, apreciado sobretudo por quem não está obrigado a viver nas ilhas e, a julgar pelas notícias plantadas nos últimos meses na imprensa nacional pelas agências de serviço no território, de refúgio da delinquência mais ou menos organizada, camuflada ou tolerada, mormente por quem gere, à vez, as diversas estruturas com poder.

A Madeira esconde beleza e por isso tem procura. Basta que alguém espalhe com sabedoria os encantos insulares e que tudo aquilo que decorre da descontinuidade territorial seja acautelado, que os transportes funcionem, que a concorrência seja uma realidade e que o mercado faça o resto, ou seja, que dite preços e tendências, escolhas e preferências.

A Região esconde talento grandioso, muito do qual só ganha esplendor e notoriedade, relevância e influência quando se afirma em palcos externos, menos dados à mesquinhez e à inveja, porque mais focados na competência do que nas conveniências.

A Madeira guarda segredos de gestão exemplar, segundo alguns entendidos, na arte de “governar bem”, no crescimento da economia e no desenvolvimento sustentado.

É inegável que uma pérola do Atlântico com este brilho tenha vindo a ser redescoberta pelos conquistadores do Portugal autêntico que se orgulham de ter por perto uma tropicalidade gratificante e uma simpatia contagiante; pelos comentadores de circunstância, ávidos de apoio público, sejam eles putativos candidatos presidenciais ou líderes de insuspeitos movimentos de cidadãos; pelos nómadas digitais gratos à tecnologia, ao sol e à poncha; pelos endinheirados com autorizações decorrentes dos ‘vistos gold’ que investem no imobiliário de luxo; pelos estudantes deslocados numa Universidade que recebe cada vez mais estrangeiros com problemas de integração social; e pelos anónimos indiferentes.

Nunca como hoje a Madeira foi tão badalada por esse mundo além. Mas este feito dificilmente será colectivo. Alguns não querem que assim seja por necessidade. Precisam de capitalizar os feitos em função de aspirações egoístas. Outros teimam em não fazer a sua parte na hora de colher o que plantaram. E há quem bata o pé ao sucesso pois detecta sem esforço que alguma Madeira varre para debaixo deste imponente tapete floral outros factores que a tornam irrelevante, desequilibrada e redutora.

Esta é a mesma ilha em que Hugo Chávez escondeu fortuna resultante de comissões de negócios com o petróleo venezuelano, em que Alberto João Jardim escondeu facturas na altura em que a dívida colossal posta a nu rondou os 6 mil milhões de euros e em que alguns ainda escondem nos cofres domésticos o que sobrou dos devastadores esquemas piramidais. Ou seja, há sempre uma apetência para que o antro contamine o que temos de bom. E é por causa de uns e de outros, e ainda dos respectivos cúmplices e tribos, que muitos dos locais optam por passar despercebidos de modo a terem sossego. É que se se mexerem muito ou são favorecidos ou corruptos. Ou a sair de cena se é que querem ter futuro. Mas ficar também é opção. Há ainda muito alçapão por abrir.