Crónicas

De volta, com o coração cheio

Uma semana em África e é certinho como o destino voltar com a bagagem cheia de emoções e histórias boas para contar. Eu costumo dizer que cidades como Paris, Londres ou Nova Iorque, por muito bonitas que sejam, com todo o seu charme, os melhores restaurantes e o acesso a tudo o que o dinheiro pode comprar, não diferem assim tanto umas das outras. São cosmopolitas, cheias de vida e cada uma logicamente com as especificidades mas não deixam de ser cidades modernas com um estilo de oferta muito similar. Os países africanos, nomeadamente os de língua portuguesa são diferentes em tudo e são até diferentes uns dos outros embora tenhamos sempre a tentação de meter tudo no mesmo saco. Talvez por isso o impacto que tenham em nós seja brutal, porque a língua permite-nos em pouco tempo absorver tudo de uma forma muito mais nítida, porque a nossa cultura se mescla com a deles e porque a essência e o perfume selvagem da natureza continua todo lá, numa simbiose perfeita com pessoas que fazem parte de nós e que nos dizem tanto.

Não deixo no entanto de constatar o quanto podíamos investir e ajudar a fazer crescer estes países em vez de andarmos sempre com a ladainha do racismo e da apropriação cultural. A influência portuguesa vai continuando a marcar esta gente mas nem sempre da melhor forma. Diria que andamos a perder oportunidades de ouro para construirmos em conjunto, para abraçarmos mais sólidas pontes, seja cá ou lá. A verdade é que muitas das vezes mesmo os que lá estão não desempenham bem o seu papel. Veja-se por exemplo o caso da TAP, que continua a praticar valores exorbitantes, aproveitando-se da vantagem estratégica que detém, nomeadamente no que diz respeito ao reconhecimento da marca e que em vez de nos aproximar, tantas vezes nos dificulta. É um caso, em que um grupo privado como a EuroAtlantic faz muitas vezes o papel ( de excelência diga-se ) que deveria ser de uma empresa pública que tem nos seus objectivos ligar-nos ao mundo lusófono mas que se esquece ou não sabe como é que esses países funcionam nem as suas reais necessidades.

Regressando aos destinos propriamente ditos, percebo que se opte variadas vezes por outros destinos como a América do Sul ou as Caraíbas ao invés de São Tomé ou as Ilhas Bijagós na Guiné Bissau, que possa parecer mais sexy ir para as Maldivas ou Seychelles do que para as praias do norte de Moçambique, mas digo-vos eu, que já estive em ambos os sítios, estão a perder uma oportunidade única de serem surpreendidos e ficarem assoberbados com a beleza natural existente. Os países de Língua Portuguesa destinos de praia como os que enumerei mas também Cabo Verde, são destinos seguros ao contrário do que se diz, somos muito bem recebidos ao contrário do que muita gente pensa e já existem em alguns deles alojamentos que nos proporcionam tudo da mesma forma. Como uma vantagem clara, ali podem mergulhar no nosso passado e perceber parte da nossa história, podem ajudar povos nossos irmãos e são confrontados com pessoas únicas, sorrisos que nos deixam com a pele arrepiada, mares quentes e águas transparentes, mas também com uma certa dose de aventura para quem não quiser passar os dias de papo para o ar. Cascatas lindíssimas, trilhas em selvas de cortar a respiração, ilhas paradisíacas e excelente gastronomia.

Às vezes falta informação, muito por culpa nossa e tantas outras a informação que passa é errada. Mas a verdade está lá para quem a quiser visitar. Em São Tomé por exemplo tanto a norte ( Mucumbli ) como a sul ( Club Santana ) existem infra estruturas com tudo o que podem sonhar e imaginar com a particularidade de respeitarem a sua envolvente e o que têm de mais puro e natural. É o conforto, a vista, as paisagens e os sabores sem estragar a natureza. África traz-nos sensações únicas, disso podem ter a certeza e não precisam de correr riscos para poderem usufruir dela. Claro que nem tudo é perfeito e que existe ainda um longo caminho a percorrer no que ao turismo diz respeito mas será que parte do fascínio não partirá daí também? A magia destes espaços, está em muito relacionada com a sua pureza, com a genuinidade das pessoas que trocam olhares connosco ou com as crianças que nos vêm dar a mão em sinal de carinho e proteção. Não há nada que nos impacte mais na vida do que as relações humanas, nem as paisagens e nestes destinos cruzamo-nos com seres fascinantes, cheios de luz própria, uma luz profunda que nos parece despir a cada instante e nos desarma. África faz falta a todos nós, traz-nos coisas que não se aprendem na escola e desafia os nossos sentimentos e as prioridades que temos na vida. Isso não tem preço, nem dá para vender um folheto de uma agencia de viagens. É preciso partir em busca do que nos faz falta e do que nos pode preencher. São Tomé por exemplo é muito mais do que praia, é toque, é paixão e emoção. Não sou só eu que o digo, são os que me acompanham nestas viagens, os olhos de admiração, os sorrisos de felicidade. Nem precisam de falar, há coisas que se sentem mesmo de boca calada. Sobretudo de boca calada, a respeitar a nossa espiritualidade e a aprender com a dos outros. A energia que nos desperta os sentidos. África é um vício bom que nos torna melhores e nos faz encontrar novas razões para viver.

Texto dedicado aos meus amigos, Maria João, Iva e Zé.