DNOTICIAS.PT
Crónicas

Habitação e impostos

1. Disco: a Soul do século XXI terá sempre a mão dos Black Pumas. Com uma mistura única de soul, funk, rock e R&B, entram rapidamente na alma de quem gosta dos géneros que o projecto abarca. “Chronicles of a Diamond” é um disco esteticamente coeso, criando uma atmosfera envolvente de sonoridades quentes e altamente dançáveis.

2. Livro: “O Genocídio Ocultado” de Tidiane N’Diaye é um livro que lança luz sobre um capítulo sombrio, e frequentemente ignorado, da história da humanidade: o tráfico de escravos árabes em África. Uma narrativa poderosa e convincente, revelando a extensão do sofrimento humano infligido por séculos de escravidão árabe no continente africano. Uma análise perspicaz das motivações económicas, políticas e culturais por detrás deste comércio cruel, destacando como a demanda por escravos influenciou significativamente a história do continente.

3. Nos últimos tempos muito se fala sobre habitação, assunto que os Governos foram persistindo em não tratar. A responsabilidade é múltipla. A do Estado, a do sector privado. A irresponsabilidade de todos nós, pouco exigentes no tratar de assuntos desta importância.

Mas há um aspecto que tem sido deixado de fora: a perspectiva de quem constrói a sua casa, a casa onde aspira viver parte significativa da sua vida.

Façam o favor de me acompanhar. O João tem um trabalho estável. Com a sua mulher consegue ganhar o suficiente para poderem construir a casa dos seus sonhos, recorrendo ao crédito bancário.

Para além de ter de se haver com inúmeros regulamentos, PDM, coisas e coisinhas, leva também com o RJEU (Regime Jurídico da Urbanização e Edificação) e, como se já não fosse suficiente, com o RGEU (Regulamento Geral das Edificações Urbanas), na sua adaptação regional, que teve a sua génese no longínquo ano de 1951. Artigos, alíneas, parágrafos, cujo único objectivo é o de amarfanhar a cabeça de quem só quer um lugar onde morar.

Os critérios absurdos que obrigam a bidés e banheiras, mesmo que não as queira, e a outros quesitos sem sentido.

O João comprou um terreno e já sabia que o Estado se ia abarbatar com uma parte dele. O chamado “domínio público”, seja ele necessário ou não, faz com que, todos os anos, a propriedade do Estado aumente desmesuradamente. Não tenho nada contra isto, desde que essa necessidade seja efectivamente comprovada, mas mesmo assim entendo que esse acto deve ser sempre compensado nas taxas e emolumentos que quem constrói tem de pagar.

Desengane-se quem pense que as coisas ficam por aqui. É que falta falar dos impostos: IMT de 6,5% na aquisição do terreno. IVA sobre todos os actos de compra e venda de seja lá o que for, e ao longo de todo o processo. O custo financeiro e burocrático das licenças municipais.

O empreiteiro liquida IVA nos materiais, paga IRS e SS dos funcionários e IRC sobre eventuais lucros. Mais taxas de ocupação de via pública, de circulação e o que se conseguir inventar. São exigidas especialidades e trabalhos sem préstimo futuro previsível, por exemplo, pré-instalação de gás (mesmo que se o não vá usar), com a consequente sucessão de projectos, certificações, impostos e por aí fora. Seguem-se taxas, certificados energéticos e acústicos e licenças de utilização.

Depois volta o IMT e o selo na alienação das habitações. A render durante mais uns anos, os impostos associados quer ao financiamento à construção, quer à aquisição. O IMI e mais taxas e taxinhas, todos os meses, nos vários consumos domésticos. E mais IVA de quem certifica, os impostos associados à hipoteca na aquisição (no custo da avaliação, no registo da hipoteca, etc.), as mais-valias e por aí fora…

E IVA, e mais IVA, que não é dedutível e fixa-se na taxa mais alta. Ou seja, no final, a casa do João, além dos materiais, leva com bem mais de 40% em impostos.

Construir uma casa é um verdadeiro acto de masoquismo, um sofrimento. São muitos os madeirenses que passam por isto. E nem falo dos modos como por vezes se insinuam “acelerares” de processos ou “libertação” de licenciamentos, as indirectas de olhar para o lado, o “desregulamentar” ilegalidades, que fazem com que o custo aumente.

No fim, a surpresa é que temos um problema na habitação: é inexistente ou muito cara.

4. Com o actual estado das coisas e com uma legislação que só complica, estaremos sempre a tentar minorar os efeitos, deixando as causas por resolver. É urgente reduzir as regulamentações e burocracias que afetam o mercado imobiliário, tornando o processo de construção e desenvolvimento mais eficiente e menos oneroso.

Alterar o actual conceito de “custos controlados”, que o não são, e oferecer benefícios fiscais (isenções de impostos e/ou créditos fiscais), para investidores e construtores que se comprometam a construir habitações acessíveis, ou seja, a custos efectivamente controlados.

Não se pode querer resolver o estado a que chegámos sem incentivar o acesso à propriedade privada, permitindo a aquisição de habitação com mais facilidade e promovendo o mercado de arrendamento. Ao contrário do que se possa pensar, a regulação do preço das rendas não ajuda em nada o mercado. Só complica, retirando cada vez mais casas para aluguer, sempre que se fala nisso.

É preciso encorajar a mobilidade entre o local de trabalho e áreas urbanas e rurais de residência (incentivando redes de transporte de qualidade), permitindo que as pessoas escolham onde viver com base nas suas preferências e necessidades económicas.

Permitir que os mecanismos de concorrência funcionem por si, de modo que o poder da oferta e da procura seja o grande regulador. Manter a legislação estável e garantida nos seus preceitos, funcionamentos e intervenção, é de enorme importância.

Não podemos, de modo nenhum, ser avessos a parcerias entre o sector público e o privado, de modo a desenvolver projectos habitacionais de qualidade, compartilhando riscos e recursos.

Estes são princípios gerais a que nos devemos ater. De qualquer modo, cada caso é um caso e qualquer abordagem para a resolução do grave problema da habitação deve ser cuidadosamente avaliada e adaptada às circunstâncias específicas da Madeira, considerando os inúmeros factores inerentes ao espaço e às pessoas, bem como ter em atenção as questões sociais e económicas que o problema levanta.

5. Saiu o último Boletim de Execução Orçamental. O que lá vem não me espanta absolutamente nada. Uma brutal colecta de impostos sofrida pelos contribuintes madeirenses, uma brutal colecta de impostos “imposta” à região do país com maior risco de pobreza.

De Janeiro a Setembro, três trimestres, o Governo Regional cobrou cerca de 802 milhões de euros em receita fiscal, um aumento de 18,6% (mais cerca de 150 milhões de euros) face ao período homólogo. Trata-se da maior cobrança de sempre.

O volume de impostos recolhidos na Madeira é, percentualmente, o maior de todos. Maior do que o verificado nos Açores e maior do que aconteceu no espaço continental.

O IRC quase que duplicou. O IVA, esse imposto que está longe de ser progressivo, pois, rico ou pobre, todos pagam o mesmo, passou de 355 milhões para 406 milhões, mais 14,2%, mais de metade do total arrecadado em impostos. O IRS, que afecta directamente as famílias que o Governo diz ter baixado, está longe de ter visto a sua arrecadação a baixar: 159 milhões de euros, que representam um aumento de 6,2% (mais quase 10 milhões de euros) para os cofres do Governo.

Imposto sobre Veículos (ISV), mais 44,4%; Imposto sobre o Tabaco (IT), mais 15,7%; Imposto Único de Circulação (IUC), mais 15,2%; Imposto de Selo, mais 6%; Imposto sobre Bebidas Alcoólicas (IABA), mais 0,9%. O único imposto que não viu a sua colecta aumentada foi o Imposto Sobre Produtos Petrolíferos (ISP), que sofreu uma redução de 15,3%.

Este Governo Regional pode fazer muito, mas mesmo muito mais. Tem capacidade legislativa e executiva para reduzir todos os impostos em, até, 30%.

Baixar impostos é colocar a taxa de IVA mais alta nos 16%, como nos Açores, reduzindo o impacto do aumento do custo de vida sobre valor dos bens essenciais.

O Governo não consegue governar sem se apoiar no esbulho fiscal do contribuinte. E isto, gostem ou não gostem, é SOCIALISMO.

6. Ai, Marcelo, ai, Marcelo… não sei o que é mais triste, se as aleivosias que dizes, se as explicações que depois queres dar.