Crónicas

O bom, o mau e a rebaldaria

Cumprindo com a tradição pascal, o PS tem oferecido, como penitência pela desastrosa epopeia das caravelas aéreas da TAP, sucessivos cordeiros. Primeiro, foi entregue às hordas a afortunada ex-administradora da companhia. Como o sacrifício não foi bastante, seguiu-se a cabeça da CEO francesa e do Presidente do Conselho de Administração. Mas, a cada audição da comissão de inquérito, o pecado aeronaútico tornava-se cada vez maior. Chegara a vez de entregar, e aniquilar em praça pública, um ex-secretário de estado. Desde que não lhe chegue qualquer responsabilidade, António Costa está disposto a tudo e a entregar todos.

O bom: Índice de Competitividade Regional

A Comissão Europeia publica, a cada três anos, um índice em que compara a competitividade das várias regiões europeias. A comparação é feita em três planos: o básico, o da eficiência e o da inovação. Em cada um são analisados fatores como as infraestruturas, o mercado de trabalho ou a prontidão tecnológica, com vista a medir se, na Europa, o desenvolvimento regional é, mais ou menos, assimétrico. No índice de 2022, a Madeira e o Norte português surgem no conjunto das regiões que mais evoluíram, desde 2016, nos fatores comparados. No nosso caso, a lista coloca-nos no terceiro lugar entre as 234 regiões europeias analisadas. Um sinal muito positivo. No entanto, isso não torna a Madeira na terra do leite e do mel económico, até porque no melhor pano estatístico há sempre espaço para a nódoa. Como prova, o líder parlamentar do PS local desenterrou números negativos numa análise que é globalmente positiva. Rui Caetano cumpre o seu papel. Há, em qualquer exercício de oposição política, uma tentação para o pessimismo. São ossos do ofício de quem tem por missão a fiscalização da governação e, desde que temperada pelo bom senso, não é uma deriva que preocupe. O problema começa quando a crítica se torna pressuposto de toda a ação, ao arrepio dos factos e embriagada pela crença de que “quanto pior, melhor”. Não se trata de exigir à oposição o reconhecimento dos méritos da governação, mas apenas de pedir que não se reduza à miopia do derrotismo constante. Se visse melhor ao longe, Rui Caetano teria percebido que não faltam verdadeiras razões para preocupação no índice europeu. Nomeadamente que, à exceção de Lisboa, nenhuma região portuguesa atinge a média europeia. O problema é que, nesse caso, o socialista já não podia culpar o PSD.

O mau: IVA Zero

Em Portugal, a concertação de preços é uma prática ilegal. Potencialmente criminosa. Por isso, a Autoridade da Concorrência está encarregue de fiscalizá-la. Também em Portugal, o Governo celebrou, à sombra do programa IVA Zero, um acordo de concertação de preços com os supermercados. E quem fiscaliza o cumprimento de tão bizarro acordo? A Autoridade da Concorrência, pois claro! O arranjo entre o Estado e os supermercados, para além de surreal num mercado livre e concorrencial como o nosso, é a maior prova do que é economicamente evidente. A redução do IVA não garante a redução do preço dos bens. Basta olhar para o que aconteceu em Espanha. Tal como António Costa, o governo de Sanchez isentou de IVA um conjunto de bens essenciais e reduziu a taxa aplicada a outros alimentos. Em 15 dias, a subida de preços anulou o alívio fiscal, ou seja, a medida não teve qualquer efeito real no preço. Não se pense, no entanto, que a fixação administrativa de preços é uma medida inofensiva. Não é, por duas razões principais. Primeiro, porque tem um efeito real e avultado na despesa pública. Costa admitiu que a perda de receita fiscal e o reforço dos apoios à produção terá um custo global de 600 milhões de euros. Segundo, cria uma expectativa perigosa de que o Governo pode fixar, sem consequências, o preço de um conjunto alargado de bens. Essa fantasia económica, defendida por partidos à esquerda do PS, é reveladora de um governo que não tem qualquer plano para o futuro do País e que está reduzido a gestão diária da sua sobrevivência.

A rebaldaria: O Governo e a TAP

Zangam-se as comadres, sabem-se as verdades. No caso da comissão de inquérito sobre a TAP, para além da briga entre a comadre francesa e a comadre portuguesa, resolvida à custa do dinheiro dos contribuintes, ficámos a saber da rebaldaria em que se tornou o Governo da República. Há de tudo um pouco, na trupe governativa de António Costa. Medina escolheu uma secretária de estado sem conhecer o seu percurso profissional. Pedro Nuno Santos pediu explicações à TAP e encarregou o seu secretário de estado de preparar o esclarecimento. Galamba e Ana Catarina Mendes não se entendem sobre quem terá convocado uma reunião secreta com a CEO da TAP. Felizmente, nenhum deles atribuiu essa responsabilidade à secretária. Hugo Mendes tentou alterar voos da TAP, fazendo da companhia a agência de viagens do Governo. E proibiu a TAP de contactar qualquer outro ministério, que não o seu. O toque de informalidade neste surrealismo governativo está na possibilidade de muitas destas decisões, e outras tantas do Governo, terem sido tomadas por WhatsApp. Vê-se e, por vezes, não se acredita na falta de pudor com que tudo isto foi revelado. A falta de pudor com que o PS coloniza e explora o Estado é inquietante. Marcelo, por suposta falta de alternativa clara, não vê razão para novas eleições. Julgo que, por agora, terá razão. Ainda assim, convém relembrar qual era a “alternativa clara” quando Sampaio tomou essa decisão. Chamava-se José Sócrates.