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Mesmo que a alma me doa...

No caso da cobrança de impostos, a AT funciona como um Tribunal de Instância “0”. Mais concretamente, a AT julga e decide antes de qualquer outro Tribunal Judicial.

Regularmente, instituições de incontestável mérito internacional, com destaque para a Comissão Europeia e a OCDE, publicam relatórios onde se pronuncia, sobre os mais diversos aspectos da vida dos portugueses.

Um dos mais frequentes temas é relacionado com a morosidade da justiça em geral. Outro aspecto não menos importante é o relacionado com as constantes infracções cometidas por Portugal. Nos periódicos relatórios de procedimentos de infracção da Comissão Europeia, mais concretamente na área de Fiscalidade e união aduaneira, Portugal é frequentemente notificado para com as obrigações, decisões, incluindo jurisprudência, que lhe são impostas pelo direito da União Europeia (UE).

A Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) tem uma postura de antagonismo pelas jurisprudência nacional e da união europeia quando não lhes é favorável, reincidindo na tomada de decisões contra a jurisprudência que lhes é adversa. Como consequência e segundo as estatísticas internacionais, a AT, nos processos judiciais em que é parte, em 2015, apenas obteve resultados favoráveis em 42,4%. Isto é, os Tribunais apenas consideraram como dentro legalidade menos de metade das decisões da Administração. Completando o raciocínio: em 57,6% dos processos que foram apreciados pelo Tribunais Judiciais, as decisões tomadas pela AT tinham prejudicado ILEGALMENTE os cidadãos.

No caso da cobrança de impostos, a AT funciona como um Tribunal de Instância “0”. Mais concretamente, a AT julga e decide antes de qualquer outro Tribunal Judicial. Ainda mais concretamente, a AT é, simultaneamente, parte e julgador. É juiz em causa própria, porque julga o que já decidiu de acordo com a sua interpretação da lei.

Não esqueçamos que 5% do contencioso (seja favorável ou não a decisão judicial posterior) é uma receita a favor dos quadros da AT, num privilégio que desconheço que exista para a restante função pública. Todo este procedimento tem como pano de fundo os objectivos financeiros, com o máximo de receita. Num cenário em que, como se afirmou numa conferência da Associação Sindical de Juízes, a “Administração Fiscal está cega demais na tentativa de arrecadar receita, deixando empresas e famílias exauridas”.

Doí-me particularmente esta situação. É que eu, já acreditei na justiça da instância “0”. E... vendi este peixe. Hoje, não acredito pelas razões que procurei sintetizar neste exíguo espaço, pela minha própria experiência e pelas notícias internacionais, nacionais e... regionais que têm vindo a público.

E continuarei, mesmo que a voz me doa, a gritar contra estas injustiças.

Noutros tempos, por ter dito o que pensava, fiquei com o corpo dorido!

Hoje, dói-me a alma! Outros tempos... com outros tipos de injustiça e iniquidade!