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EUA "profundamente decepcionado" com extradição de Chang para Moçambique

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O Governo norte-americano está "profundamente decepcionado" com a decisão das autoridades sul-africanas de extraditar o ex-ministro moçambicano Manuel Chang para Moçambique, segundo uma declaração do Departamento de Justiça dos EUA hoje enviado à Lusa.

Em causa está a decisão anunciada na segunda-feira pela justiça da África do Sul, à agência Lusa, de que o ex-ministro das Finanças moçambicano, alvo de processos nos Estados Unidos da América e em Moçambique sobre o caso das dívidas ocultas e detido na África do Sul, vai ser submetido a julgamento no seu país de origem.

Contactada pela agência Lusa, a porta-voz do Departamento de Justiça norte-americano Nicole Navas declarou que "o Governo dos EUA está profundamente decepcionado com a decisão do Governo sul-africano de extraditar Manuel Chang para Moçambique em vez dos Estados Unidos".

Manuel Chang está detido na África do Sul no âmbito de um mandado de captura dos Estados Unidos da América, que reclamam a extradição do antigo governante moçambicano para o seu território.

"O ex-ministro das Finanças de Moçambique é acusado nos Estados Unidos de defraudar cidadãos americanos em milhões de dólares e causar danos significativos a Moçambique e ao seu povo", prossegue a declaração do Departamento de Justiça.

A administração norte-americana sublinha que "a justiça seria mais bem servida por meio da extradição do Sr. Chang para os Estados Unidos", mas o Departamento de Justiça dos EUA promete prosseguir com "o compromisso de perseguir fraude em grande escala, suborno e branqueamento de capitais e responsabilizar os responsáveis".

Manuel Chang foi ministro das Finanças de Moçambique durante o Governo do Presidente Armando Guebuza, entre fevereiro de 2005 e dezembro de 2014, tendo dado aval para a contracção de empréstimos secretos de cerca de dois mil milhões de euros.

Segundo a investigação dos EUA, grande parte da fraude e lavagem de dinheiro passou por transferências processadas por instituições bancárias em Nova Iorque.

No contexto da acusação do Governo norte-americano, submetida em 19 de dezembro de 2018, os procuradores norte-americanos explicavam o pedido de extraditar Manuel Chang para Nova Iorque pela seriedade da ofensa criminal, risco de fuga e "evidência irrefutável de culpa".

Jean Boustani, empresário libanês julgado no mesmo caso, foi considerado inocente pelo júri norte-americano, em 02 de dezembro de 2019, porque os procuradores não conseguiram convencer o júri de que o caso era relevante para os Estados Unidos.

Esta segunda-feira, o Ministério da Justiça e Serviços Correccionais da África do Sul confirmou que "foi tomada a decisão de extraditar o arguido para Moçambique".

O porta-voz do ministro da Justiça sul-africano explicou que Manuel Chang, detido desde 29 de dezembro de 2018 na África do Sul a pedido dos EUA, será "entregue às autoridades moçambicanas para ser julgado ao abrigo da lei moçambicana por abuso de posição e função, violação de leis orçamentais, fraude, desfalque, corrupção passiva, lavagem de dinheiro e associação criminosa".

A decisão anunciada na segunda-feira deu fim a um impasse de vários anos, já que em outubro de 2019 o Tribunal Superior da África do Sul considerou inválida a decisão do anterior ministro da Justiça Michael Masutha de extraditar Manuel Chang para Moçambique, uma vez que "ainda gozava de imunidade" no seu país, remetendo o caso novamente para o novo ministro da Justiça, Ronald Lamola.

A transferência de Manuel Chang do Centro Correccional de Modderbee, leste de Joanesburgo, para as autoridades em Moçambique está a ser facilitada pela Organização Internacional de Polícia Criminal (INTERPOL), referiu o porta-voz do ministro da Justiça e Serviços Correccionais sul-africano à Lusa.

A Justiça dos EUA acusou Manuel Chang de conspiração para fraude electrónica, conspiração para fraude com valores imobiliários e lavagem de dinheiro.

De acordo com a acusação norte-americana, Manuel Chang avalizou dívidas de mais de 2,2 mil milhões de dólares (cerca de dois mil milhões de euros) secretamente contraídas a favor das empresas públicas Ematum, Proindicus e MAM, ligadas à pesca e segurança marítima em Moçambique.

Os negócios causaram "dívidas ocultas" nas contas públicas moçambicanas, descobertas após vários anos e que prejudicaram gravemente o país.

A justiça moçambicana iniciou esta segunda-feira o julgamento do processo principal deste caso, com um total de 19 arguidos, incluindo um filho do ex-presidente Guebuza.