Análise

Complexos de superioridade

A quem serve a pressa em anunciar medidas para depois reclamar Pioneirismo?

Bastou o DIÁRIO revelar, a meio da semana, que o médico infecciologista, Silva Graça, considerou o quadro epidemiológico da Madeira preocupante, vaticinando o aumento de infecções, hospitalizações e internamentos em cuidados intensivos nos dias que vivemos - o que viria a confirmar-se em tão pouco espaço de tempo - para a trupe regional com tiques de ‘povo superior’ e fiel seguidora das operações de branqueamento em larga escala sair a terreiro em defesa da sua dama, que não é a nossa. E fê-lo de tal de forma, excêntrica e narcisista, que o gozo está instalado.

É para o lado que quem manda dorme melhor, pois está visto que não tem espelhos, não aprende com as incoerências que produz e com a propaganda enganosa que desencadeia. E assim, quem cumpre o dever de alertar o poder para as consequências da pressa em tudo anunciar só para ser primeiro, custe o que custar, tem andado a pregar aos peixes. Nesta nova fase pandémica, a Madeira mostra-se orgulhosamente só e sem vergonha da humilhação global.

Os delírios multiplicam-se.

• O secretário regional da Saúde desata a ameaçar quem não vacinou as crianças, o presidente do Governo dá-lhe suporte básico e depois ficamos todos a saber que alguns filhos desta boa gente ainda estão por vacinar!

• O Governo madeirense decreta que uma pessoa com a vacinação completa e com dose de reforço já administrada que tenha um contacto directo com um caso positivo de covid-19 não tem de cumprir isolamento profilático, mas quando o bicho lhe toca de perto refugia-se em casa, cancela a agenda ou finge que trabalha.

• O director regional de Saúde resolve fazer uma confissão pública no JM em que assume que “a Madeira quase foi o gestor da pandemia na área da Europa e em alguns países do Mundo” - a exemplo do que já havia feito Pedro Ramos ao revelar que França seguia a cartilha regional -, entusiasmo de Herberto Jesus que a ser levado à letra gerava um crash bolsista nas principais praças internacionais, deixava a China, com 159 novos casos, à beira de um ataque de nervos e motivava um reparo severo de Emmanuel Macron que já deve ter percebido que não é percursor da estratégia de ‘emmerder’ – termo francês que significa irritar, chatear ou até lixar - os não vacinados e as outras vítimas da Covid.

• Alguns secretários regionais estão infectados e fazem disso segredo de Estado como se a vulnerabilidade da dimensão humana das senhoras e dos senhores do poder fosse como que um sacrilégio. Bastava que fossem transparentes, tal como o foi o presidente da Assembleia, José Manuel Rodrigues.

Mas há mais, com provas e testemunhos.

O número de casos positivos nas escolas – agora às dezenas por dia - é bem superior aos que são relatados oficialmente e ninguém se importa.

Os alunos que estão com covid-19 em casa pedem para terem aulas à distância, mas algumas escolas assumem que não têm computadores suficientes para responder às necessidades actuais. Estamos há quase dois anos em desespero digital e ninguém se importa.

Na semana em que os casos dispararam, mesmo internamente, o hospital deixou de fazer teste PCR aos funcionários e ninguém se importa.

Em muitos serviços públicos não há equipas para desinfectar os postos de trabalho, nem tão pouco planos de contingência, nem capacidade de reacção perante situações adversas e ninguém se importa.

Há na Região espaços culturais ocupados com centros de vacinação e ninguém se importa.

Gente que não foi testada recebe notificação a dar conta de alegado resultado, logro que é caso de polícia, por sinal, até já gerou espalhafato em conferência de imprensa mas, em rigor, ninguém se importa que o negócio continue rentável para uns e miserável para outros.

A Madeira é inequivocamente exemplar na dedicação dos profissionais de saúde, muitos deles exaustos e apreensivos, no combate à pandemia. Por isso, deve dispensar ambientes anestesiantes, onde alguma malta sem escrúpulos acha que seremos a primeira região do mundo a usar fármacos contra a covid, a erradicar de vez o maldito vírus e a promover visitas guiadas aos recuperados.