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A mulher da praia e o sargento Pita

Um jovem militar de cerca de 28 anos foi destacado para a zona da Praia formosa na época de 1942-44 para vigilância e segurança do inimigo externo.

Afirma o militar que teve contacto com mulher vivaz de 30 e poucos anos, mãe de três filhos de tenra idade, um de 12 anos, um de 10 e outro de 6, que vivia num quadro de pobreza, situação precária, cujos recursos era o trabalho do bordado e da horta.

Um certo dia conheceram-se, ela magra de constituição, face morena, olhos negros, vivazes de expressão.

Ele, jovem varonil (que de acordo com o dicionário quer dizer postura honrosa, comportamento impecável e elogiável), de constituição e actividade natural da idade.

No princípio foi um convívio normal, mas, costuma dizer-se que debaixo do borralho há fogo que arde em silêncio.

Ela na idade sensual, transpareceu o desejo de um convívio íntimo. O olhar de profundo fulgor, a movimentação gesticular, de actividade inconstante demonstrava ansiedade, por vezes as narinas dilatavam-se sobrepondo-se ofegantes ao normal.

Ele, matreiro, atento, também com o propósito de avaliar a sua capacidade varonil (viril, masculino, másculo, destemido, valoroso, valente) e reprodutor procuram conciliar os sentimentos mútuos.

O valente e honrado militar era visita assídua da mulher e com sentido humano do auxílio ao próximo, proporcionou a ajuda possível de amparo aquela família.

No ano de 1942 existia a organização defensiva do litoral do Funchal, zona oeste e parte principal – Porto da Cruz e com Machico e Caniçal, uma companhia de infantaria foi destacada para a Praia Formosa a fim de preparar a sua defesa da invasão do inimigo.

Estabelecidos os alojamentos do comando e do pessoal da companhia num circuito restrito e instalados numa velha casa da Ramboia, num armazém anterior recinto de engradamento de banana para exportação, foi transformado em dormitório de praças. Os sargentos e subalternos foram alojados em prédio vizinho, ainda existente que está hoje transformado em zona turística e habitacional, “Madeira Palácio”, etc…

Num ambiente de dificuldades de toda a espécie de trabalho e económicas devido a dificuldades da guerra.

Imprevistos diversos, um dia surgiu o impensável, numa situação de fracos recursos, vivia uma família cujo chefe tinha falecido, sem meios de subsistência garantidos, viviam num quarto em comum, tendo como apoio uma cozinha anexa, com o telhado em ruína, sem porta e ao fundo uma lareira formada por duas pedras onde assentava uma panela para a confecção de alimentos.

Continua o sargento a descrever que “frente à porta havia um banco baixo de pedra onde se sentavam os miúdos, a dona de casa e uns parentes (os primos) que vivam aí ao lado”.

O militar, sargento do Exército, viu o filho menor de Conceição (mais tarde a parteira dos pobres durante mais de 30 anos), um rapaz de cerca de oito anos ou menos, a pedir à porta do refeitório dos praças (não dos sargentos), algumas sobras do rancho, juntamente com outros miúdos da redondeza.

Nobremente, o sargento, quando em serviço, à hora da refeição dos praças, sempre que possível, satisfazia o fornecimento de alguma sobra que o miúdo (o João) levava para casa.

Esta situação, afirma o sargento patriota e bondoso, prolongou-se por tempo indeterminado, e como dava jeito ao militar, surgiu a criação de um casal de suínos para procriação, lavagem das caldeiras do rancho e dos restos utilizados no rancho.

Com visitas assíduas ao fim da tarde, diz o militar honrado, culto e de boas famílias, que sem intenção malévola (isso são coisas do diabo), certo dia (nada de piropos), conversa puxa conversa, entram no gracejo e mais gracejo e sob um olhar fortuito da dona da casa (pessoa sem recursos, sem habilitações académicas e três filhos com fome) uma inesperada expressão surgiu!

“Quem come o comerzinho, dá o peixinho, digo eu talvez a gata, afinal os militares graduados tinham tempo para gracejos, piadas e picadas!

Dotado de grande capacidade intelectual e psicológica, o militar concluiu que “afinal foi um sinal de intenções reservadas, que ele atribuiu ao desejo íntimo de relações privadas”. Se bem pensou, cedo ou tarde se concretizaram e assim começou quanto tempo passou (durou 7 anos).

Determina a táctica militar, e os objectivos a atingir e assim ao vigor da exigência masculina, onde (era necessário o objectivo) saber da sua capacidade reprodutiva, aquela expressão “dá o peixinho” foi um incentivo á descoberta do fim a atingir, isto é, era saber se o canhão tinha bala ou pólvora seca.

No apogeu da satisfação do militar (porque se desconhece a satisfação da mulher) e que consuma-se a fome com a vontade de comer, diz ele, num acerto comum.

O militar concluiu que era homem, o brilhante e as divisas encheram os olhos, porque realizou-se a “experiência” e apareceram os vestígios duma capacidade positiva, a dele, grande macho, que aumentava a miséria da família acrescentando aos 3 famintos mais um pequeno, que a tropa mais tarde diz ter encontrado dentro das bananeiras, filho de pais incógnitos.

O militar, cai na real e afirma que “a imaturidade surgiu, perante a responsabilidade duma paternidade”?

Surge a luta de classes, o sargento não podia ser pai de um filho de uma pobre que vivia das sobras dos soldados do quartel.

Avolumam-se os preconceitos familiares e sociais (do sargento) e não podia haver confusão de relações promíscuas com a pobre mulher.

O sargento diz que tem respeito aos pais (em vez de medo e vergonha) e por isso está em apreensão constante até que surge a solução mágica.

A solução é intervenção médica reservada, a eliminação do feto em desenvolvimento.

Facto consumado! Porém advêm os imprevistos para a mulher, consequências desagradáveis e “aquilo que era caracterizado por uma situação íntima, constituída pelo apoio humanitário de bem-fazer, sobrepõe-se à realidade dos factos constituído em apoio alimentar periódico.

Os tempos passam, e as visitas a horas mortas, depois de restabelecida uma nova experiência se proporcionam.

Eis que nova prova de masculinidade apareceu, se proporcionou e apareceu positivo, mas não foi efectuada qualquer interrupção do feto por intenção propositada.

Tudo ficou resolvido, a criança nasceu, foi abandonada e obviamente o afastamento do convívio foi efectivado.

Refere o militar que houve contestação, sem procedimento de legitimidade e a “criança” (não o filho) do sexo masculino foi registada na época, sob anonimato, posteriormente a mãe assumiu a maternidade e o pai à beira da morte deixou documento onde afirma que a criança cresceu e estudou e fez-se homem, mas cujo paradeiro ele não sabe.

Consultado o Registo de Nascimento da criança, constata-se que a declaração foi feita por Jaime Pita, Segundo Sargento de Infantaria, residente no Sítio da Nazaré, São Martinho.

O registo data de 23 de Maio de 1974, e além do conservador do Registo Civil, assinaram o declarante e mais dois camaradas de armas, António Joaquim Ferreira e João Teixeira Brazão.