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Nós somos e fazemos a nossa história

Tenho lido, ultimamente, alguns ensaios publicados pela Fundação Francisco Manuel dos Santos que abordam múltiplas temáticas de interesse atual. O mais recente, escrito por António Costa Pinto, apresenta-nos as caraterísticas das ditaduras e como se revestem na atualidade.

Eu não cresci na ditadura fascista, mas a memória coletiva do povo português não deixou esquecer o que foram esses tempos que, para minha incredulidade, ainda deixa saudades a muita gente. Ao ler o ensaio, a uma certa altura, estava eu a identificar alguns dos traços atribuídos às ditaduras no estilo de governação que eu testemunhara durante trinta e sete anos, na Madeira, já em período democrático.

Ora vejamos. Um regime com caraterísticas autoritárias cultiva a personalização do poder (todo o poder era remetido para a mesma figura política) e a manipulação das instituições democráticas (estou a pensar no que se passava nas mesas de voto, nas câmaras, juntas de freguesia, assembleia legislativa); faz a coaptação das elites empresariais (pensemos nos grupos empresariais fortemente ligados ao poder), financeiras (BANIF), sociais (algumas IPSS controlada pelo partido de poder); potencia a adaptação das instituições (administração pública dominada partidariamente); procura a eliminação do cooperativismo popular (existia aquele que o regime permitia); promove a instrumentalização da comunicação social (Jornal da Madeira) e das instituições religiosas.

É também típico das ditaduras adotar modelos de culto da personalidade e legitimidade carismática. Está bem presente a exaltação sistemática das virtudes daquele que liderou o governo na Região até 2015, por meio de propaganda constante, exacerbando-se as qualidades salvíficas do líder.

Alberto João Jardim adotou um estilo de governação próprio de regimes autoritários, num país de regime democrático, que propiciava condições de um Estado Social com mecanismos de governação desencadeados e suportados pela nação e usufruindo de dinheiros públicos, além dos gerados pela Região, provenientes da Europa e do País para afirmar o seu estilo e ganhar popularidade

E uma região que viveu 41 anos de ditadura fascista e quase 40 anos sob um estilo de governação com laivos de um regime populista tem marcas, ainda hoje, desse contexto, observável no modo como a sua população, salvo as exceções, percecionam a vivência democrática, tendo abandonado aos poucos as formas de participação cívica e democrática, mesmo sendo para defender os seus legítimos interesses.