Crónicas

Um ano fresquinho para estragar

1. Livro: “O Tatuador de Auschwitz” de Heather Morris baseia-se em factos reais, numa série de entrevistas que a autora fez ao protagonista da historia. De como, no meio do mais profundo dos horrores, pode continuar acesa a chama do amor.

2. Disco: “Encore” dos veteranos do ska-punk The Specials, é a melhor das surpresas deste ano que ainda agora começou. Trinta anos depois, restam três da sua formação original e este regresso marca um compromisso entre o reggae, o ska e o disco, numa vertente onde a palavra assume o centro de tudo. As letras são do melhor. De uma actualidade enorme. O Brexit, a pobreza e o aumento do racismo que está a provocar, são o “core” deste excelente trabalho.

3. A Caixa Geral de Depósitos. A Caixa Geral de Depósitos, o banco do Estado. O banco do Estado que devia ser gerido como um exemplo de probidade, de ética e de boa gestão. A Caixa Geral de Depósitos deve ter sido o banco, no mundo, que mais anos demorou a assaltar. Um verdadeiro roubo perpetrado por mangas-de-alpaca. Sem armas e sem violência física. É enorme a lista de assaltantes. Uma pilhagem feita com a complacência e conveniência de gente de dentro do próprio banco. Gente sem escrúpulos e sem qualquer nível que roubou e deixou roubar sem nada fazer.

Tudo isto com a conivência dos partidos do Estadão que foram rolando, na sua gestão, os seus que, da gamela, se foram alimentando. Com a cumplicidade de sucessivos governos que assobiaram para o ar fingindo que nada sabiam. Uma democracia que permite que isto aconteça impunemente, ao longo de tantos anos, só pode estar doente. Muito doente.

4. Na Venezuela, continua a luta pela democracia e pela liberdade. Por cá, só podemos continuar a manifestar a nossa solidariedade e a tentar minorar sofrimentos, aos nossos irmãos que regressam, proporcionando-lhes as melhores condições possíveis de conforto e integração.

5. O Governo Regional primeiro, e a ALM depois, entenderam “reconhecer” Juan Guaidó como Presidente Interino da Venezuela. Eu, que sou um autonomista convicto, acho isto uma coisa sem pés nem cabeça. Já escrevi aqui, várias vezes, que considero como limites da autonomia a justiça, a segurança interna, a defesa e os negócios estrangeiros. Estas quatro áreas são definidoras de soberania e, como entendo que a autonomia não questiona a soberania, este tipo de reconhecimento não compete a nenhum dos nossos órgãos autonómicos. Deviam, isso sim, ter manifestado total apoio e solidariedade para com o Presidente Interino. Era bastante. Era unânime. Tinha mais força.

6. António Costa esteve de raspão na Madeira, para participar num encontro do PS na Ponta do Sol. Manifestou “obsessão” e depois foi-se embora. E deixou para trás uma enorme “obsessão” pela “obsessão”.

7. De 17.658 desempregados apresentados pelo Desemprego a entrevistas de trabalho só 1.938 foram colocados. Ou seja 15.720 não o foram. A indisponibilidade imediata é a principal razão. Sei de casos em que vão entrando para as entrevistas a dizer que só ali estão porque a inscrição no desemprego a isso obriga. Isto é preocupante.

8. Eu devo ser a pessoa mais céptica possível em relação às coincidências. O CDS apresentou uma proposta que contempla o pagamento imediato de taxa/tarifa aos operadores, coisa que já devia acontecer deste que estes usam o Porto do Caniçal.

No dia seguinte, na ALM, o Sr. Vice-Presidente do Governo afirmou, alto e bom som, que até Agosto a questão do Porto estaria resolvida. Quase que aposto que vai pôr os operadores a pagar taxa/tarifa.

O CDS soltou uma “lebre” para ver quem a mordia e, no dia seguinte, por mera coincidência, o Vice “fingiu” ter mordido a “orelhuda”. Acordo à vista ou só namoro às escondidas?

9. Já agora, e a propósito de Portos, chegou-me a informação “orelhuda” de mais uma negociata que prevê a privatização do Porto do Funchal. Consegui ouvir tudo até ao fim, sem ficar minimamente espantado. Eu que, de quando em vez, até acredito no Pai Natal.

10. A propósito de ir aos poucos perdendo a minha “virgindade política”, nas últimas semanas tenho andado a promover reuniões e encontros com pessoas que são especialistas nas suas áreas de actuação. Na educação e ensino, na agricultura, na economia, nas finanças, no turismo, na energia, mar, transportes, saúde e bem-estar, desporto, etc.

Temos recebido informação de pessoas que sabem do que falam e nos têm transmitido conhecimento e experiências de enorme valor. Bem hajam a todos.

Uma conclusão tiro, desde já: se tinha uma visão catastrófica do que tem sido, ao longo da história da Autonomia, a governação do PSD, neste momento estou em quase estado de choque.

O compadrio, a incompetência, a mediocridade, o desbaratar de recursos, a subserviência a grupos económicos, tudo isto é muito, mas muito pior, do que tinha na minha percepção.

E que não se poupe alguma oposição que tão conivente tem sido com isto.

PS: que fique claro que eu conheço pessoas sérias e de grande valor no PSD. Pessoas que, a cada dia que passa, me faz mais impressão pensar o que lá estão a fazer.

11. A imaginação ao serviço do poder e este ao serviço das pessoas! É só isso que se pede.

12. Não é difícil imaginar que este ano fresquinho, que recebemos imaculado há pouco mais de um mês, vai ver e ouvir coisas que nem nos passam pela cabeça.

Ainda não começou nenhuma das campanhas eleitorais que se avizinham. Aliás, podemos dizer que nem a pré-campanha para as Europeias começou pois desconhecem-se candidatos.

E, mesmo assim, o ambiente político é do piorio. Eu gostava muito que a decência e a honestidade intelectual persistissem. Que as coisas fossem feitas com elevação e maturidade.

O combate político é um bom combate. E não um “vale tudo”.

Andam aí muitos a bater à porta do Diabo e quando isso acontece correm o risco de que ele a abra.

13. E entretanto no PCP, não chegando o apoio ao regime de Nicolas Maduro, não chegando a pouca vergonha que tem sido o favorecimento de empresas dos seus em ajustes directos em algumas das Câmaras Municipais que gerem, não chegando o pôr funcionários pagos pela autarquia seixalense a trabalhar por conta desta, na Festa do Avante, não chegando tudo isto, ainda tivemos que levar com a carinha laroca do cabeça de lista às europeias numa entrevista onde diz que o Governo de António Costa “nem sequer é de esquerda”. Por exclusão de partes, podemos dizer então que o PCP, nos últimos três anos e picos, tem apoiado um governo de direita, aprovando-lhe os orçamentos.

Esta gente não é só anacrónica e distópica, é também um caso crónico de idiopatia galopante.

14. “E, agora, andam prá’i uns neo-freaks, um deolindismo pré-histórico do qual agora parece que há um “revival” de uma espécie de luso-chique-rural, assim um pagode que não percebo”! - Carlos Moura (Cães Vadios) in Meio Metro de Pedra (Documentário)