Labubu e Tamagotchis: mudam os bonecos, não mudam as vontades
Da próxima vez que vir um destes bonecos com ar esquisito, talvez o convite não seja julgar, mas perguntar
Há pouco tempo, calhou-me nas mãos um Labubu. E, de repente, entre viagens de trabalho e momentos de lazer, comecei a reparar neles com mais atenção. Vi-os pendurados nas mochilas de adolescentes no aeroporto, como pendentes nas malas de jovens adultos no metro, e claro, em muitos vídeos nas redes sociais. Um pequeno boneco de olhos esbugalhados e dentes salientes, com ar entre o adorável e o estranho, que parece ter vindo de um sonho peculiar. Mas não é apenas um brinquedo. É um fenómeno. E é também uma forma de expressão.
Foi alguém próximo que me falou deles pela primeira vez. A curiosidade ficou no ar. Fui investigar. Depressa me vi a mergulhar num universo inesperado, cheio de vídeos de unboxing, coleções cuidadosamente organizadas e figuras personalizadas com acessórios improváveis. Descobri que o Labubu faz parte do universo The Monsters, criado pelo artista Kasing Lung. Existe em várias versões e é habitualmente vendido em edições limitadas, muitas vezes em caixas-surpresa, o que incentiva o colecionismo. Embora o fenómeno tenha começado na Ásia, rapidamente se tornou global. Existem comunidades dedicadas, feiras especializadas e um mercado de revenda em crescimento. Algumas peças mais raras são revendidas por valores bastante elevados, o que só aumenta o apelo.
O sucesso dos Labubu resulta de uma combinação eficaz: exclusividade, escassez, estética marcante e muita visibilidade nas redes sociais. A mistura entre o estranho e o fofo, entre o luxuoso e o infantil, cria uma identidade própria que se destaca num universo visual saturado. Há algo de intencionalmente imperfeito nestas figuras que desperta empatia. São diferentes, irreverentes, difíceis de ignorar. E tornam-se rapidamente um símbolo de quem os exibe.
Na adolescência, ter algo único é uma forma de marcar posição no mundo. Os adolescentes colecionam Labubu como quem coleciona pequenos pedaços de identidade. Personalizam-nos, partilham-nos, e criam à sua volta um espaço de pertença. Essa necessidade de nos afirmarmos através de objetos não é nova. Nós também a sentimos. Tivemos os Tamagotchis, os Trolls, os Furbies, as cadernetas de cromos. Também nós quisemos dizer “isto sou eu” com os elementos que estavam ao nosso alcance. Muitas vezes, deixamo-nos enganar pela ideia de que as gerações são opostas, quase incomunicáveis. Na verdade, procuramos as mesmas coisas em fases semelhantes da vida. Só usamos meios diferentes.
Enquanto professora em comunicação digital e investigadora dedicada à cultura e ao envolvimento dos jovens com a tecnologia e a criatividade, observo com frequência esta ideia de continuidade. Mudam os formatos, mas os impulsos mantêm-se. E há algo de bonito nesta repetição com novas roupagens. Os Labubu são linguagem. São estética. São pertença. São também um reflexo do tempo em que vivemos, onde o digital e o emocional se misturam, e onde o que é partilhável ganha valor afetivo.
Por isso, da próxima vez que vir um destes bonecos com ar esquisito, talvez o convite não seja julgar, mas perguntar. Em vez de pensar “não percebo esta moda”, experimente perguntar “o que é que este objeto diz sobre esta pessoa?” Porque, às vezes, um simples boneco pode ser a porta para uma boa conversa. E ouvir, com curiosidade, é talvez o maior presente que podemos dar às gerações mais novas (e a nós próprios também).