Análise

Uma espécie de geração rasca?

Basta-nos os negacionistas, essa franja marginal ligada a agremiações radicais

Os episódios que reiteradamente acontecem no Porto Santo, no mês de Agosto, provocam-me uma série de interrogações e lembranças de um passado recente. 1994. Estávamos no estertor do cavaquismo, quando meio país se levantou contra as políticas levadas em diante pelo então primeiro-ministro do PSD. Numa dessas lutas, os jovens estudantes excederam-se e a “pretexto de uma contestação às provas globais, os liceais transformaram os seus cortejos num desfile de palavrões, cartazes e gestos obscenos, piadas de caserna ou trocadilhos no mais decrépito estilo das velhas ‘repúblicas’ coimbrãs”, escreveu o saudoso jornalista madeirense Vicente Jorge Silva, num editorial do Público que fica para a história, questionando se estávamos a assistir ao nascimento de uma geração rasca, por via das tais manifestações exacerbadas e mal-educadas. A tirada do homem que foi ontem agraciado pela Câmara do Funchal gerou discussão acalorada.

Vinte e sete anos depois. Contexto completamente diferente (bem mais grave) mas tendo jovens como denominador comum.

E aqui não se trata de uma questão de liberdade de protestar, mas de obrigação moral e cívica de se respeitar a saúde pública, que não é uma opção. Uma coisa é contestar activamente as políticas de ensino, como foi o caso, em 1994, outra é persistir em comportamentos levianos que colocam em risco a saúde dos outros. Isso não é tolerável nem admissível.

O que se passa na ilha dourada é uma espécie de regime de excepção, de terra sem lei, onde subsiste uma autoridade branda, de fracos recursos, que não faz respeitar as regras e que acaba por ser mole com meninos sem bom senso e com rédea solta. Uma coisa é divertimento, outra é vandalismo, ignorando propositadamente as regras sanitárias. Estamos todos cansados da jornada pandémica, mas isso não implica que se faça tábua rasa da saúde pública. Não é admissível que menores organizem festas de madrugada, que promovam ajuntamentos na praia, onde nenhuma regra é observada. E que provoquem distúrbios e actos de selvajaria. Basta um estar infectado para contagiar os restantes, que podem depois infectar os familiares e colegas. A situação ocorrida provocou um reforço de camas para acolhimento profiláctico, tendo-se dado o aumento das cadeias de transmissão.

Quero acreditar que a maioria dos jovens é responsável. Que muitos já foram, inclusive, vacinados. Mas não podem ser a excepção à regra, senão vamos ter de regressar ao debate iniciado por Vicente Jorge Silva há quase três décadas. Basta-nos os ‘negacionistas’, essa franja marginal habitualmente ligada a agremiações radicais que questionam tudo o que está cientificamente comprovado, ajudando apenas, com a sua postura, a adoecer e a matar os outros.

2. A remodelação do Governo Regional provocada pela saída de Pedro Calado deveria ter sido ‘cirúrgica’. Mexer em tutelas na véspera de eleições decisivas para o governo e para o PSD vai contra os cânones das boas práticas políticas. A discussão em torno de quem passaria a tutelar o quê veio mostrar que Miguel Albuquerque não tem um fio condutor rigoroso. O que o levou a privilegiar o secretário da Educação, entregando-lhe a administração da justiça e o parlamento, regressando ao modelo lançado em 2015, que mau resultado gerou? Por que razão não deixou nas Finanças a tutela da Electricidade da Madeira e espartilhou a mobilidade? Por que não assumiu a coordenação política? Não se percebe a estratégia errática de Albuquerque, mesmo sabendo que este é um executivo de coligação e que tem de ceder a um parceiro débil, por tudo o que se sabe. Mas se a aliança é para durar, como já fez constar, porque não foi coerente e promoveu Barreto a vice-presidente? O líder passou um sinal ao eleitorado. Poderá ser forçado a passar outro, no dia 27 de Setembro.