SNS: o glorioso elevador em descarrilamento contínuo
No passado dia 3 de Setembro, Lisboa ficou marcada pela tragédia do Elevador da Glória. O cabo que ligava as duas cabines cedeu, vitimando 16 pessoas e ferindo outras 23.
Rapidamente foram accionados os meios de socorro e os feridos encaminhados para os centros de trauma da capital — Hospital de São José e Hospital de Santa Maria — ambos, claro, plenamente preparados para responder ao desastre. Ironia incluída no pacote.
Em São José, a linha da frente era uma equipa “robusta”: um ortopedista e três internos (um deles quase especialista… quase). Já em Santa Maria, o maior hospital do país, a prontidão era tão exuberante que… simplesmente não havia ortopedistas escalados. Zero. Ninguém. A ortopedia, nesse dia, era como Deus: sabe-se que existe, mas não se vê. O médico de serviço estava de férias e foi chamado a abrir a urgência.
Valeu a dedicação dos que ainda tratam a profissão como missão e não como sobrevivência. Vários médicos acorreram voluntariamente, porque salvar vidas ainda é, para muitos, um acto de fé. Fé que contrasta com a visão de uma tal Temido que dizia que as batas brancas não tinham resiliência… Pois.
Apesar de tudo, a resposta lá se fez, dentro do possível. Vários doentes graves foram operados, incluindo casos de coluna — coisa aparentemente impensável na Madeira, onde ortopedia não toca na coluna…
Mas convém sublinhar o essencial: na maior área metropolitana do país, com mais de 2 milhões de habitantes, os hospitais terciários, supostamente o último reduto, estavam em modo esqueleto. São José, com um especialista e três internos. Santa Maria, vazio até alguém de férias ser arrancado à praia. O SNS descarrilou e segue montanha abaixo, aos solavancos. Só não se “escangalhou”… ainda… graças ao sacrifício diário de médicos, enfermeiros, auxiliares e técnicos.
Portugal ostenta um dos maiores rácios de médicos por habitante na Europa. Exporta médicos e enfermeiros altamente qualificados para outros países europeus, como Inglaterra, Alemanha, Espanha... Mas cá dentro, mantém um SNS no fio da navalha, vivo apenas graças ao heroísmo dos seus trabalhadores. Não por estratégia, não por planeamento. Por sacrifício puro e duro.
A reforma do SNS não é apenas urgente — já vai com anos de atraso. Mais investimento existe, o orçamento cresce, mas os resultados não aparecem. O que não cresce são as condições de trabalho. E enquanto governos se entretêm com jogos partidários, o sistema degrada-se. Rosa, laranja, vermelho ou roxo — pouco interessa a cor do governo. O diagnóstico é o mesmo há demasiado tempo, mas a receita continua por cumprir.
Reforçar equipas, dar condições reais e competitivas, valorizar quem está no terreno: isso deveria ser prioridade absoluta. Luís Montenegro e Ana Paula Martins não podem continuar a assobiar para o lado e a seguir as pisadas de António Costa, Marta Temido e Manuel Pizarro! Mas, até agora, o que temos visto é a reprodução em série da insanidade de Einstein: fazer sempre o mesmo, esperar milagres diferentes… e rezar para que o próximo cabo não rebente.