A desinformação durante o apagão
Os governos de Espanha e de Portugal foram alvo de severas críticas devido à forma como geriram a comunicação de crise durante o apagão de 28 de abril de 2025, o que poderá ter facilitado a disseminação de desinformação.
Nos dois países, demorou-se a vir a público esclarecer a população, gerando-se naturalmente algum pânico e incerteza. Sem eletricidade, sem televisão e com apenas internet móvel (naturalmente congestionada), devido à ausência de informação fidedigna, muitas pessoas valeram-se sobretudo das redes sociais e de meios de comunicação não oficiais para tentar perceber o que se estava a passar.
A transparência é essencial na comunicação de crise. Teria sido importante manter as pessoas informadas desde o primeiro momento. Não havia eletricidade, mas as pessoas continuavam a absorver informação através dos seus telemóveis e das rádios. Teria sido fundamental transmitir à população, desde o primeiro momento, alguma serenidade, nem que fosse através de uma mensagem que garantisse que, apesar de todos os esforços, ainda não tinham sido apuradas as causas. Desta forma, diluíam-se eventuais dúvidas e caíam por terra quaisquer teorias infundadas, descartando-se especulações.
Vejamos: logo a seguir ao apagão, começaram a circular várias teorias da conspiração. Minutos depois, já se atribuía a causa do “blackout” a um ciberataque russo, supostamente confirmado pela CNN Internacional e pela presidente da Comissão Europeia. A falta de informações oficiais, juntamente com a pouca literacia mediática, fez com que a população, não confirmando as fontes, acreditasse que os supostos conteúdos do canal de televisão fossem verídicos, assim como as declarações fictícias atribuídas a Ursula von der Leyen.
Para colmatar, o Ministro Adjunto e da Coesão Territorial, Manuel Castro Almeida, veio a público considerar que, “pela dimensão” do incidente, este poderia ser “compatível com um ciberataque”. Apesar de – dias depois – o governante continuar a achar que atuou em conformidade, recentemente, conforme foi noticiado por diversos órgãos de comunicação social, o MediaLab do ISCTE, no seu relatório semanal, concluiu que o Governo terá contribuído para a propagação da desinformação sobre o apagão ao admitir a possibilidade de um ciberataque.
Outra narrativa desinformativa que ganhou alguma força e conseguiu ampla difusão foi a de que o apagão teria sido causado por um fenómeno atmosférico extremo em Espanha – “vibração atmosférica induzida” – provocado pelas variações bruscas de temperatura. No entanto, tanto a REN – Redes Energéticas Nacionais (Portugal) como a Agência Estatal de Meteorologia (Espanha) desmentiram esta teoria.
Circulou também a ideia errada de que o apagão seria o início de um evento global de “três dias de escuridão”, associado a teorias da conspiração sobre a “Nova Ordem Mundial” e a Agenda 2030. Ainda, como é habitual em situações semelhantes, reciclaram-se notícias antigas para causar alarme.
Via WhatsApp, alegara-se que um avião de combate a incêndios teria danificado uma linha de alta tensão na França, o que teria provocado falhas de energia em vários países, nomeadamente em toda a península ibérica. E também houve quem partilhasse que a reposição da eletricidade supostamente iria demorar pelo menos 72 horas...
Para além das reações dos organismos visados, que remeteram comunicados a desmentir as informações falsas, prontamente, as plataformas de verificação de factos iam tentando esclarecer a população. No entanto, infelizmente, como revelam alguns estudos, os conteúdos desinformativos têm 70% mais probabilidade de serem partilhados do que os verdadeiros, ou seja, a mentira espalha-se muito mais rapidamente do que a reposição da verdade. Portanto, infelizmente, relativamente ao incidente do apagão, a desinformação levou a melhor!